Nos últimos anos a LG deu-se ao luxo e ao perigo de colocar no mercado smartphones que arriscavam em novas tecnologias e que tentavam trazer um sentido de inovação para o segmento e para a marca. Em 2013 a experiência chamou-se G Flex e em 2014 foi a vez do G Flex 2.

No final do ano passado a tecnológica decidiu experimentar uma fórmula diferente. Em vez de apostar num ecrã curvo apostou num smartphone com dois ecrãs. Para chamar ainda mais a atenção do consumidor colocou também dois sensores fotográficos frontais.

E se os G Flex tinham uma capa traseira com tecnologia regenerativa, o modelo V10 apresenta-se com uma capa traseira em silicone de classe militar, de acordo com a marca sul-coreana.

A sua curiosidade e o seu apetite de consumidor já foram despertados? Ainda bem pois o LG V10 merece mesmo a sua atenção. É um smartphone com elementos extra suficientes para merecer a atenção de qualquer pessoa que goste de smartphones.

A estreia no mercado português foi feita no início de janeiro e a marca estima que até ao final de junho deverão ser vendidas três mil unidades deste modelo. Parece pouco? Para um smartphone que tem um preço de 800 euros talvez não seja.

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Nas duas últimas semanas o TeK experimentou o novo topo de gama da LG. É sem dúvida uma proposta diferenciadora, garantindo ao mesmo tempo muita qualidade nos componentes mais ‘clássicos’. É evolução, mas não revolução. É muito bom, mas não deverá ter muitos seguidores nos próximos anos.

Acima de tudo o LG V10 é importante pois mostra que há quem esteja disposto a arriscar no cada vez mais estabilizado mercado dos smartphones. E sejamos sinceros: se é para pagar 800 euros por um smartphone, então que traga elementos que não existem em telemóveis da concorrência no mesmo segmento de preço.

E se ainda está a pensar no duplo ecrã e na dupla câmara frontal, antes de falarmos nesses elementos vamos falar noutras características que colocam o LG V10 entre os melhores dispositivos móveis do mercado.

O melhor aluno da turma em fotografia

O outro smartphone topo de gama da LG, o G4, é possivelmente um dos melhores dispositivos móveis na área da fotografia. Quando o testamos fizemos questão de deixar esta ideia bem explícita. Pelo que lhe agradará saber que o mesmo sensor fotográfico de 16 megapíxeis está a ser usado no V10.

A qualidade das imagens é muito boa: grande definição, reprodução de cores e contrastes muito real, elementos bem recortados e no geral uma composição cheia de detalhe. Ficam aqui alguns exemplos:

Mas além dos bons resultados conseguidos, existem mais fatores que ajudam a colocar o V10 nos píncaros da produção multimédia. O disparo é instantâneo, o sistema de focagem é rápido e mesmo em condições de baixa luminosidade o sensor consegue ‘absorver’ uma boa quantidade de luz que torna as imagens mais nítidas quando tiradas à noite ou dentro de portas.

A isto acresce o facto de o V10 permitir controlos manuais na fotografia: pode definir o ISO, a abertura do sensor ou até o equilíbrio de brancos, vendo em direto as alterações que cada mudança provoca a alteração de cada um destes indicadores.

Como se não bastasse, o controlo manual é agora possível também na captação de vídeo - algo que o G4 não tinha. São os mesmos controlos e os resultados são igualmente positivos. Gravação em Ultra HD e em câmara lenta através de vídeo a 120 frames por segundo tornam o V10 numa ‘bomba’ para os que gostam de imagem e valorizam os resultados de qualidade.

A gravação de vídeo faz até uso dos três microfones incluídos no telemóvel para que possa dar mais atenção ao som que está à sua frente ou ao som ambiente se assim o preferir: existe um medidor na aplicação da câmara que ajuda a manter debaixo de olhos os níveis sonoros.

Do que já experimentei num smartphone, diria que o LG V10 está à frente na categoria da fotografia. Tem os Galaxy S6 e o iPhone 6s Plus a curta distância, mas devido aos controlos manuais que permite, incluindo na produção de vídeos, está um passo à frente da concorrência.

A evolução do design

Se o LG G4 arriscou-se a viver na sombra do Galaxy S6 por não ter traduzido as suas inovações e melhorias também num salto qualitativo ao nível do design e da construção, a tecnológica sul-coreana decidiu não repetir a ‘brincadeira’ com o V10.

É um telemóvel que causa impacto. Não é dos mais luxuosos que existem, mas não deixa de exibir um perfil premium. E tudo graças a pequenas alterações.

Pela primeira vez a LG decidiu apostar no metal como um dos elementos que compõe o design do smartphone. A aposta só é feita nas duas laterais, mas as duas ‘barras’ de aço inoxidável lá colocadas conferem confiança relativamente à sua robustez e trazem brilho a este bloco maciço preto - o V10 está disponível também em branco, mas aqui a reflexão é feita tendo em conta o modelo testado.

Ainda não foi desta que a LG deixou o plástico, mas a capa traseira do V10 não é de um material qualquer: a empresa fala em silicone de classe militar. Se daria para andar na guerra não sei, mas sei que é muito robusto e tem uma grande qualidade.

O silicone tem ainda uma forte componente de textura, o que traz duas consequências: o smartphone é mais fácil de segurar, o que é bom tendo em conta o seu grande volume; e confere um aspeto mais trabalhado ao equipamento no geral.

Com aço inoxidável e silicone militar terá certamente smartphone para muitos anos. Agora é preciso reforçar: esta combinação em termos de luxo fica abaixo do que a concorrência já oferece, como a Huawei com os seus topo de gama. Mas é bom ver a LG apostar em novos materiais e é de esperar que tal aposta venha a ter reflexos no sucessor do LG G4 que deverá ser apresentado já este mês.

Os extras

Faz ou não sentido ter dois ecrãs num smartphone? Da maneira como a LG apresenta o segundo ecrã, faz.

É uma pequena tira que está na parte superior direita do smartphone. Está ligado ao ecrã principal de 5,7 polegadas, mas é totalmente independente, tendo dois modos de funcionamento.

Quando o smartphone está bloqueado, o pequeno ecrã está sempre ligado e apresenta informações como a hora, o dia e a meteorologia. Dá também conta da existência de notificações e permite aceder a algumas ferramentas rápidas como à ligação Wi-Fi, ao modo lanterna e à câmara fotográfica.

Ao não ter de ligar o ecrã de 5,7 polegadas para saber e aceder a estes elementos estará automaticamente a poupar bateria. O que é bastante positivo.

Já quando o smartphone está ‘acordado’ o segundo ecrã dá acesso a quatro separadores: um com as aplicações mais recentes, um com aplicações definidas pelo utilizador, outra com contactos e ainda um quarto campo dedicado a frases - tanto pode ser um lembrete, como um ditado, como uma frase motivadora, você escolhe.

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Apesar do posicionamento fazer sentido, pois é na parte superior do smartphone que estamos habituados a ver as horas e a receber notificações, a verdade é que devido ao tamanho grande do smartphone torna-se mais difícil usar este segundo ecrã. Sobretudo se o utilizador tiver as mãos pequenas.

E este segundo ecrã é algo que envolve um pequeno grau de aprendizagem: ao fim das duas semanas ainda acedia a algumas aplicações pelo método tradicional em vez de recorrer aos atalhos colocados nos separadores. Mas já tinha assimilado outras atitudes, como o facto de fazer o multitasking quase exclusivamente do pequeno ecrã.

Destaque ainda para o facto de o segundo ecrã ter um sistema inteligente de energia que faz com que brilhe mais sempre que o utilizador pega no telemóvel. Há um sensor colocado na parte frontal que se estiver totalmente tapado desliga este segundo ecrã, como quando o telemóvel está no bolso. Mais poupança de energia, ainda melhor para o utilizador.

Resumindo, a LG conseguiu dar um propósito muito maior a esta pequena tira do que aos ecrãs curvos dos Flex. Não é uma forma de interação revolucionária, mas é evolutiva. Dá mais jeito do que atrapalha. E não tem qualquer impacto no consumo de conteúdos: por exemplo, se estiver a jogar a 'tira' assume a cor preta para ‘confundir-se’ com o restante corpo do smartphone.

Já sobre o duplo sensor fotográfico frontal há menos a dizer, ainda que cumpram muito bem a missão para o qual foram concebidos.

O que estes dois sensores permitem é tirar fotografias com 120º de amplitude através da câmara frontal. Isto permite apanhar muito mais cenário ou muitas mais pessoas na mesma composição. O efeito fica parecido com o que é conseguido nas fotografias das GoPro, para ter uma melhor ideia.

Mas isto significa que estes dois sensores destinam-se quase apenas para selfies. É de facto uma das grandes tendências dos últimos meses e é possível conseguir resultados surpreendentes com recurso a este ‘extra’. Vai muito provavelmente ter as melhores selfies entre os seus amigos e nem sequer vai precisar de um selfie stick.

Não há é muito mais a dizer sobre esta aposta da LG. Pelo menos é um ‘mais’ no pacote que o utilizador compra relativamente à concorrência.

Reforço precisa-se

A LG deixou algumas arestas por limar neste V10, nada de muito grave, mas que merece ser referido.

Em primeiro lugar a autonomia. Mesmo usando um segundo ecrã para poupar energia, o smartphone acaba por ter uma autonomia modesta. Permite que o smartphone possa ser usado ao longo de um dia sem ir ‘à carga’. Está em linha com o que é feito por outros smartphones topo de gama, mas já tive melhor com a LG.

Na minha opinião isso explica-se pelo facto de o smartphone ter um ecrã incrível: são 5,7 polegadas, resolução de 2.560x1.440 píxeis, brilho muito generoso e uma reprodução de cores viva. Um ‘monstro’ destes tem os seus custos.

O facto de o smartphone ter 4GB de RAM também faz com que mais aplicações fiquem em segundo plano, o que tem o seu impacto na gestão energética.

E claro, com uma câmara cheia de qualidade é normal que acabe por tirar mais fotografias e gravar mais vídeos do que o costume. Ou seja, tudo o que é bom neste V10 tem o seu efeito secundário ao nível da autonomia.

Outro elemento que precisa de afinação é o leitor de impressões digitais que está incluído no botão de energia principal do smartphone. É bom, é rápido na leitura, mas por vezes deixa a desejar na precisão. Cheguei a precisar de três ou mais tentativas de desbloqueio e houve mesmo situações em que o sistema parecia ‘congelar’, obrigando-me a utilizar o sistema alternativo de desbloqueio.

O facto de estar na parte traseira é no entanto uma opção questionável. Muitas vezes uso o smartphone pousado na mesa, o que me obriga a pegar nele para o virar e desbloquear. Ou obrigava, pois nestes casos escolhia sempre o modo de bloqueio por toque da LG.

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E por falar em botões, as teclas de volume continuam a ser colocadas pela LG na parte traseira. Aqui o reparo não é à posição, pois até gosto deste esquema, mas antes ao facto de os botões terem pouco relevo. Torna-se difícil encontrá-los de forma intuitiva, temos quase sempre que nos orientar pelo botão de energia principal.

Por fim uma nota para o sistema de som do telemóvel. Durante a apresentação do equipamento em Portugal foi muito louvado, mas acabou por ficar abaixo das expectativas.

O som emitido é alto, sem dúvida, mas falta-lhe corpo e definição. Num telemóvel de 800 euros pedia-se mais.

Isto é no entanto compensado pelo sistema Hi-Fi que existe no equipamento. Usando os earphones que a LG disponibiliza de origem - e que têm uma qualidade acima da média, refira-se -, foi notória uma melhoria sempre que o modo de alta definição era ativado. Portanto terá de decidir se valoriza mais o som do altifalante ou a qualidade que pode ter com um bom par de auscultadores a acompanhar.

Considerações finais

Olhando bem para o que a LG apresenta no V10 é justo dizer que o smartphone tem tudo: tem um excelente ecrã, tem uma grande câmara fotográfica, tem memória RAM que o torna ‘à prova do futuro’, mantém elementos versáteis como a bateria removível e entrada para cartão microSD, tem carregamento rápido e tem aqueles toques de luxo na construção e os elementos ‘futuristas’ no ecrã e na câmara frontal.

E em telemóveis desta categoria a típica análise ao desempenho quase não se coloca, mas fica a referência: tudo é rápido, tudo é fluído e executa de forma tranquila aplicações e jogos, como os recentes Traffic Rider e Lego Skybound.

Por tudo isto é sem dúvida um dos melhores smartphones do mercado. Na minha opinião pessoal, é mesmo o melhor que já me passou pelas mãos por ser muito completo e muito bom na esmagadora maioria das suas características.

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Não é o dispositivo mais potente, mas não me importo com isso: o processador podia de facto ser mais ambicioso, mas tiro maior proveito de tudo o que já foi enunciado do que de um chip com mais núcleos ou velocidade de relógio. Mas fica o aviso à navegação: nem todos os consumidores pensam assim e um Snapdragon 808 pode parecer pouco num ano em que deverá chegar a nova geração ao mercado, o Snapdragon 820.

O V10 não é um smartphone perfeito - há sempre margem para melhorar. Neste caso a autonomia foi o que mais deixou a desejar relativamente ao que já usei noutros smartphones da LG e o sistema de som também desiludiu. Ainda assim não chega para ‘estragar’ a visão geral sobre o equipamento.

A LG merece a consideração de todos os que gostam de smartphones por estar a tentar inovar em elementos que têm as suas razões práticas. Não vejo é a próxima vaga de smartphones a inspirar-se no duplo ecrã e na câmara frontal do V10.

Não acredito que seja um telemóvel que vá deixar um grande legado, mas pelo menos traz elementos frescos no cada vez mais cansado mercado dos smartphones.

Parte desta minha teoria está relacionada com o tempo escolhido para o lançamento do equipamento: tarda nada a LG vai revelar o seu novo topo de gama, o que poderá relegar o V10 um pouco para o esquecimento apesar das suas boas indicações.

Haja quem arrisque, haja quem inove. E logo num dos melhores dispositivos móveis do momento.

Rui da Rocha Ferreira