A chegada do Netflix a Portugal tem gerado muita discussão. Afinal, trata-se de um dos maiores serviços de conteúdos do mundo e um dos que tem apresentado maior crescimento. Se 65 milhões em todo o mundo gostam, por que não gostarão os portugueses?

A resposta será dada no próximo mês quando a plataforma estrear em Portugal. Mas do lado da Netflix ainda há muitos dossiês por concluir e poucas informações concretas para partilhar.

Num encontro com o TeK, o vice-presidente de inovação do produto da Netflix, Carlos Gómez-Uribe, esclareceu que ainda não há data definida para o lançamento e que os preços de cada modalidade ainda não estão definidos. Outubro é o mês, mas não há um dia defnido. Já os preços de 7,99 a 11,99 euros que têm sido anunciados não foram confirmados e podem ser outros: está tudo em aberto.

O que o executivo garante é que o primeiro mês do serviço será gratuito para todos, tal como aconteceu nos restantes mercados, para que os utilizadores possam aceder sem compromissos à experiência Netflix.

O que também ainda não está fechado é o número de séries que vão estar disponíveis, nem o número de filmes. “Ainda não sabemos, ainda estamos a finalizar o catálogo, mas o que sabemos é que será uma oferta muito boa em comparação com a oferta de outros países quando lançámos o serviço. E depois do lançamento o catálogo vai sempre crescer ao longo do tempo”, salientou.

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O elemento da Netflix disse ainda que quanto melhor for a resposta dos consumidores, melhores serão as condições a médio prazo. “Quantos mais membros tivermos em Portugal, mais filmes e séries vamos disponibilizar”, salientou, numa alusão ao conhecimento que esperam ter dos gostos e das preferências dos portugueses.

Já se sabe que não haverá House of Cards nem Orange is The New Black, pois os direitos foram cedidos a outras empresas. Mas estas são situações pontuais e que não vão repetir-se nos conteúdos produzidos pela própria Netflix: “Daqui para a frente isso já não vai acontecer. Tencionámos ser um serviço global até ao final do próximo ano e vamos manter os direitos de tudo o que produzimos”.

Também não é certo que no dia de estreia do Netflix existam conteúdos portugueses na plataforma, ainda que tenha sido confirmado que existe de facto essa vontade de ter séries ou filmes made in Portugal para os portugueses e para o resto do mundo.

E caso sejam incluídos conteúdos portugueses na fase de lançamento, será um pequeno conjunto de conteúdos, confirmou o vice-presidente. Pois desta forma a Netflix vai conseguir perceber de que gostam os portugueses, podendo depois reforçar essas áreas de forma mais consciente e com a certeza de que vão produzir um efeito positivo junto dos consumidores.

Relativamente aos objetivos para o mercado português a empresa vai seguir uma estratégia de longo prazo, algo que tem feito noutros países e que tem levado ao sucesso da empresa.

“Não temos nenhuma perspetiva para um prazo específico. Pensamos numa perspetiva multi-ano. Estamos dispostos a esperar e a garantir que o marketing resulte ao longo dos anos. Depois de entrarmos no mercado queremos perceber o que é que pode mudar, para que funcione nos anos seguintes”.

Concorrentes, não clientes
O mercado português vai ser interessante para a Netflix do ponto de vista concorrencial, como o executivo da empresa confirmou.

Isto porque em Portugal os operadores de telecomunicações têm uma forte presença na área dos conteúdos, o que cria aqui de imediato uma relação de concorrência - sobretudo relativamente aos canais pagos. Mas o Netflix também é um parceiro próximo, pois os ISP são fulcrais na entrega da melhor experiência de utilização.

“Estamos sempre em conversações com os operadores de Internet, isso é um grande tema na Netflix. Uma coisa importante para nós é entregar os video-bits de forma eficaz e isso requer uma colaboração próxima com os ISP”, disse Carlos Gómez-Uribe.

O responsável salienta no entanto que a posição da Netflix é que nenhum pacote de dados ou informação deve ser diferenciado entre si. “Devido à nossa posição relativamente à Neutralidade da Internet, não gostamos de entrar em acordos que impliquem pagamentos”, esclareceu.

Numa outra questão relativamente a um alegado acordo com a Vodafone Portugal, que colocaria a aplicação da Netflix na box de todos os subscritores dos serviços da operadora, a indicação que foi dada ao TeK é a de que não há até à data acordo para o mercado português.

Os “piratas” também estorvam
Além da questão dos operadores, o mercado português vai ser interessante para a tecnológica norte-americana por causa do nível salarial médio dos portugueses e também por causa do download ilegal de conteúdos. E isto está a ter um peso importante na definição dos preços a serem praticados.

“Queremos garantir que o preço faz sentido, em parte por causa do contexto dos rendimentos baixos e da questão da pirataria”, garantiu Carlos Gómez-Uribe.

O responsável da Netflix descartou a possibilidade de o Wareztuga ter encerrado por ação da sua empresa, mas fez uma avaliação da questão da pirataria em geral, partindo do exemplo do Popcorn Time - aquele que é apelidado de “Netflix da pirataria”.

“Acho que é bastante engraçado [o apelido]. É um risco, isso é certo, e é importante perceber que a pirataria prospera em paralelo com negócios como o nosso e isso significa que não haverá dinheiro  suficiente para produzir conteúdos de qualidade. E numa última instância, não haverá bons conteúdos para ver”.

Num país onde muitos defendem que não há nada mais barato que o gratuito - e ilegal -, como se convence a fazer uma subscrição de um serviço? No caso do Netflix a resposta chega através das opções de dobragem e legendagem - as duas opções estarão disponíveis em português europeu -, por haver acesso a conteúdos em Ultra HD e por o serviço ser multidispositivo, estando inclusive disponível nas consolas de videojogos. E para Carlos Gómez-Uribe, estas são vantagens que as pessoas acabam por querer e assimilar.

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“Também pensamos que as pessoas vão apreciar que estão a pagar para apoiar a criação de conteúdos. Isso o facto de saberes que quando usas o Netflix estás a usar algo que é seguro, não é algo que vá poluir o teu dispositivo”.

A Netflix já tem presença noutros mercados com altos níveis de pirataria, como a América Latina e está a conseguir contornar a situação e a converter muitos utilizadores. “Nós estamos na América Latina e estamos a ter muito sucesso. E é um mercado com altos níveis de pirataria: México, Brasil, Argentina, todos têm grandes níveis de downloads ilegais de conteúdos”.

Por fim, o “mito”: é verdade que a Netflix estuda os níveis de pirataria de um determinado mercado para definir a estratégia a usar?

“Usamos todos os dados que conseguimos para descortinar o que vai funcionar num país, mas a maior parte está relacionada com experts desse mercado. Se calhar olhamos para os dados da pirataria, mas não os usamos diretamente. Não estou certo de que tenhamos dados específicos de pirataria, mas se tivermos é apenas um sinal dentro de muitos”, salientou o vice-presidente da gigante norte-americana.

Rui da Rocha Ferreira