A nova legislação vem introduzir regras para o financiamento colaborativo em Portugal e caracterizar quatro formatos distintos de crowdfunding: doação, donativo, capital (equity) e empréstimo.

Os dois primeiros são os menos regulados. Uma das alterações mais relevantes é que as plataformas eletrónicas que permitem publicar campanhas de crowdfunding passam a ter de estar registadas junto da Direção Geral do Consumidor. Há uma semana quatro empresas já tinham manifestado essa intenção junto da DGC mas ainda não a concretizaram porque a portaria que regula o registo das plataformas ainda não foi publicada. Fonte do Ministério da Economia garantiu ao TeK que a publicação acontece durante esta semana.

Nas campanhas de financiamento colaborativo por recompensa, o modelo usado nas plataformas mais mediáticas desta área, como o KickStarter ou o Indiegogo, quem faz uma doação recebe em troca um produto ou serviço. Na modalidade de donativo, não há contrapartidas. O apoio é concedido sem expetativa de receber nada em troca.

A lei prevê mais duas modalidades de crowdfunding: capital e empréstimo, que serão supervisionadas pela Comissão de Mercado de Valores Mobiliários. Esse controlo vai ser balizado por um regulamento que ainda está a ser preparado e que ficará pronto até final de novembro. O timing está previsto na legislação que hoje entra em vigor, o que faz com que a nova Lei entre em ação com várias arestas ainda por limar.

Expectativas em relação à nova lei

As empresas que trabalham na área mantêm a expectativa e defendem que a atratividade do mercado, no que se refere às novas modalidades de crowdfunding previstas na Lei, dependerá muito das definições que constarem do regulamento que a CMVM está a preparar.

Yoann Nesme diretor e co-fundador do PPL, a maior plataforma de crowdfunding nacional e uma das mais antigas, olha para os exemplos internacionais e encontra alguns caminhos que não gostava de ver implementados em Portugal, por considerar que podem inibir investimento. Tanto do lado de quem apoia os projetos, como das empresas responsáveis pelas plataformas eletrónicas que divulgam as campanhas.

Se as regras de admissão das plataformas forem muito apertadas e implicarem custos significativos será difícil fazer face a esses encargos, porque o negócio gera margens pequenas defende Yoann Nesme.

Em países como os Estados Unidos, o regulador do mercado de capitais (SEC) quis que as plataformas fossem previamente auditadas, por exemplo, um processo complexo e caro.

Na Europa também há escolhas dos reguladores que não têm gerado as melhores reações do mercado. Na Alemanha a legislação que tem vindo a ser preparada para o crowdfunding de capital (equity) fixa limites máximos ao investimento para investidores não profissionais que são demasiado conservadores. É uma restrição que pode comprometer o interesse deste instrumento, para quem investe e para quem pede esse investimento, alerta o responsável que olha para o modelo inglês como mais interessante e aquele que melhor tem conseguido promover o investimento em novos negócios.

O PPL é uma das quatro empresas que até à semana passada já tinha manifestado intenção de fazer o registo que a lei passa a impor a qualquer plataforma de crowdfunding, junto da Direção Geral do Consumo. A empresa está focada no crowdfunding por recompensa, mas não esconde o interesse nas modalidades que a CMVM vai regular. A concretização depende das regras que forem definidas.

Ainda assim, Yoann Nesme considera positiva a introdução de legislação que venha clarificar as regras neste domínio do crowdfunding. “É importante que existam regras”, “é uma garantia de segurança para quem apoia” e pode ser também um incentivo ao investimento em startups.

O PPL continua a ser um dos atores mais ativos num mercado que em Portugal se desenvolveu sobretudo nos últimos quatro anos e que hoje tem poucas opções para quem quer recorrer ao financiamento colaborativo. Partilha o mercado com empresas que apontam ao mesmo segmento, e com projetos que já exploram as novas modalidades de crowdfunding previstas na lei, como a Raize. A plataforma é dirigida a empresas que podem deixar pedidos de empréstimo e fugir a outras alternativas mais tradicionais e mais dispendiosas, como a banca.

Desde o início do ano a Raizer já movimentou mais de meio milhão de euros, de acordo com declarações recentes dos promotores ao Dinheiro Vivo. O valor é o mesmo que o PPL espera ajudar a angariar para as campanhas que forem divulgadas na sua plataforma ao longo de 2015.

O número revela uma estimativa de crescimento mais modesta que a dos últimos dois anos, que rondou os 100%. Em 2015 não deve ir além dos 25%. Yoann Nesme admite que a maturidade do mercado possa ser uma das explicações para o crescimento mais lento do número de projetos à procura de crowdfunding.

A outra plataforma portuguesa com maior visibilidade neste formato mais tradicional de crowdfunding (por recompensa) é o Massivemov - que não respondeu às nossas questões -, que este ano também abrandou significativamente o ritmo de divulgação de novas campanhas. 

Em ambas as artes e a cultura são as que mais se destacam. No caso do PPL a música foi a área que gerou mais campanhas até à data, 136, que angariaram 260 mil euros. Seguem-se os livros, o teatro, o empreendedorismo e o desporto. Em média cada campanha angaria 2.500 euros.  

A legislação que entra esta quinta-feira em vigor e que, por enquanto, vale para o crowdfunding por recompensa ou donativo, determina que “cada oferta disponibilizada através das plataformas de financiamento colaborativo de donativo ou recompensa está sujeita a um limite máximo de angariação que não pode exceder 10 vezes o valor global da atividade a financiar”. Também prevê que o tempo e o montante associado às campanhas possam ser alterados uma vez enquanto estas decorrem.

Da mesma forma, prevê que quem doa verbas para um projeto de crowdfunding possa recuperar o dinheiro aplicado, se as condições anunciadas por quem as promove não forem cumpridas.

 

 Cristina A. Ferreira