Por Ricardo Henriques (*)

Parece ser consensual a ideia de que já não podemos viver sem as tecnologias de informação e de comunicação. A inovação tem permitido reduzir o seu custo, torná-las mais acessíveis e úteis a uma enorme variedade das nossas atividades quotidianas, ao ponto de nem nos apercebemos que em alguns aspectos nos tornamos dependentes desta tecnologia e do conforto e bem-estar que proporciona. Pelo menos até ao momento em que deixam de funcionar ou que colocam em risco a nossa segurança.

O avanço destas tecnologias traz consigo importantes vulnerabilidades sociais e materiais. O ciberespaço expõe o Estado, as empresas e os cidadãos a novas situações de risco e a outras que, embora já existam no mundo físico, se exponenciam nesse mundo virtual, fruto da maior exposição e alcance que as tecnologias proporcionam.

Um desses riscos e talvez aquele sobre o qual mais exemplos têm sido conhecidos é o da falta de privacidade. São inúmeros os exemplos de devassa da vida privada e de gravações e fotografias ilícitas. Têm sido divulgados, com uma frequência preocupante, diversos exemplos de tecnologias que, quer por utilização mal-intencionada ou simplesmente descuidada, quer por defeito de conceção dos aspectos relacionados com a sua segurança, podem por em causa este direito fundamental.

Se a mais recente moda dos drones com câmaras ou as conhecidas webcams eram já motivo de apreensão, outros produtos suscitam ainda maiores preocupações, como sejam os monitores de bebés ou os “brinquedos inteligentes” (que interagem com as crianças recorrendo a ligações à internet para interpretar aquilo que estas dizem e produzir uma resposta relacionada), transmitindo ou armazenando as suas imagens, vozes ou outros dados pessoais e que, pela sua aparente inofensividade, se não incorporarem as proteções necessárias, podem expor as crianças a sérias ameaças.

O relato de utilizações e divulgações não autorizadas dos dados recolhidos por aparelhos como estes, mostra que as empresas de tecnologia não estão a fazer o suficiente para garantir a segurança e privacidade online dos utilizadores, em especial das crianças, que representam um grupo com necessidades distintas e mais exigentes no que toca às medidas de segurança que devem ser implementadas para impedir o acesso por terceiros aos dados recolhidos.

A internet das coisas está a trazer muitos outros dispositivos “inteligentes” (ligados à internet) ao mercado, como as televisões, frigoríficos, lâmpadas, balanças e relógios, e brevemente chegará também a outros objetos que poderão representar riscos de segurança acrescidos, sendo o melhor exemplo dessa realidade os automóveis.

Embora haja quem defenda que os consumidores conseguem pesar os custos da perda de privacidade em contrapartida dos benefícios das novas funcionalidades e outras vantagens a estas associadas, para que estes produtos possam ser bem aceites no mercado, será essencial que os fabricantes mantenham a confiança dos consumidores, fazendo depender a sua privacidade e segurança o mínimo possível da sua iniciativa, apostando num desenho e conceção dos produtos que integre esta preocupação.

 

(*) Sócio da sociedade de advogados PBBR