Em 2016 os profissionais do sector do táxi, bem como associações representativas como a Antral ou a FPT, afirmaram-se ainda mais como opositores acérrimos de serviços eletrónicos de transportes individual. Apesar de as queixas serem dirigidas a todas as estas plataformas, ficou mais do evidente que os taxistas nutrem um “ódio especial” pela Uber.
Em março, o ministro do Ambiente, João Matos Fernandes, que tem também a tutela dos transportes, afirmava que o transporte de pessoas devia ser feito pelas entidades operadoras de transportes e que, não sendo considerada como tal, a Uber estava a operar ilegalmente.
Sublinhando, na altura, que não existia qualquer género de complot contra a tecnologia, Matos Fernandes assumia que o serviço prestado pela Uber não se encontrava ao abrigo da Lei e que, por conseguinte, era ilegal.
Depois de a Uber ter sido acusada pelo deputado Bruno Dias, do Partido Comunista Português, de isenção fiscal ilegítima e de concorrência desleal, o diretor executivo do serviço em Portugal respondia dizendo que o seu serviço era prestado de acordo com a legislação em vigor.
Rui Bento explicava que a Uber funcionava à semelhança da Airbnb ou o Booking.com, servindo de intermédio entre quem procura um serviço e quem o presta.
Um dia depois das acusações lançadas pelo ministro do Ambiente, a Uber Portugal voltava “à carga” e frisava a importância de se proceder a uma “urgente” e “profunda revisão regulatória”, acrescentando que a legislação era obsoleta e que não atuava em benefício do consumidor.
Os olhares da imprensa portuguesa continuavam intensamente focados na Uber na altura em que o secretário de Estado adjunto e do Ambiente dizia que este serviço devia obedecer às mesmas regras a que está sujeito o sector dos táxis.
José Mendes argumentava que “Quem transporta no terreno é um operador de transporte e um operador de transporte tem de obedecer a requisitos. As regras têm de ser cumpridas porque, se há requisitos para quem presta determinados serviços, têm de ser cumpridos”.
De acordo com o membro do Governo, o serviço disponibilizado pela Uber era exatamente igual ao prestado pelos táxis, pelo que ambos teriam de estar sob a mesma alçada legal e cumprir os mesmos requisitos.
Em abril, a Antral e a Federação Portuguesa do Táxi (FPT) tornavam claras as suas intenções para, em nome do setor, impossibilitar as operações da Uber em Portugal, através de diversas manifestações e daquilo que descreveram como sendo “iniciativas de sensibilização pública”.
A animosidade entre taxistas e a Uber aumentava “a olhos vistos” até que a associações representantes do setor elaboraram e começaram a distribuir um manifesto contra a Uber. No documento, era referido que o serviço digital não respeitava, não obedecia nem se submetia às mesmas normas que regiam o sector dos táxis.
Inclusivamente, as duas entidades exigiam o encerramento da plataforma e incitavam todos os portugueses a juntarem-se à luta contra a alegada ilegalidade da Uber.
Como tinham prometido, os taxistas juntaram-se em Lisboa, no Porto e em Faro para manifestar o seu descontentamento, por meio de intervenções cujo objetivo era inviabilizar a mobilidade nos centros urbanos e chamar a atenção das pessoas para o que consideravam ser uma afronta ao setor tradicional.
Ao mesmo tempo, a Uber aproveitava para divulgar um estudo conduzido pela Eurosondagem e que mostrava que 72,3% dos portugueses concordavam com a operação no país de empresas como a Uber e a Cabify.
Mais de 80% indicava que a tecnologia e a inovação eram essenciais à melhoria da mobilidade em Portugal, o argumento “porta-estandarte” da Uber para legitimar as suas operações e atrair apoiantes.
A Antral e a FPT diziam que desde que a Uber começou a funcionar em Portugal, no verão de 2014, o sector dos táxis já tinha perdido cerca de 20% do negócio.
O mês de julho arrancava com o Executivo a dizer que, até à chegada do outono, estaria finalizado um projeto-lei que tinha como objetivo enquadrar legalmente e regulamentar as plataformas eletrónicas de transporte em veículos descaracterizados.
A proposta tinha sido adjudicada ao Instituto de Mobilidade e Transportes e deveria planificar a introdução de uma nova categoria de serviços de transporte em automóvel ligeiro de passageiros. Adicionalmente, pretendia-se estipular que a Uber procedesse de forma a não entrar em conflito com os serviços prestados pelo setor dos táxis, ou seja, os carros da plataforma digital não poderiam usufruir de uma praça em via púbica nem ser mandados parar sem reserva prévia.
O mês de agosto chegava ao fim, quando a FPT e a Antral pediram que as forças policiais passassem a apreender todos os veículos ao serviço da Uber e da Cabify, durante uma reunião entre os representantes e o Ministério da Administração Interna.
Numa altura em que era desenvolvida a legislação que iria legitimar as operações das plataformas digitais de transporte, o setor dos táxis tornava-se cada vez mais impaciente. Vale a pena recordar que foram várias as situações em que se registou a ocorrência confrontos físicos durante os protestos, sendo os taxistas os precursor das agressões a motoristas da Uber, e não só.
A tão aguardada legislação estava pronta no final de setembro, em linha com as previsões dadas pelo Governo. Mas este novo pacote de regulamentos só deveria entrar em vigor mais tarde, e o Executivo avançava que até ao final do ano seria feita a legalização dos polémicos serviços.
Sabia-se já que os motoristas ao serviço da Uber teriam de passar por uma formação obrigatória de 30 horas e que os veículos teriam de estar todos devidamente identificados com um dístico da empresa.
Por fim, a 22 de dezembro, a proposta de lei era aprovada em Conselho de Ministros e dava-se início ao processo de criação de um novo estatuto jurídico que integrasse devidamente os serviços da Uber e da Cabify na legislação portuguesa.
Certamente esta é uma novela cujo fim está ainda longe de ser visto, mas este documento deverá colocar termo aos protestos de um sector tradicional e com muito pouca – se alguma – competição em Portugal. Aguardaremos o próximo capítulo.
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