A renovação da lei da cópia privada tal como tinha sido definida pelo Governo de Pedro Passos Coelho esteve quase para acontecer: passou pelo crivo dos deputados, da comissão parlamentar e resistiu dentro do possível à contestação popular.
Mas a proposta de lei esbarrou no último bastião, o Presidente da República. Caso Aníbal Cavaco Silva não tivesse optado pelo veto presidencial, então restaria esperar que a alteração legislativa fosse publicada no Diário da República para algumas semanas depois conhecer a sua entrada "efetiva".
Mas o Presidente da República diz que não. Que algo não vai bem com esta proposta da lei da cópia privada. Em resumo o que Cavaco Silva diz é que sim, é preciso rever a lei, mas não, não nestes termos que ainda levantam algumas dúvidas.
O TeK passa agora uma lupa sobre os cinco pontos elaborados pelo PR a propósito do veto.
"1 - Na regulação da matéria relativa à chamada "cópia privada" afigura-se essencial alcançar um equilíbrio adequado entre todos os interesses em causa, designadamente o direito dos autores a serem devidamente remunerados e compensados pelas suas obras e, por outro lado, o direito dos consumidores a aceder, em condições justas de mercado, aos bens e serviços da economia digital."
Neste ponto o Presidente da República reconhece que a lei da cópia privada precisa de ser renovada, para responder à evolução tecnológica assistida e às mudanças no consumo de conteúdos. A SPA por exemplo estava satisfeita por a cópia privada ter voltado à discussão. Mas também pede condições justas para os consumidores, possivelmente com base no receio de que os preços finais dos produtos vão acabar por sair alterados. Por exemplo, um iPad podia ficar quase 20 euros mais caro. A APED já tinha dito que no final, seriam os consumidores os mais prejudicados.
"2 - Não por acaso, o debate sobre a "cópia privada" tem atravessado a União Europeia, sendo aconselhável que, sobre esta matéria, exista uma regulação comum, com vista a evitar assimetrias e disparidades nas condições de mercado, as quais, numa economia globalizada, poderão resultar na aquisição, por parte dos cidadãos de um Estado, de bens e serviços digitais no estrangeiro, com prejuízo para todas as partes envolvidas, ou seja, sem que daí resulte qualquer benefício para os autores nacionais."
Para o Presidente da República, a diretiva europeia será uma solução ideal para um tema tão fraturante. O que Cavaco Silva escreve neste ponto é o mesmo que Paul Meller, elemento da Digital Europe, já tinha alertado: mais valia os deputados portugueses esperarem pelas normas europeias, que são uma prioridade do novo Parlamento Europeu.
O presidente teme ainda que as compras de produtos eletrónicos escape para outras economias, sabendo que atualmente essa é uma tarefa simples de realizar. A APED também já tinha apontado no mesmo sentido.
"3 - É significativo, aliás, que este debate tenha vindo a abranger a própria aplicação dos instrumentos legislativos europeus e mesmo a jurisprudência recente do Tribunal de Justiça da União Europeia."
Aníbal Cavaco Silva sabe que a cópia privada não está a ser aplicada de forma uniforme pela Europa fora. Em Espanha está incluída no Orçamento de Estado. No Reino Unido já se pode fazer cópias pessoais sem qualquer tipo de problema ou compensação. Não há nada que diga que a fórmula X é a mais correta ou a melhor, mas é necessário avaliar as alternativas que já estão a ser executadas.
"4 - É igualmente de ponderar a posição assumida por diversas associações de direitos dos consumidores, com destaque para a Associação Portuguesa para a Defesa do Consumidor - DECO que, em parecer sobre o diploma em apreço, considerou ser o mesmo, e cita-se, "obsoleto, ineficaz e desproporcionado". Afirma ainda que o mesmo diploma não procede a uma distinção clara entre a reprodução legítima e a reprodução ilegal - uma vez que esta última, por força dos desenvolvimentos tecnológicos, não tem vindo a ser efetuada, predominantemente, através dos dispositivos objeto da medida. Considera, por outro lado, que há uma desadequação dos mecanismos previstos para uma correta composição dos interesses em causa e, por último, refere a necessidade de um debate alargado e consistente sobre esta matéria, que abranja todos os pontos de vista existentes."
A DECO não é a única entidade a dizer que a suposta futura lei da cópia privada já está ultrapassada: mais pessoas já chegaram à mesma conclusão e a ANSOL até diz que é uma lei para sociedades obsoletas. Neste quarto ponto também é levantada uma questão relevante, a de pirataria - ou neste caso, a da confusão com a pirataria.
Muitos continuam a defender que a pirataria é que contribui para os prejuízos registados pelos autores e não as cópias privadas. E muitos continuam a achar que depois de pagar as respetivas taxas, que já pode fazer a cópia que quiser dos conteúdos - seja legal ou ilegal. O primeiro debate que houve no Parlamento sobre o tema incidiu quase sobre os mesmos pontos.
Já a referência a "todos os pontos de vista existentes" pode ser uma referência a perguntas que continuam sem resposta, como o facto de a lei da cópia privada ser extremamente limitada pela questão dos mecanismos anti-cópia, conhecidos como DRMs, e que impedem justamente a cópia privada das obras adquiridas pelos utilizadores.
"5 - Importa, também, ter em devida conta as dúvidas em matéria de equidade e eficiência suscitadas pelo facto de serem onerados equipamentos independentemente do destino que lhes seja dado pelos consumidores, assim como os efeitos que podem resultar para o desenvolvimento da economia digital, área em que o País regista algum atraso em relação a vários dos seus parceiros europeus."
Partir do princípio é preferível taxar todos os equipamentos, independentemente do seu uso - excetuando o uso profissional e académico -, é de facto criar um imposto. E o PR chama a atenção justamente para este ponto, que também já mereceu crítica da opinião pública.
Agora resta esperar que a Secretaria de Estado da Cultura e o Governo decidam como querem resolver a questão da cópia privada: se reformulá-la, o que implicará novamente um longo processo de discussão, se simplesmente desiste dela para esta legislatura ou se força a aprovação pelo presidente da República, tal como está previsto no artigo 136 da Constituição Portuguesa.
Escrito ao abrigo do novo Acordo Ortográfico
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