Quantum bits, ou qbits, que representam átomos, iões, fotões e eletrões e que podem guardar e processar dados estão na base da tecnologia que já há muito deixou de fazer parte da ficção científica e tem cada vez mais aplicação prática.
Em conversa com o SAPO TEK, durante o Ciência 19, Lars Montelius, diretor geral do INL - Laboratório Ibérico Internacional de Nanotecnologia, explica como esta revolução tecnológica já está a ser usada e o impacto que pode ter na economia, mas também sublinhou a oportunidade que representa para os jovens que se dedicarem a esta área na sua carreira académica e de investigação.
SAPO TEK: Que perspetivas abre a computação quântica nas suas várias áreas de aplicação?
Lars Montelius: Estamos perante o início de uma nova revolução na área da computação quântica. A partir de material quântico podemos inovar noutras áreas, como é o caso da comunicação quântica, que nos tem dado dados importantes sobre a comunicação entre as pessoas e sobre informação encriptada, que não pode ser roubada. Outro exemplo é a computação quântica, que permite calcular dados complexos de uma forma muito rápida, podendo ser aplicado, por exemplo, na análise da forma como os medicamentos estão a afetar o nosso organismo. A simulação quântica, que permite uma descrição bastante clara de sistemas quânticos naturais através de probabilidade e simulações, em áreas de grande complexa e que pode ir gerindo os quantum sensor para aplicação de sensores mais preciso a nível molecular, obtendo informações precisas, por exemplo, para saber se um tratamento para o cancro está a ter efeito ou não no doente. É um conceito bastante amplo, visto que tudo o que fazemos é hoje em dia é contabilizado e com muita informação podemos ter um sistema de medidas mais eficaz, em quantidades mais reduzids.
SAPO TEK: O protocolo que foi assinado [durante o Ciência 19] focou-se na comunicação quântica aplicada às infraestruturas?
Lars Montelius: A comunication quântica aplicada às infraestruturas é um projeto europeu promovido pela UE que se pretende que seja assinado por todos os membros da União Europeia. Estou naturalmente satisfeito com o facto de Portugal ter assinado este protocolo hoje, depois de alguns países já terem feito o mesmo. Encaro isto como um bom sinal, visto que o governo português está a dar importância a esta área e a levar a evolução a sério.
Esta revolução vai afetar toda a sociedade. A computação quântica é mais importante do que a invenção da World Wide Web e do que a própria Internet, uma vez que tem um maior impacto, que demorará algum tempo a surgir, naturalmente. Algumas coisas serão mais rápidas e outras demoram mais. O paradigma da física quântica tem cerca de 100 anos de idade e desde então temos cada vez mais ferramentas para podermos utilizar este princípios em situações muito complexas.
SAPO TEK: Sei que é uma pergunta muito ampla, mas que impacto é que a computação quântica pode ter nas empresas a nível económico?
Lars Montelius: É quase um impacto garantido. Trata-se de compreender interações moleculares, o que pode não ter um impacto financeiro imediato. O que é mais imediato nas aplicações financeiras e na área das fintech, com fraude, que será um dos que mais rapidamente consegue obter benefícios. Por outro lado, o sector da saúde também tem grande potencial, pela componente das medidas e avaliação das interações moleculares são bastante importantes que vão permitir prever eventos em vez de os resolver, e ter um sistema melhor para nos tornar mais saudáveis. E para isso aplica-se a área dos sensores quânticos. As pessoas não têm de perceber se é quântico ou não, é simplesmente um novo sensor, baseado nos princípios quânticos, que mede alguma coisa nova de forma mais eficiente. Mas há muito mais problemas que podem ser resolvidos com tecnologia quântica, como por exemplo problemas logísticos, com a computação quântica e simulação.
SAPO TEK: Temos visto, inclusive em Portugal, uma aposta em supercomputadores, mas que não resolvem todos os problemas. Qual é a diferenciação?
Lars Montelius: São computadores clássicos, nalguns aspectos, e que não resolvem todos os problemas que demorariam muito tempo a resolver, daí termos de recorrer à física quântica. Mas não é uma escolha entre um ou outro, temos de usar os dois em paralelos. Existem problemas que não são adequados a computadores quânticos e em que usados os computadores clássicos, por isso precisamos de ambos. É, por isso, necessário escolher o melhor método, e ambos os tipos de computação vão evoluir em paralelo durante décadas. Por isso acho que trazer um supercomputador para Portugal é muito importante, e a parceria com Espanha é relevante, mas a ligação com a computação quântica é também importante, manter esta conetividade.
SAPO TEK: É difícil para apenas uma empresa ou universidade desenvolver uma estratégias de computação e comunicação quântica. De que forma devem ser pensadas as parcerias?
Lars Montelius: A forma com a IBM está a desenvolver a tecnologia quântica é excelente e inédita, dando a devida importância ao desenvolvimento de um ecossistema. É a primeira vez que vejo isso a ser implementado desta forma, e está muito bem pensado. Vai haver certamente computadores quêanticos, e alguém os vai construir, e é um negócio em si mas não é tão importante como o ecossistema, todas as startups que vão estar a desenvolver a tecnologia, os mecanismos de ligação entre os diferentes stakeholders. O valor está no lado das aplicações. Não podemos parar na parte material, mas temos de ligar o ecossistema e isso é muito importante porque é uma das razões pelas quais algumas tecnologias ou falharam ou demoraram muito tempo a implementar, porque estava lá e ninguém realmente trabalhava com os sistemas.
SAPO TEK: Já vimos tentações, mesmo nos supercomputadores de alguns governos que não autorizaram a venda de tecnologia por considerarem que estão a fornecer ferramentas mais “poderosas” a outros Estado. Considera que na computação quântica também existe esse risco?
Lars Montelius: Todos os grandes países podem fazer esse tipo de associações, daí termos esses protocolos. Por isso na Europa apostamos nesta parceria na área da tecnologia quântica, com a colaboração entre diferentes parceiros. É tão importante que não podemos confiar noutros para o garantir. E na ciência uma das coisas mais belas é que o desenvolvimento é independente da política, embora haja sempre recomendação e guidance política mas a ciência em si não é política. E isso é bom porque precisamos de trabalhar juntos de uma forma não comercial, e continuar a desenvolver esta cooperação, trabalhar em conjunto e aprender com os outros e evitar polarização.
SAPO TEK: Tendo em conta que existem poucos profissionais especializados nesta área, de que forma é que as empresas e as universidades podem captar conhecimento da geração mais nova?
Lars Montelius: Todos os jovens com formação na área da física quântica terão certamente um futuro garantido. É uma previsão muito segura. E esta é uma das razões pela qual o governo português está a apostar nesta área, numenquadramento alargado, para fomentar o interesse dos jovens numa área onde vai haver muitas oportunidades.
A palavra quântico ainda assusta muita gente, que acredita que é uma área muito difícil, tem muitos conceitos de física, mas a verdade e que nem toda a gente tem de fazer todas as coisas. Precismos de pessoas com competências diferentes que possam usar a tecnologia, por exemplo da área médica, e que queiram entende como podem tirar partido dele.
No futuro é isso que vai acontecer: vamos usar esta tecnologia e algumas pessoas têm a capacidade de a construir e desenvolver e outros vão usar como uma ferramenta e aplicá-la. É parecido com o que aconteceu com a Internet. No início ninguém pensou que a internet ia ser o que se tornou hoje, com os pontos positivos e negativos.
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