A tecnologia de fibra até casa (FTTH) está em destaque esta semana a propósito do congresso que a associação do sector realiza em Milão.

Hartwig Tauber, director geral do FTTH Council Europe, respondeu a algumas questões do TeK sobre a evolução da adopção da fibra na Europa e, mais uma vez, não poupou elogios a Portugal, que tem subido no ranking dos países europeus, o que este responsável atribuiu à actuação do Governo, do regulador e ao dinamismo dos operadores.

Ainda hoje Portugal voltou a ser notícia na conferência pela atribuição de um prémio de inovação à Portugal Telecom, a propósito do qual o responsável pelo FTTH Council cita Zeinal Bava.

[caption]Nome imagem[/caption]TeK: Já destacámos a subida de Portugal no ranking anual do FTTH Council. Que outros exemplos pode apontar com interesse desde o retrato realizado no ano passado?
Hartwig Tauber:
Os últimos números e o ranking global mostram algumas mudanças importantes. Na Europa a Lituânia continua a liderar a lista de países com mais subscritores, enquanto nas regiões a Ásia mantém-se à frente, com países onde o FTTH é muito forte, como o Japão.
Para além do exemplo interessante de Portugal, que já destacou e que teve um grande crescimento, a Rússia está a revelar-se também um bom exemplo porque deu um grande passo em frente e está com uma taxa de penetração da tecnologia semelhante aos Estados Unidos devido ao grande investimento que tem sido feito em desenvolvimento do Fiber to The Building, em que muitos utilizadores estão a apostar porque não existe nenhuma tecnologia que seja concorrente em termos de velocidade de ligação. A Rússia registou as maiores taxas de crescimento do ano de 2010 em números absolutos, aumentando para mais de 895 mil o número de assinantes em apenas seis meses.
Tenho ainda de destacar o caso da Turquia, que era um país de que não se falava e do qual não se esperava grande crescimento, mas que se revelou neste último ano devido à aposta da SuperOnline, que pertence ao maior operador de comunicações móveis do país - a Turkcell. Esta empresa percebeu que tinha de investir em rede de fibra e lançou os serviços em 2009, angariando no primeiro ano cerca de 200 mil assinantes, pretendendo levar em 2011 a rede até 1 milhão de casas.
A subida dos Emirados Árabes Unidos é também muito impressionante. O país está agora em 4º lugar sobretudo devido à forte concorrência entre dois operadores.

TeK: Já tinha discutido consigo o facto da Europa continuar a não ter, como região, a mesma dinâmica de outros países. O que acha que pode ser feito para mudar esta situação?
H.T.:
A má notícia na Europa é que são sempre os mesmos países a continuar a desenvolver a fibra até casa. Mas há uma grande mudança que ainda não se reflecte nestes números, que resulta de uma dinâmica nova nos projectos na Alemanha. Há uma grande concorrência que está a ser feita pelas empresas de cabo à Deutsch Telecom, que já atingem os 100 Mbps, enquanto a operadora de rede fixa não vai além dos 50 Mbps. Por isso começaram a investir fortemente em fibra.

TeK: Pensa que este investimento pode vir a reflectir-se rapidamente nos números europeus?
H.T.:
Não muito rapidamente. A experiência mostra que pode demorar pelo menos dois anos até que sejam conquistados um número importante de assinantes para aparecer no ranking. Vimos isso em Portugal, que começou o investimento em 2009.
Primeiro é preciso ligar as casas e fazer investimento de marketing. Mas nós [no FTTH Council] estamos a tentar dar um impulso ao crescimento na Alemanha e no próximo ano vamos realizar a conferência em Munique para ajudar a uma maior divulgação da tecnologia de fibra.

TeK: Qual é o papel dos Governos e dos reguladores para impulsionar o desenvolvimento da tecnologia? Parece-lhe que é relevante na Europa?
H.T.:
Sim, claro. Volto ao exemplo português. Portugal é um caso de sucesso internacional na fibra: vemos aqui o que acontece quando o Governo diz que é importante desenvolver as redes de nova geração. O facto de essa premissa estar nas directivas cria uma dinâmica de investimento pelos operadores e também de reconhecimento pelo mercado, pelos clientes.
Este compromisso de Portugal em 2009 ainda não existe na Europa, mas já está a começar em alguns países. A Agenda Digital da Comissão Europeia está a ser muito importante e apesar do objectivo de ligar as casas a 100 Mbps até 2020 parecer longínquo, não é. Porque é preciso fazer o investimento já para depois garantir as condições.
O que vimos aqui em Milão é que a Agenda Digital está presente em todos os discursos. Não é uma lei mas está na mente das pessoas. Claro que depois tudo depende da aplicação. Se virmos o caso do Reino Unido, por exemplo, verificamos que apesar de tudo não há dinâmica porque não há metas definidas.

TeK: Não temem que o actual cenário económico possa fazer com que as empresas - e os Governos - tomem opções por tecnologias mais baratas, como o LTE?
H.T.:
Pensamos que o LTE é completamente complementar. Porque esta tecnologia não pode substituir o FTTH no teletrabalho, na videoconferência e no vídeo streaming. É importante para a mobilidade mas mesmo assim temos de admitir que são dois cenários diferentes: posso ver um vídeo com LTE no meu iPad, mas se quiser fazê-lo no ecrã de 42 polegadas as exigências são diferentes.

Além disso, no último ano temos visto que as promessas do LTE são só promessas e não é transparente que se consiga chegar aos 100 Mbps. O que se consegue é uma velocidade que em condições ideais o faz, mas que é partilhada por todos os utilizadores.
Este é um problema que tem de ser considerado pelos decisores, porque esta solução é limitada em velocidade e em possibilidade de evolução.

TeK: Mas há o risco de as opções se centrarem na tecnologia LTE por ser mais barata...
H.T.:
Sim, há esse risco. Mas volto a dizer que são cenários diferente, os de investimento em LTE e FTTH. Os operadores estão a olhar para os investimentos em fibra como uma forma de evitarem a perda de clientes na rede fixa, como o presidente da PT, Zeinal Bava, disse aqui mesmo em Milão quando recebeu o prémio atribuído à empresa. Em 2007 a PT estava a perder clientes de rede fixa para os operadores móveis e agora está a reconquistar clientes.

TeK: E quanto aos investimentos em redes rurais? Alguns estão a contar com financiamento de Bruxelas, que pode optar por outras tecnologias para criar esses acessos.
H.T.:
O Digital Divide é uma grande discussão que existe. Se a Europa quer avançar nas redes rurais e financiar com dinheiro local as ligações deve fazê-lo com FTTH. É uma decisão importante de investimento público e por isso deve assegurar as condições, porque esse investimento dura 7 a 10 anos e depois ninguém vai refinanciar essas redes. Logo à partida devem ser feitas com a tecnologia certa, porque decisões erradas têm grande risco.

TeK: Portugal está precisamente a apostar na fibra para as redes rurais. E o que acontece noutros países?
H.T.:
Mais uma vez Portugal está à frente nesta área. Sei que houve um anúncio importante esta semana. Noutros países as decisões estão atrasadas. Em alguns países há precisamente o debate sobre se deve fazer-se as ligações com FTTH ou LTE...
Só a Finlândia tomou decisão como Portugal, e também Andorra, que quer ligar todo o país a 100 Mbps, definindo como serviço universal. Temos de entender que aí é mais fácil, pelo tamanho do país, mas não deixa de ser uma afirmação forte.

Fátima Caçador