Em declarações à agência Lusa à margem da conferência internacional organizada em parceria com a Agência das Nações Unidas para os Assuntos Espaciais, o presidente da Agência Espacial Portuguesa, Ricardo Conde, indicou que no início da próxima década haverá mais de 150.000 satélites em órbita.
“Estamos a viver de facto um problema de corrida exponencial, com uma atividade comercial muito intensa, problemas de lixo espacial. Este consenso que é necessário ter sobre este problema torna isto um assunto emergente e é preciso regulamentação a nível global”, afirmou.
Da conferência realizada em Lisboa, na terça-feira e hoje, saiu uma declaração que definiu como “um compromisso”, que representa “um olhar convergente sobre o problema da gestão e da sustentabilidade das atividades espaciais”.
De acordo com Ricardo Conde, quando se observam detritos ou partes de satélites a reentrar na atmosfera terrestre, é “a parte boa da notícia”, já que o grande objetivo é conseguir que “reentre tudo”, de forma controlada e mitigando os riscos.
“A grande questão é que passamos, desde a década de 60, a enviar para órbita componentes e não asseguramos a sua reentrada. Neste momento, é quase impossível medir a quantidade de lixo espacial que temos e isto coloca em risco colocarmos mais satélites lá, mas coloca em risco também uma futura presença humana em órbita”, sustentou.
Segundo o especialista no setor espacial, colocam-se problemas a vários níveis. “Estamos a observar cada vez mais serviços espaciais em órbita, que é uma situação que tem uma amplitude que em situações de conflito são táticas e isso viu-se com o Starlink, quando foi a questão da Ucrânia”, exemplificou, referindo-se ao projeto da empresa norte-americana SpaceX.
“Qualquer problema que aconteça a esses satélites constituiu também um risco de segurança e logo uma ameaça e uma escalada, quase como que um ataque a sistemas que estão em órbita e que são de outros países. Isto tem implicações geopolíticas enormes. Aliás, a intervenção da Rússia foi um bocadinho nesse sentido”, acrescentou, ao comentar os trabalhos da conferência.
Para evitar acidentes, ou por negligência ou por falta de coordenação a nível internacional, torna-se necessário “regular o acesso ao espaço” e adotar boas práticas para retirar o lixo, depois da utilização dos equipamentos.
“Estamos a viver um momento em que é preciso atuar em três frentes; a primeira é monitorizar, é mitigar o lixo espacial, para evitar as colisões, a segunda é implementar práticas para que aquilo que se coloque lá em cima se retire passado o tempo de vida”, explicou.
Outro aspeto “extremamente importante”, sublinhou, é a exploração de recursos dos corpos celestes, como os minerais: “Há minerais caros na lua, mas mais do que isso, é um ponto de partida também para, eventualmente, uma militarização do espaço”.
O tema esteve também em discussão na conferência que será um contributo para a agenda da Conferência do Futuro, a realizar em setembro, em Nova Iorque, onde serão abordados vários problemas globais, no âmbito da ONU.
“O espaço é comum a toda a humanidade e não podemos fazer do espaço uma extensão do território”, explicou. A perspetiva de militarização do espaço, inclusive levar armas para o espaço, implica uma frente de trabalho a nível internacional para se definirem boas práticas, por forma a evitar erros passados.
“Por exemplo, a questão da lua, como é que se vai fazer? É o primeiro que chegar, como fizemos nas antigas colónias o primeiro que chegar vai dizer ´aquilo é meu´?, Onde é que está escrito que aquela parte é tua, é minha, é daquele país? A brincar dizemos ´Vamos fazer um Tratado de Tordesilhas para a Lua´?”, especificou o responsável pela agência portuguesa.
“Coloca-se neste momento essa discussão. No início da próxima década, eventualmente, teremos mais de 150.000 satélites em órbita, para providenciar serviços como a internet para os nossos telefones, diretamente, mas há milhões de pequenos lixos, pequenos componentes de lixo espacial. É este o problema que se coloca. A Declaração de Lisboa é no sentido de uma cooperação entre Estados”, declarou.
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