O TeK encerra hoje um espaço de opinião que ao longo dos últimos dias reflectiu sobre a proposta de norma para os documentos estruturados que a Microsoft está a submeter ao organismo internacional de normalização (ISO).

Estes artigos antecedem a votação portuguesa que decorre na próxima segunda-feira, 16 de Julho e que definirá o sentido de voto português sobre a matéria. O voto de Portugal será analisado pela ISO juntamente com o de outros 103 países.

Num artigo que publicámos também esta semana pode perceber a polémica que tem envolvido o processo e os argumentos da Microsoft, que também foi convidada a participar neste espaço de opinião apesar de ter recusado, e da comunidade open source, que se opõe firmemente à normalização do standard.

Coube a Gustavo Homem, director técnico da Angulo Sólido, inaugurar o espaço de opinião, que ontem prosseguiu com Rui Seabra, vice-presidente da Ansol e termina hoje com o texto de Vítor Domingos, co-fundador da 7Syntax. O dia de amanhã estava reservado à opinião da Microsoft, que se recusou a participar.

Já na segunda feira deverá realizar-se a votação da Comissão Técnica, que o TeK irá naturalmente acompanhar.

Opinião: ISO 26300: Formato Aberto de Documentos para Aplicações de Escritório

Vítor Domingos, co-fundador da 7Syntax (*)

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De forma a exemplificar e estruturar um assunto que para muitos é completamente irrelevante, porque ou é demasiado complexo para perceber, ou simplesmente porque não faz parte da sua esfera de conhecimentos, divido-o em cinco partes:



- O que é a norma ISO26300?
O ISO260300 é uma norma internacional, que define a forma como um ficheiro de aplicações de escritório, vulgarmente conhecidas por Offices, se deve estruturar, criando assim uma base de suporte a quem queira ler estes tipos de ficheiros, independentemente do programa que os criou, mas sobretudo permitindo que alguém no futuro os consiga ler ou reproduzir, sem a necessidade de licenciamento sobre o mesmo ou de deter o programa que o criou originalmente. A isto se chama interoperabilidade, colocar vários programas a falarem uma mesma linguagem aberta e livre. Neste caso os programas são os Offices e a linguagem chama-se ODF (Open Document Format), a norma ISO 26300.



- O que é o formato OOXML - Office Open XML?
É um formato proposto pela Microsoft, criadora do pacote de aplicações de escritório mais conhecido (Microsoft Office), onde estão incluídos o Word, Excel e Powerpoint, após entrada de pedido de normalização do ODF, para satisfazer as necessidades da indústria do software, num formato de ficheiros de aplicações de escritório aberto.
Desta forma a Microsoft propõe-se a fornecer uma base de interoperabilidade limitada para com o seu Office. A Microsoft ainda propôs que este formato fosse gratuito e com uma licença perpétua de uso, contudo não sendo livre, é de sua exclusiva propriedade. Adicionalmente a Microsoft assume que não iria processar nenhum utilizador ou programador por usar este formato de ficheiros.



- A necessidade da normalização
A normalização dos documentos de produtividade de escritório nasceu de um pedido pela União Europeia em 2004 para que a OASIS - Organização para a Normalização de Informação Estruturada - e a Microsoft tornassem norma os seus formatos de documentos e que houvesse interoperabilidade entre os dois. Nesse sentido foi aprovado internacionalmente a norma ISO26300, que assenta na norma OASIS Open Office Format (OFF) que mudou de nome para Open Document Format (ODF).
De 2005 até hoje, a Microsoft propôs a sua própria norma, que é suportada já nos seus Offices, aprovada noutra entidade internacional semelhante à OASIS, a ECMA - Organização para a Normalização da Informação e Comunicação Tecnológica na Indústria. Aqui se cria o Calcanhar de Aquiles, onde uma norma internacional para formato de documentos, para uma empresa, aparentemente não chega.



- O que vai estar a votação
A votação terá por base a vontade da Microsoft em deter a sua norma para o seu formato de ficheiros de documentos, diferente da já aprovada internacionalmente ISO26300.
Esta que irá a votação (OOXML) recai sobre um princípio básico: a normalização de um formato de ficheiros que não será livre e do domínio público, contra um outro já norma internacional, completamente livre e de domínio público (ODF).



- Conclusão
Ao aprovar-se internacionalmente mais uma norma de formato de documentos para aplicações de escritório, que satisfaça um único fabricante, abre-se um precedente para a existência de normas internacionais diferentes para diversos fabricantes, caindo no erro de não satisfazer as necessidades de interoperabilidade sobre algo extremamente importante: o nosso maior legado futuro, a forma como podemos interagir com os documentos hoje criados, sem isso constituir um obstáculo económico, científico ou tecnológico.



(*) Vítor Domingos foi ao longo dos últimos cinco anos responsável pelo OpenOffice.org português, um pacote de produtividade baseado em ODF. É actualmente co-fundador da 7Syntax.




Veja também:

Opinião: Porque me oponho ao OOXML?, por Rui Seabra, vice-presidente da ANSOL

Opinião: Microsoft 1 - Interesse Nacional 0, por Gustavo Homem, director técnico da Angulo Sólido

Artigo do TeK sobre o tema:
2007-07-11 - Portugal vota segunda-feira norma proposta pela Microsoft para documentos Office