São quatro os computadores Pentium com acesso à Internet via RDIS
disponibilizados pela Inde - uma organização não-governamental (ONG) que trabalha principalmente na região de Lisboa em vários projectos de luta contra a exclusão nos bairros degradados -, com o apoio financeiro da Fundação Aga Khan, num espaço localizado na Apelação, concelho de Loures.



Todos os dias, entre as 10 e as 18 horas, esse local - cedido pela Câmara Municipal - estava até há pouco tempo aberto a qualquer pessoa que quisesse aprender a trabalhar com o computador e a navegar na Internet ou, para as que já tivessem alguns conhecimentos básicos, utilizar essas novas tecnologias. A única restrição era que cada uma tinha direito apenas a uma hora de utilização.



É aqui, no meio de um bairro de habitação social conhecido por Quinta da Fonte, onde moram centenas de realojados de barracas e bairros de lata de outras zonas do concelho de Loures - na sua grande maioria, de origem africana e cigana -, que teve lugar o projecto Ágora, um conjunto de iniciativas efectuadas ao longo de ano e meio - entre Março de 2000 e Setembro de 2001 - pela Inde, com o objectivo de combater a info-exclusão. Apesar de o núcleo de iniciativas já ter acabado, algumas actividades vão ainda manter-se, como é o caso, do acesso público aos computadores e à Internet.



A esmagadora maioria dos moradores deste bairro nunca utilizou um PC, nem sabe para que serve um rato. É que, "para além de existir um grave problema de analfabetismo, o analfabetismo informático é ainda maior", explica Arnaud De La Tour, responsável por esta ONG. Por outro lado, as escolas das redondezas estão muito mal equipadas, no que diz respeito à informática.



Segundo Manish Bhatt, um dos dois animadores locais da Inde responsáveis por aquele espaço - que é partilhado com outros serviços cívicos e organizações não-governamentais como o Ajuda de Mãe e, dentro em breve, a Cruz Vermelha - "dispõem, no máximo, de dois a três computadores".



Rapidamente, começaram a aparecer pessoas que queriam aprender a utilizar o computador e a Internet, às quais foi dada formação. "Organizámos sessões Descoberta, para facilitar o contacto inicial com os PCs e a Internet. Tratavam-se de mini-acções de formação com a duração de três a quatro horas e acompanhadas por nós", afirma De La Tour.



Em pouco tempo, o local ficou cheio, "chegando às vezes a estarem 20 pessoas naquelas instalações", de acordo com Manish Bhatt. Na sua opinião, os moradores "apropriaram-se positivamente do espaço", tendo o projecto sido bastante acolhido pela comunidade. A funcionalidade mais utilizada era o IRC, mas muitos jovens também recorriam ao Word e à Internet para fazerem os trabalhos escolares.



Porém, "uns poucos tomaram o local de uma forma mais negativa", referindo-se desta forma aos distúrbios que ocorreram recentemente naquelas instalações, provocados por um pequeno grupo de jovens moradores que roubaram um telemóvel e agrediram a sua colega.



Por esse motivo, os responsáveis pelo espaço decidiram encerrar momentaneamente o acesso público aos computadores, até que, juntamente com a direcção da Inde, seja encontrada uma forma mais efectiva de controlo, que, de acordo com este animador local, "poderá passar pela pré-marcação e reserva de uma hora de utilização por cada pessoa". A data de reabertura do espaço poderá já ocorrer em finais de Novembro, segundo Manish Bhatt.



Mas não eram apenas os jovens que demonstravam interesse em explorar as novas tecnologias. Segundo o funcionário da ONG responsável pelo espaço, também vinham muitas pessoas mais velhas, tendo sido criado um curso de formação especialmente dirigido a esta camada da população. Este interesse ultrapassava também as barreiras étnicas. "Havia muitos jovens africanos e também raparigas ciganas que
vinham cá porque queriam aprender informática", uma forma de expandir os seus conhecimentos, já que muitas vezes, devido à tradição desta etnia, as famílias impedem-nas de continuar na escola.



Outra vertente do projecto Agora passou pela formação aos dirigentes
associativos das associações comunitárias e de moradores de bairros carenciados do concelho de Loures, como a Quinta do Mocho, o Catujal e o Prior Velho. Foram realizadas quatro acções de formação - que decorreram nas instalações da Apelação e na sede da Inde, em Lisboa - com uma duração de vinte horas, tendo participado no seu total 10 associações.



O âmbito destes cursos centrou-se na criação de páginas da Web através do Microsoft FrontPage. Das organizações comunitárias que entraram nesses cursos, cerca de sete construíram e colocaram online a sua própria página, quer no site da Inde, quer no serviço gratuito de alojamento GeoCities.



Para o responsável pelo espaço, "o resultado destas acções é bastante positivo, pois não só as associações terminaram as páginas, como continuam também a recorrer à Inde para a utilização de computadores, que alguns deles não dispõem". Alguns dos dirigentes associativos conseguiram posteriormente adquirir os seus próprios PCs, o que, segundo Manish, permitiu que "esse trabalho de formação se multiplicasse, de forma a que os responsáveis pelas associações
comunitárias que frequentaram os cursos pudessem dar formação aos moradores dos seus bairros".



Contudo, nenhuma das páginas criadas foi ainda actualizada, afirma Arnaud De La Tour, reconhecendo em seguida que "falhou algo na formação, pois havia uma necessidade muito forte de trabalhar os conteúdos e nós centrámos-nos apenas no acesso ao medium Internet". Na sua opinião, "a info-exclusão funciona como um processo acumulativo de vários problemas sociais que devem ser combatidos de uma forma integrada, não se resolvendo apenas com o acesso ao equipamento tecnológico".



O projecto Agora começou no Prior Velho, tendo sido posteriormente transferido para a Apelação, uma vez que a Junta de Freguesia local precisava das instalações que a Inde ocupava, tendo a Câmara Municipal de Loures concedido à organização não-governamental este espaço actual. De acordo com Manish, "apesar de ser bem maior que o anterior, não tem visibilidade nenhuma". Com efeito, o rés-do-chão que fica no número 15A da Rua Ary dos Santos situa-se na ponta do bairro: "Há muita gente que não consegue vir cá. O espaço acaba por só servir o
bairro, e não, como gostaríamos, todo o concelho de Loures."



Estas foram as associações que criaram páginas da Web através do projecto Ágora:


Miguel Caetano



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