Os esforços da Microsoft na área da Interoperabilidade têm vindo a intensificar-se no último ano, com a assinatura de uma série de acordos com empresas através dos quais a gigante de software cria pactos de não agressão em termos legais mas também a base para o desenvolvimento de iniciativas técnicas que permitam aos produtos estabelecer melhores ligações entre si num mundo interligado.

Jason Matusow é o Director da área de Interoperabilidade da Microsoft e esteve envolvido nestes acordos, entre os quais os polémicos protocolos com a Novell e mais recentemente a Linspire, que levantaram bastantes questões no mundo open source.

Em entrevista ao TeK este responsável explica a iniciativa e dá uma visão sobre o futuro da interoperabilidade.


TeK – Em que consiste a iniciativa Interoperability by Design, cuja ideia foi lançada por Bill Gates em 2003?
Jason Matusow –
Interoperabilidade by Design é sobre ligar coisas, dados e sistemas diferentes. Como encontrar uma forma das organizações se ligarem entre si, trocarem dados e ter a capacidade de usarem os seus sistemas de forma a reflectir os modelos de negócio e a sua estrutura organizacional.

TeK – A estratégia foi iniciada em 2001 depois dos processos anti-trust em que a Microsoft esteve envolvida e em simultâneo com uma maior pressão da Comissão Europeia. É uma forma de enfrentar esta coacção legal?

J.M. -
Nada disto foi feito por causa dos processos legais. A estratégia resulta de conversas com os clientes, os parceiros e até concorrentes sobre a forma como atingir a interoperabilidade. Se tomarmos em consideração o que se passa com os Governos nos Estados Unidos e na União Europeia, vemos que a Microsoft tem uma responsabilidade. Parte dela vem dos processos legais e outra parte pelo facto de termos tecnologia que é usada de forma tão abrangente. Por isso é uma mistura dos dois factores: pensar em como as tecnologias se ligam – e pode ser uma discussão muito técnica sobre protocolos e interfaces – ou pode ser num nível mais alto, de negócio sobre o papel que a interoperabilidade deve ter, transparência, confiança, segurança, garantias, são todos grandes temas que devem ser endereçados sobretudo quando pensamos no futuro da tecnologia.

TeK – É inevitável ligar a interoperabilidade às questões do open source, sobretudo depois do acordo com a Novell. O crescimento da utilização de sistemas Linux é uma preocupação que motiva o maior envolvimento da Microsoft na interoperabilidade no último ano?
J.M. -
Parte tudo de ouvir os clientes. Os nossos clientes têm ambientes heterogéneos, com software open source, que pode ser Linux, Apache, ferramentas de desenvolvimento ou outras aplicações, mas também tem aplicações Microsoft e de outros vendors comerciais, como a Sun, IBM, Veritas, SAP. É uma combinação destes factores.

Em 2001 a Microsoft começou a entender o desenvolvimento open source e a forma como se aplicava às suas tecnologias e quando pensamos na forma como vai interagir não só a nível tecnológico mas de modelo de negócio e como é que uma empresa como a Red Hat, por exemplo, que vende os seus produtos e serviços sem um modelo de negócio tradicional que se aplicava antes deste modelo. Voltamos por isso à mesma ideia de ouvir os clientes e pensar como isso se aplica ao nosso negócio.

TeK – Mas a Microsoft sente já um grande impacto do mundo open source nas empresas?
J.M. -
Como modelo de desenvolvimento o open source é usado de forma muito abrangente, mas existe uma diferença entre o open source e o Linux, sendo o primeiro uma metodologia de desenvolvimento de software que pode ser usada de muitas formas. A Microsoft, por exemplo, tem uma iniciativa designada Codeplex que é um site de desenvolvimento que tem mais de 500 mil projectos open source baseados em Windows. Licenciamos o código fonte do Windows e os componentes de desenvolvimento.
A questão é não é Microsoft versus open source mas a forma como interagem. Por isso mais uma vez é uma questão de encontrar o equilíbrio entre os vários modelos.

TeK – Esteve envolvido no acordos recentes da Novell e Linspire, entre outras. Mas há uma série de empresas que se recusam a assinar acordos semelhantes por considerarem que não é este o caminho da interoperabilidade. O que pensa sobre esta questão?
J.M. -
A Microsoft olha para a propriedade intelectual como uma das várias peças da interoperabilidade, que é uma fundação para criar colaboração com empresas. Se olhar para o acordo da Linspire, Xandros, Novell, o que eles afirmam é que ouviram os clientes e que para eles é importante a garantia de que têm cobertura para a propriedade intelectual. Mas ao mesmo tempo há a interoperabilidade e a possibilidade de terem sistemas virtualizados, gestão das comunicações, etc.
Por isso acho que tudo o que crie oportunidades para as empresas se juntarem e trabalharem em conjunto é positivo. Estamos à espera de mais oportunidades para novas colaborações e acordos porque é isso que os nossos clientes esperam.

TeK – Olhando de fora desta iniciativa, parece-me que todos os acordos funcionam num nível elevado. Ou são grandes empresas, ou empresas com marcas fortes – como a Linspire. Até que ponto pode a Microsoft “descer” para fazer estes acordos? Poderíamos esperar por exemplo um acordo com uma empresa portuguesa que tenha uma distribuição nacional de Linux (temos uma empresa que é a Caixa Mágica que tem uma versão a ser usada nas escolas e na Administração Pública, por exemplo)…
J.M -
Absolutamente. Estamos abertos a negociações com qualquer empresa. Em 2003 iniciámos uma estratégia que designámos de Open for Business que significa que podemos negociar com qualquer organização que esteja interessada. Como qualquer empresa tivemos que decidir por onde começar e as conversações começaram com a Novell, mas entretanto fizemos acordos com grandes empresas, como a Samsung e a LG, mas também com pequenas empresas como a Xandros e a Linspire e não há nenhum tipo de empresa com quem não considerássemos negociar. Se houver uma empresa em Portugal interessada em fazer um acordo semelhante estaremos abertos a negociar.

TeK – Estes acordos são mais pactos de não agressão para questões legais ou têm aplicação prática na interoperabilidade?
J.M.:
Todos estes acordos têm mais a ver com colaboração e interoperabilidade e todos têm informação técnica sobre formas de colaboração. Alguns têm a ver com formatos de documentos, ou outras áreas, mas não são apenas pactos de não agressão.
As grandes empresas têm muitas vezes acordos de patentes cruzados e a Microsoft também tem, mas este não é o caso porque tem em vista a forma de colaboração e estabelecimento de interoperabilidade.


TeK – Uma das ideias que referiu na sua apresentação foi o facto da evolução da tecnologia, e do mundo do software, ter obrigado as empresas a pensar na interoperabilidade dos sistemas. Quais os próximos passos desta estratégia desenvolvida nos últimos 6 anos?

J.M. –
Quando pensamos no software em geral, houve uma mudança à medida que a tecnologia muda. Antes tinha apenas um computador, agora quero ligar grupos de computadores e a Internet e na Internet como tenho aplicações que possam trabalhar em múltiplos sistemas. E agora temos os telemóveis que queremos ligar à consola de jogos e à televisão de forma a ter todos os equipamentos ligados. E a questão é: o que vem a seguir?

A resposta são os Web Services, um conjunto de tecnologias ou de componentes que permitem às aplicações tornarem-se muito inteligentes para o seamless computing [computação interoperável em todos os dispositivos e locais] de forma a que possamos ter ainda mais facilidade de atravessar diferentes tecnologias e devices.
Para quem está a pensar em interoperabilidade e como desenvolver os seus produtos, tem de pensar nas soluções, na arquitectura e nas comunidades com quem quer trabalhar – que podem ser empresas individuais a trabalhar juntos ou grandes comunidades de programadores – tem de pensar no acesso a propriedade intelectual, como por exemplo uma empresa como a Microsoft se inovar e criar uma nova tecnologia tem que considerar a forma como outros acedem essa tecnologia. E finalmente os standards e aqui há muitas maneiras de trabalhar, que podem ser tão simples como conseguir um acordo num simples componente ou pode ser um enquadramento mais vasto, como os Web Services, em que se trabalha com muitos standards para desenvolver uma solução.


TeK – Mas vamos ter um mundo de aplicações e equipamentos completamente interligados, perfeito para os utilizadores que procuram transparência e facilidade na troca de informação?

J.M -
Este não é um mundo estático, é dinâmico. Sempre que alguma coisa é inventada é preciso pensar na forma de interligar com as outras tecnologias. Ás vezes é e outras não. Depende da tecnologia envolvida. Mas acho que a interoperabilidade é um objectivo comum, embora em determinado ponto possa não ser perfeito, mas isso faz parte da natureza da indústria.

Fátima Caçador

Veja também a reportagem de vídeo sobre esta conferência em
Microsoft defende interoperabilidade em toda a indústria