Este corpo, em órbita de uma estrela a 730 anos-luz, desafia os modelos teóricos de formação de planetas e é considerado um alvo ideal para tentar conhecer o interior sólido profundamente escondido sob as espessas atmosferas dos gigantes do Sistema Solar.
A investigação, liderada pela Universidade de Warwick, no Reino Unido, e com importante contributo de investigadores do IA, agora publicada na Nature, analisou o exoplaneta TOI-849b, descoberto com o satélite TESS, da NASA, em 2018.
Semelhante a Neptuno em tamanho, trata-se de um corpo com a densidade de um planeta rochoso como a Terra, só que com 40 vezes a massa do nosso planeta e cinco vezes a de Neptuno.
Sérgio Sousa, investigador do IA e Universidade do Porto, considera muito desafiante para as teorias de formação e evolução de planetas explicar os processos que deram origem a tal corpo.
“Este planeta revela-se extremamente denso, sendo mesmo até agora o mais denso na sua classe de planetas”, sublinha Sérgio Sousa
Pela sua massa, TOI-849b deveria ter atraído mais gás (hidrogénio e hélio) para formar uma atmosfera densa como as que vemos em Saturno e Júpiter. Em vez disso, parece expor a nu o núcleo primordial de formação destes planetas gigantes. Nestes núcleos, a matéria está sujeita a elevadas pressões, com propriedades ainda mal conhecidas devido ao espesso envelope atmosférico.
“Qualquer que tenha sido a origem de TOI-849b, este não pode ser considerado um planeta completo, mas o núcleo de um planeta massivo ‘falhado’ ou com uma história conturbada”, afirma Vardan Adibekyan, investigador do IA e Universidade do Porto.
“É extraordinário, pois não nos é possível estudar os núcleos dos planetas gigantes do Sistema Solar, mas podemos agora estudar o de um outro planeta nove milhões de vezes mais longe”, refere Vardan Adibekya
Um dos contributos da equipa do IA foi a identificação das propriedades da estrela-mãe, TOI-849, uma estrela semelhante ao Sol, mas um pouco mais velha. A equipa pôde inferir as abundâncias químicas do planeta e as suas proporções de ferro e silício, com base nas quais se concluiu que a atmosfera deste será, no máximo, de apenas 4% da massa total.
Uma combinação invulgar de incapacidade de formar atmosfera e de a perder em grande quantidade estará na origem deste planeta insólito. Igualmente insólito é o facto de se encontrar a tão curta distância da estrela-mãe, algo muito raro para corpos do tamanho de Neptuno. Orbitando-a em apenas 18 horas, a camada exterior do TOI-849b encontra-se a uma temperatura de cerca de 1500 graus Celsius. A sua possível história põe à prova as teorias sobre a formação de planetas.
TOI-849b foi confirmado com vários outros instrumentos, incluindo o espectrógrafo HARPS, instalado no observatório de La Silla, do ESO, no Chile. “Os dados do HARPS permitiram conhecer a massa, e a partir daqui a densidade invulgar do TOI-849b”, explica Susana Barros, investigadora do IA e Universidade do Porto, e igualmente coautora deste estudo. “Estes dados foram obtidos no âmbito de um dos vários programas em que o IA participa para caracterizar a composição de exoplanetas e estimar a frequência de outras ‘Terras’ noutros sistemas planetários.”
“Ao continuarmos a encontrar novos planetas, vamos conhecendo a frequência de cada tipo de planetas. Será este um caso único, ou haverá mais semelhantes?”, diz Sérgio Sousa
Por outro lado, do ponto de vista teórico, será necessário perceber os mecanismos físicos responsáveis pela formação e evolução de planetas, que terão de explicar a diversidade de corpos encontrados, incluindo mundos grandes e muito densos como este.
Os investigadores esperam vir a estudar a atmosfera residual deste planeta, que terá provavelmente origem na evaporação do próprio material sólido sob a elevada temperatura. Esta análise será possível com telescópios ainda em fase de construção, como o telescópio espacial James Webb (NASA e ESA) e o ELT (ESO).
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