Anousheh Ansari, considerada a primeira mulher turista espacial e atual CEO da XPRIZE Foundation, protagonizou uma das sessões mais inspiradoras do 2nd Annual Space Economy Summit 2024. Reconhecida pelo seu papel pioneiro na promoção da exploração espacial comercial, Anousheh Ansari partilhou a sua experiência única e discutiu as oportunidades e desafios da democratização do acesso ao Espaço.

Fundada em 1995, a XPRIZE Foundation lança competições globais para impulsionar inovações em diversas áreas, incluindo energia, saúde, clima e, claro, o espaço. A organização ganhou notoriedade com o Ansari XPRIZE, que desafiou equipas a criarem naves reutilizáveis, contribuindo para grande parte do atual dinamismo da indústria espacial comercial.

“O sucesso deste modelo mostrou que é possível trazer capital adicional e resolver grandes problemas globais através da inovação”, sublinhou durante a conferência.

Em entrevista ao SAPO TEK à margem do evento, Anousheh Ansari explicou como a visita à Estação Espacial Internacional mudou profundamente a sua perceção sobre o mundo.

“Do espaço, percebemos que as fronteiras que vemos nos mapas não são reais. Os problemas são globais, e as soluções também precisam de ser globais”, afirmou.

Esta perspetiva de interconexão também a levou a reavaliar as prioridades da sua vida. “Percebi que gastamos 80% do nosso tempo com pequenas coisas e apenas 20% com as grandes questões. Decidi inverter isso e concentrar-me no que realmente importa.”

Anousheh Ansari também destacou a necessidade de maior diversidade na indústria espacial e tecnológica. Segundo ela, a concentração de tecnologias poderosas nas mãos de poucos países e empresas limita as soluções desenvolvidas.

“As experiências de vida influenciam o que projetamos. Sem diversidade, corremos o risco de criar soluções que não atendem às necessidades globais”, alertou.

A descida significativa dos custos de acesso ao espaço foi um dos temas que abordou na sua intervenção. Atualmente, o custo de enviar um quilograma ao espaço caiu de 25 mil dólares para cerca de 2.500, possibilitando novos modelos de negócio.

Ansari mencionou igualmente o potencial para criar indústrias inteiras no espaço, incluindo a produção de energia, materiais e produtos farmacêuticos em microgravidade. Os centros de dados, sugeriu, poderiam ser transferidos para o espaço, aproveitando a energia ilimitada e o frio natural para reduzir custos e impactos ambientais. “Com a descida dos custos, estas ideias tornam-se viáveis. Precisamos apenas de ajustar tecnologias para o ambiente espacial,” explicou ao SAPO TEK.

Ansari também destacou o papel fundamental dos governos neste processo. Para ela, as agências governamentais podem atuar como primeiros clientes, apoiando pequenas empresas em áreas de risco elevado. O modelo da XPRIZE - em que o objetivo é definido e as empresas competem para apresentar soluções - provou ser eficaz. “Os governos não precisam construir tudo, podem comprar serviços ao sector privado”, afirmou.

Desafios, modelos sustentáveis e futuro na Terra

Mas nem tudo são oportunidades. Ansari alertou para o aumento dos detritos espaciais, um problema crescente que ameaça a sustentabilidade das operações espaciais. A XPRIZE já lançou uma competição para encontrar soluções inovadoras para este problema. Além disso, sublinhou que o desenvolvimento de negócios no espaço - como fábricas em microgravidade - requer a adaptação de tecnologias ao ambiente hostil.

Apesar de reconhecer desafios técnicos, a CEO da XPRIZE acredita no potencial transformador do sector. “Com custos mais baixos, as barreiras estão a cair. Agora é uma questão de mudar mentalidades e construir modelos de negócio sustentáveis”.

Também defende que a democratização do espaço não é apenas um motor de inovação, mas também uma oportunidade para repensar a humanidade. “Quando olhas para o espaço, percebes que estamos todos juntos nesta pequena esfera azul. Precisamos de tomar decisões sustentáveis para garantir um futuro melhor para as gerações futuras”.

Além disso, “o espaço não é um algo ‘lá fora’: está apenas 400 quilómetros acima de nós. Quanto mais cedo percebemos isso, mais cedo podemos usá-lo como recurso para criar soluções que beneficiem todos na Terra”, rematou.