Pedro Domingos é keynote speaker do primeiro dia do Congresso da APDC, que arranca hoje em Lisboa, e onde abordará o tema “Living in a future with AI”.
"A maneira como a IA está a ser regulada, de um modo geral, é completamente errada, em particular na Europa", até porque "tem uma certa tradição de regulações disparatadas", afirma o especialista em IA e machine learning. Neste caso, "um dos erros é a questão da privacidade", aponta.
"O prisma certo é a partilha de dados, não é como é que eu projeto os meus dados dessas companhias maléficas que nos vão manipular, é como é que eu utilizo os meus dados para o máximo benefício para mim e para as causas em que eu acredito", explica o vencedor do "SIGKDD Innovation Award", o prémio mais prestigiado em data science e fellow da Associação para o Avanço da Inteligência Artificial (AAAI) e autor do livro "Algoritmo Mestre".
"É como pôr o dinheiro debaixo do colchão. Com o IA Act [regulação da IA] e o RGPD [Regulamento Geral sobre a Proteção da Dados] vamos manter os dados debaixo do 'colchão'", mas "eu quero investir os meus dados para o máximo benefício", ilustra Pedro Domingos.
E para isso é preciso que as pessoas percebam o que é a inteligência artificial e como podem tirar benefício dela. "A literacia digital é o ponto essencial disto tudo, falta, tem que haver mais", insiste o professor e especialista em IA, referindo que estão a ser dados passos nesse sentido, mas "é preciso acontecer muito mais e acontecer mais rapidamente".
Para Pedro Domingos, "da mesma maneira que as pessoas têm de saber fazer somas e multiplicações, ler e escrever, devem também funcionar com inteligência artificial, é preciso haver uma consciencialização das pessoas para estas coisas". Até porque a IA "está em desenvolvimento muito rápido" e é preciso compreender como se pode trabalhar com esta ferramenta e perder os receios de utilizá-la.
Uma delas é "perderem os medos, porque o medo da inteligência artificial é o medo da escuridão. É preciso ter uma compreensão suficiente da inteligência artificial" e depois, "infelizmente, há sempre alarmistas" sobre a tecnologia, prossegue.
"O medo tem um papel importante", mas é preciso as pessoas verem as oportunidades e estarem preparadas para não serem manipuladas, adverte.
E como é que se aposta na literacia digital? "Tem de haver várias coisas, é preciso haver formações nas escolas, é preciso 'life long learning' [aprendizagem ao longo da vida]", elenca. Até porque as pessoas têm de se habituar "à ideia de que vão continuar a aprender a vida toda, incluindo a Inteligência Artificial", defende Pedro Domingos, reforçando que a IA vai continuar a evoluir até, muitas vezes, em formas que ninguém é capaz de prever.
"A minha atitude enquanto trabalhador é: 'Eu daqui a três anos se calhar vou continuar a fazer o meu trabalho, mas de uma maneira diferente, tenho que aprender" e "parte disso pode ser formação nas empresas", mas as universidades e as instituições internacionais "devem ser os nossos parceiros para a educação para a vida inteira".
Admite que vai haver pessoas para quem estas soluções não funcionam, mas Pedro Domingos recorda que a utilização da IA tem vários níveis e todos a usam sem o saber, como é o caso dos motores de pesquisa, por exemplo.
"Não há nada mais importante hoje em dia como sermos consumidores críticos da informação e o papel dos cientistas, jornalistas e dos educadores é contribuir para isso", afirma o académico, para quem a aposta na literacia digital é cada vez mais premente.
Sobre os riscos da inteligência artificial no aumento da desinformação, Pedro Domingos considera ser "uma ilusão" alguém olhar para a IA "como uma entidade em si própria". "O que devemos ser capazes é ver através da inteligência artificial sobre quem a está a controlar" porque "o perigo não está" na IA.
De uma forma ilustrativa, o perigo "não está na metralhadora, está em quem tem a metralhadora nas suas mãos". O importante é "perceber quem está a utilizar a inteligência artificial e para quê", aponta o académico.
O especialista admite que a inteligência artificial pode ser utilizada "e já está a ser utilizada para gerar informação", o que "é mau". Mas "o mundo já está cheio de desinformação mesmo sem inteligência artificial, as redes sociais estão cheias" disso.
Pedro Domingos destaca que o grande papel da IA na economia "é diminuir o custo da inteligência ou de alguns aspetos da inteligência". Por muito que se gere desinformação, há uma capacidade finita das pessoas em reter e isso não vai aumentar, não esquecendo que também se pode "usar a inteligência artificial para combater a desinformação".
Atualmente, "o papel da inteligência artificial é vastamente maior" que a capacidade de gerar, defende o especialista e professor. "Há milhões de pessoas a gerar desinformação e o que impede de passar" toda essa vastidão "é a inteligência artificial", sublinha. Por isso, "o que precisamos é de mais e melhor inteligência artificial", conclui Pedro Domingos.
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