A aceleração sentida desde o anúncio do modelo de IA Generativa da OpenAI está a demorar a ter impacto no negócio das empresas, que ainda têm de passar dos projetos piloto à operação, desenvolver as competências dos seus recursos humanos e gerir questões de ética e de governance. Estes temas foram destacados na edição de 2024 do IDC Directions, que decorreu entre os dias 2 e 3 no Centro de Congressos do Estoril, onde não faltaram exemplos de boas práticas mas também alertas para a necessidade de avançar de forma planeada.

A IDC prevê que o investimento das empresas na adoção da inteligência artificial (IA), para a melhoria de operações existentes e desenvolvimento de novos produtos e serviços vai ter um impacto económico global acumulado de 17,6 biliões de euros e impulsionar 3,5% do Produto Interno Bruto (PIB) global, em 2030. Em entrevista ao SAPO TEK, Gabriel Coimbra, diretor da IDC Portugal, diz que em Portugal estamos ainda numa fase inicial e há muito a aprender nos próximos anos.

“Há um caminho de aprendizagem a fazer da parte de quem vende as soluções e de quem compra”, explica, lembrando que as organizações precisam de saber como vão criar valor com a inteligência Artificial, a curto prazo, numa lógica de aumentar a produtividade, e a longo prazo para criar disrupção na relação com os clientes, rever os modelos de trabalho e repensar os modelos de negócio.

Gabriel Coimbra defende que é cada vez mais importante ter parcerias estratégicas e de confiança com os fornecedores. Este tema sempre foi crítico, mas “com a IA torna-se mais complexo e importante, porque no passado o fornecedor geria a sua infraestrutura ou os dados, e agora a Inteligência Artificial é a peça que vai gerar código e conteúdo, com toda a relação com o cliente”.

“Tem de haver uma relação de confiança ao nível de governance e gestão de dados, e também alinhamento dos aspectos legais”, sublinha Gabriel Coimbra.

Para já as empresas estão a enfrentar o desafio de gerir essa aprendizagem e passar dos projetos piloto a projetos em escala. “Mais de um ano e meio depois do lançamento do ChatGPT ainda vemos muita experimentação”, referindo que a recomendação passa por criar “power use cases”, em áreas como desenvolvimento de software e relacionamento com clientes, que são áreas chave onde se pode criar grande valor a curto prazo e repensar o modelo de implementação.

Como aconteceu noutras vagas de tecnologia, o sector privado está a avançar mais rapidamente do que o sector público, e Gabriel Coimbra admite que também aqui o desafio é passar de alguns dos casos de pilotos que são conhecidos para a generalização.

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“A Administração Pública ainda funciona muito por silos e temos desafios da interoperabilidade, soberania dos dados e recursos humanos”, refere o diretor da IDC, acrescentando que também aqui é importante fazer parcerias estratégicas mas que para funcionar o modelo é preciso rever a contratação pública, que não está adaptada a estas necessidades.

Durante os dois dias de conferência do IDC Directions várias empresas mostraram exemplos de como a Inteligência Artificial pode contribuir para melhorar processos de negócio mas também a produtividade pessoal. Andres Ortolá, country manager da Microsoft Portugal, partilhou a forma como o Copilot ajuda a simplificar o seu dia, e Sofia Marta, Country manager da Google Cloud Portugal, trouxe também a palco vários exemplos da utilização com o Gemini.

Ainda assim ficam os alertas de que é preciso que a expectativa em relação à Inteligência Artificial e o investimento comecem a corresponder ao valor criado. Tiago Mendes Gonçalves, CEO da InnoWave, avisa que existe o risco de as organizações enfrentarem uma onda de frustração por falta de resultados.

“Já estamos no mercado há alguns anos com soluções de IA e a nossa mensagem é que a Inteligência Artificial traz valor mas tem de se construir pelas fundações, com os dados e a governance […] tem de estar tudo muito bem estruturado e existir visão e estratégia e depois começar os pilotos”, sublinha Tiago Mendes Gonçalves.

Mais talento e formação dos colaboradores

A necessidade de mas profissionais com competências técnicas de IA foi também destacada no IDC Directions, com o estudo da consultora a indicar que a procura por talentos em IA deverá crescer mais de 20% ao ano em Portugal até 2026.

Luisa Ribeiro Lopes, presidente do .PT, lembra que já existe uma intensidade digital grande mas empresas mas que é preciso ter profissionais qualificados nestas áreas. Não é um tema de resolução fácil mas o investimento no talento dentro das organizações “é seguro e com retorno”.

“Sabemos que existe uma falta de talento em áreas tecnológicas e de inovação e temos de investir no re-skilling e up-skilling”, alertou Luisa Ribeiro Lopes durante a sua intervenção, apontando ainda a necessidade de trazer mais mulheres para as áreas tecnológicas e não desperdiçar este talento.

A presidente do .PT relembrou ainda que se fala de tecnologia mas tem de se falar cada vez mais de pessoas e que é preciso dar formação aos utilizadores nas organizações, e chamá-los para a utilização destas ferramentas que vão fazer parte das competências digitais básicas.