O retrato da cobertura de redes em Portugal foi partilhado durante o encontro da Iniciativa Portuguesa do Fórum da Governação da Internet 2023, que decorreu esta semana em Lisboa, e onde participaram representantes da ANACOM e dos operadores de redes, num debate que antecipa o Digital Global Compact promovido pelas Nações Unidas e que pretende estabelecer um consenso global em torno dos princípios e valores a adotar no digital.
Na abertura da sessão, os dados partilhados por Patrícia Silva Gonçalves, vogal do Conselho de Administração da ANACOM, realçaram a boa posição de Portugal em termos da conetividade. Considerando as comunicações eletrônicas o elemento basilar do mundo digital, influenciando positivamente ou negativamente o acesso dos cidadãos à internet, recordou alguns números de cobertura, com as redes de fibra a chegar a 92% dos alojamentos e as estações de base com tecnologia 5G já instaladas em 99% dos conselhos até março de 2023.
A vogal da ANACOM sublinhou porém que não é só a conetividade que tem de ser medida para que o acesso à internet seja relevante e que a qualidade é também um factor a considerar, lembrando ainda que em termos de utilização por parte dos cidadãos, estamos atrás da média Europeia.
Os desafios das zonas onde a cobertura de acesso à Internet é ainda fraca ou inexistente foram também apontados, sendo essencial reduzir as assimetrias, uma mensagem também subscrita pelo secretário de Estado da Digitalização e Modernização Administrativa, Mário Campolargo, na sua intervenção.
Durante o painel dedicado ao tema de "Ligação de todas as pessoas à internet, incluindo as escolas", o trabalho que tem sido feito de conetividade em Portugal voltou a ser destacado por Luís Gaspar, diretor de regulação da ANACOM, que sublinhou porém que para além da conetividade é necessário assegurar a acessibilidade, com custos que possam ser comportados pelos cidadãos, e a vontade de utilizar, uma questão também ligada à literacia digital.
Veja as imagens do encontro Iniciativa Portuguesa do Fórum da Governação da Internet 2023
Especificamente em relação a modelos que possam garantir interesse na utilização da internet pela população que é ainda infoexcluída, Luís Gaspar diz que "estou convencido que o preço é uma das variáveis importantes, e a literacia digital também, embora Portugal não compare mal com a UE nesta área, mas há também um conjunto de use cases que podem ser desenvolvidos".
Do lado da DSTelecom, Ricardo Salgado deu também uma perspectiva de uma conetividade que se tem vindo a alargar também às zonas rurais, partilhando números da rede que este operador de fibra multioperador tem instalado e que já chega a 136 concelhos e a 1 milhão de casas, e que já teve de fazer reforço da capacidade para suportar as exigências de clientes individuais, empresas e organizações.
Para o CEO da DSTelecom, o principal desafio é ainda o da informação, já que reconhece que muitas pessoas e empresas ainda não têm conhecimento sobre a fibra e a possibilidade de usarem os serviços, e é aqui que a empresa tem também investido. Mas avisa que há ainda muito para fazer e que o concurso das zonas brancas, que deverá ser lançado em breve, é um elemento relevante para a melhoria da conetividade.
Ao contrário dos investimentos em autoestradas, que serviram para facilitar a desertificação do interior e a migração para o litoral, Ricardo Salgado defende que o investimento em fibra é um fator de fixação da população. Embora não consiga demonstrar esse facto estatisticamente, sublinhou na sua intervenção que a conetividade nestes territórios é um elemento valorizado e que tem ajudado a fixar a população. "Estes concelhos onde eu opero perderam menos população do que outros do interior", refere.
No mesmo painel, Martijn van Delden, da Amazon Kuiper, explicou os objetivos do novo projeto que está a ser lançado e que aposta na garantia de um acesso de banda larga por satélite a um preço acessível e com uma experiência simples e integrada. Embora não possa ainda revelar quando é que o serviço pode ser disponibilizado em Portugal, o responsável pela área comercial do Sul da Europa admite que pode ser um bom complemento para as zonas do país onde ainda não existe cobertura de rede, oferecendo alternativas aos utilizadores. "No final todos serviços o mesmo objetivo de trazer mais pessoas para participar na economia global".
Concurso para as zonas brancas deve ser lançado "este semestre"
Ricardo Salgado defende também que a primeira condição para garantir esta participação mais alargada dos cidadãos e acesso à Internet é levar boas infraestruturas a todas as famílias, adiantando também que "o país como um todo tem de incentivar e estimular para que as pessoas tirem partido dessa infraestrutura".
A necessidade de aumentar a concorrência foi igualmente sublinhada pelo CEO da DSTelecom e a sua expectativa em relação ao lançamento do concurso de cobertura das zonas brancas, onde a empresa está interessada em participar.
Luís Gaspar lembrou que para além do concurso, "um instrumento em que a ANACOM coadjuvou o Governo" e que tem "expectativa que seja usado o mais brevemente possível", o regulador tem tomado outras iniciativas que se podem refletir em maior instalação de redes de elevada capacidade em todo o país, destacando as obrigações de acesso às condutas e os resultados da análise aos mercados de redes fixa onde foram colocadas obrigações adicionais à MEO para fomentar a concorrência.
"As obrigações de cobertura são essenciais para garantir que o país avança para uma cobertura mais homogénea do território", sublinha Luís Gaspar.
Ainda assim, reconhece que "mesmo que tivéssemos um estado de concorrência perfeita subsistiriam ainda questões relacionadas com a assimetria de poder entre as empresas e consumidores", e isso levou a criar iniciativas como a Tarifa Social de Internet.
Ainda durante a manhã, a secretária de Estado do Desenvolvimento Regional, Isabel Ferreira, voltou a sublinhar a importância da conetividade de redes para o desenvolvimento do país e lamentou o facto de haver ainda várias regiões do país sem cobertura, deixando as populações e empresas privados dos benefícios da Sociedade de Informação. Lembrando que a situação é comum em vários Estados membro da UE, a governante recordou a meta de 2030 para uma sociedade Gigabit, com que Portugal também se comprometeu com a garantia de acesso de toda a população a redes de comunicações de capacidade muito elevada.
A necessidade de investimento público para conseguir esta meta foi também destacada. "Não sendo previsível esta cobertura unicamente através da iniciativa privada, o Governo aprovou no final de 2022 a estratégia nacional para a conetividade em redes de comunicações eletrónicas de capacidade muito elevada", que também está refletido na estratégia Portugal 2030, sublinhou, explicando que o financiamento público é um complemento para o investimento privado nas áreas brancas.
"A par com a Comissão Europeia, Portugal quer garantir que as pessoas tenham o poder de aproveitar plenamente as oportunidades que a década digital traz, dotando o país e as regiões do interior desta rede de comunicações, colocando o país em situação de igualdade", refere, lembrando a importância da conetividade para os serviços das áreas de Proteção Civil, Saúde e Assistência Social, assim como da Educação.
Neste sentido a secretária de Estado referiu os investimentos do PRR na área digital, com uma dotação que representa 22% do total reservado neste programa, que também visa a conetividade nas zonas do interior. E sublinhou que "o Governo tem praticamente finalizado todo o processo do caderno de encargos do concurso internacional [para cobertura das zonas brancas] que irá abrir ainda este semestre, estando mesmo nas últimas fases de negociação com a Comissão Europeia".
Pode assistir a todos os debates da Iniciativa Portuguesa do Fórum da Governação da Internet 2023 através do vídeo partilhado no Youtube.
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