
Por Bruno Gonçalves (*)
Num mundo onde as ameaças cibernéticas evoluem a cada instante, torna-se imperativo repensar a forma de proteção da sociedade digital. A criação de normas de cibersegurança uniformizadas a nível europeu não é apenas uma medida técnica ou burocrática – é um compromisso com a segurança dos cidadãos, empresas e Estados. O objetivo é claro: reforçar a resiliência face a ataques cada vez mais frequentes, sofisticados e impactantes para o quotidiano das sociedades modernas.
Assim como mudanças significativas na vida se constroem a partir de pequenos hábitos diários, a eficácia da Diretiva NIS2 dependerá da incorporação de práticas simples, mas consistentes, enraizadas na rotina das organizações. Essa abordagem transformadora vai além do mero cumprimento de regras, apontando para uma cultura de segurança que se torna parte integrante do dia a dia.
A entrada em vigor da Diretiva NIS2 em Portugal – que substitui a Diretiva NIS de 2016 – é um marco que simboliza esse compromisso. Mais de 160 mil organizações europeias terão de adaptar os seus sistemas de segurança, sob pena de enfrentar multas pesadas que oscilam entre os 7 e os 10 milhões de euros. Esta nova regulamentação transcende a mera conformidade legislativa, representando uma resposta estratégica aos riscos reais que ameaçam a segurança nacional e a estabilidade económica.
Um exemplo concreto dessa ação, é a recente onda de notificações de auditoria promovidas pelo Centro Nacional de Cibersegurança (CNCS) a diversas organizações portuguesas, avaliando o cumprimento da atual Diretiva NIS. Com a iminente transição para a NIS2, é certo que um número ainda maior de entidades será submetido a auditorias, elevando o nível de responsabilidade e rigor na área da segurança digital.
Contudo, a implementação de novas regras não basta por si só. O verdadeiro desafio reside em integrá-las na cultura organizacional, na gestão e no comportamento diário das pessoas. Muitas empresas e cidadãos ainda encaram a segurança digital como mera burocracia, alimentando a perigosa convicção de que “só acontece aos outros”. Nesse contexto, as ideias de James Clear, autor de Hábitos Atómicos, ganham especial relevância: grandes transformações não emergem de mudanças repentinas, mas de pequenas ações repetidas consistentemente.
A eficácia da NIS2 depende, portanto, da adoção de hábitos de segurança que se consolidem no quotidiano. Medidas simples – como a utilização regular da autenticação multifator, a formação contínua dos colaboradores quanto às ameaças cibernéticas e processos básicos de segurança (por exemplo, a gestão adequada de acessos e a atenção redobrada a e-mails suspeitos) – podem significar a diferença entre uma organização vulnerável e uma organização verdadeiramente protegida.
Mais do que o cumprimento de regras, é fundamental moldar uma identidade coletiva baseada na segurança. Ao cultivarmos uma mentalidade do tipo “somos uma organização segura”, ao invés de “cumprimos regras”, estabelecemos uma cultura de comportamento proativo e responsável. Pequenas melhorias diárias, que à primeira vista podem parecer insignificantes, têm o potencial de gerar impactos exponenciais, protegendo dados, reputações e negócios.
Preocupa, contudo, o cenário atual: um estudo recente da IDC revelou que 47% das empresas portuguesas possuem pouco ou nenhum conhecimento sobre a Diretiva NIS2. Essa realidade, refletida também em conversas com diversas entidades nacionais, demonstra que muitas organizações – seja por falta de recursos ou desconhecimento – ainda não desenvolveram uma estratégia clara para a implementação das novas exigências.
Para enfrentar esse desafio, o primeiro passo é realizar um assessment de segurança completo, que permita identificar fragilidades, dependências críticas e processos essenciais, além de garantir a existência de um inventário e de uma análise de risco atualizados – elementos fundamentais para definir ações concretas e estabelecer planos de sensibilização e resposta a incidentes.
Numa segunda fase, a implementação dos controlos de segurança essenciais é imperativa. Destacam-se, por exemplo, o controlo rigoroso dos acessos à rede, a autenticação multifator generalizada e a proteção avançada de e-mail – medidas básicas, mas fundamentais.
Por fim, é indispensável a existência de serviços especializados, como os Security Operations Centers (SOC), que monitorizam, analisam e respondem a incidentes de segurança 24/7. Quando estruturados com uma abordagem MXDR (Managed Extended Detection and Response), esses centros ampliam significativamente as capacidades de deteção e resposta a ameaças, garantindo uma vigilância proativa e um reporting que satisfaça rigorosamente os requisitos da Diretiva NIS2.
A implementação das normas europeias não deve ser encarada como um fardo burocrático, mas sim como uma oportunidade para adotar pequenas práticas diárias que, somadas, constroem uma segurança efetiva. Como enfatiza James Clear, são as pequenas mudanças consistentes que geram grandes resultados. Em matéria de cibersegurança, esses hábitos podem ser determinantes para evitar crises futuras.
Portugal tem pela frente um desafio significativo com a Diretiva NIS2. É hora de reconhecer que a segurança digital vai além de uma obrigação legal – trata-se de uma responsabilidade partilhada, construída dia após dia. Afinal, na vida e na cibersegurança, são os pequenos hábitos que, juntos, constroem grandes mudanças.
(*) BU Manager – Cybersecurity Warpcom
Pergunta do Dia
Em destaque
-
Multimédia
Drones integrados em automóveis elétricos? DJI e BYD já testam tecnologia na China -
App do dia
Tapestry é uma app para ter tudo o que gosta num só lugar -
Site do dia
Jogo online ensina como pequenas escolhas podem impactar saúde e ambiente até 2050 -
How to TEK
Tem o Instagram inundado de posts de contas que não segue? Ponha as sugestões em pausa
Comentários