Por Hugo Oliveira (*)

As grandes crises globais, como a que vivemos de momento, são inegavelmente dolorosas e muito difíceis de ultrapassar. No entanto, tradicionalmente, podem também representar grandes oportunidades: o surto de SARS entre 2002 e 2004, por exemplo, é associado ao crescimento de gigantes do e-commerce (como Alibaba ou JD.com); por outro lado, a grande crise económica de 2008 fez despontar as fintech. Chegados à crise do COVID-19, conseguimos já prever algo de positivo: o crescimento das empresas tecnológicas, o crescimento da importância da tecnologia nas empresas e a alteração da forma como todos trabalhamos

A previsão é de que, num futuro próximo, assistamos à aceleração de processos e tecnologias que já utilizávamos, mas que agora ganham maior relevância: o e-commerce vai crescer ainda mais pois os padrões de consumo estão indubitavelmente focados nos modelos digitais; a transição para softwares na Cloud vai acelerar-se, uma vez que as capacidades de gestão remota e segurança são maiores; haverá uma maior redundância na supply chain, com estratégias que envolvam, por questões de segurança, maiores stocks, capacidade produtiva excedentária e vários fornecedores para um mesmo produto; e o teletrabalho é uma realidade que veio para ficar, evoluindo assim as culturas laborais dos países.

Para permitir que se verifiquem todas as tendências acima referidas, será fundamental – pelo que veremos despontar ainda mais – a Inteligência Artificial (IA). Fei-Fei Li, professor de Ciências da Computação da Universidade de Stanford, refere que “não há nada de artificial [na IA]. Ela é feita por seres humanos, destinada a comportar-se como seres humanos e, em última análise, a impactar a vida e a sociedade humanas” – é precisamente isto que podemos esperar: uma revolução a todos os níveis proporcionada pela IA.

Vejamos alguns exemplos práticos da relevância que ela assumirá na nova realidade:

  • No setor empresarial, as forças de trabalho são agora remotas, uma necessidade que não vai desaparecer tão cedo; ora, as plataformas dotadas de IA permitem simular ambientes de trabalho adaptados e equipados para as necessidades remotas das novas formas de trabalhar. Por outro lado, os softwares de IA possibilitam uma predição muito mais rigorosa quanto às vendas e ao fornecimento, o que por sua vez facilita a criação de task forces específicas e sob demanda, uma necessidade que se verifica cada vez mais nas empresas.
  • No setor industrial, a robótica avançada permite reconhecer objetos e realizar tarefas humanas – assim, as fábricas poderão trabalhar 24/7, em mais localizações e com menor necessidade de operadores, o que levará ao aumento da sua produtividade e eficiência, e ainda à redução do erro humano;
  • No setor do e-commerce, as analíticas avançadas e o machine learning ajudam a otimizar a deteção de novos padrões de consumo – o que permitirá às empresas adaptar a sua oferta de produtos e serviços, personalizando-os e direcionando-os cada vez mais para as necessidades exatas dos clientes.

20De uma forma geral, os tempos de incerteza trazem necessidade de redundância – pois as empresas e os indivíduos querem garantir que possuem todos os bens, equipamentos e meios de que podem eventualmente necessitar. Esta redundância resulta em maiores custos, que a IA também pode ajudar a ultrapassar uma vez que permite uma maior escala e escopo; e ainda traz grandes progressos na área de R&D, permitindo a inovação e o desenvolvimento de novos produtos, soluções e serviços.

A Inteligência Artifical revelar-se-á, portanto, absolutamente obrigatória e indispensável no mundo pós-COVID-19, atuando como enabler da digitalização que não apenas será esperada, como exigida; e também da transição para as novas realidades de vida e trabalho com as quais vamos lidar de agora em diante.

Talvez a adaptação a este “novo mundo” não seja totalmente suave e sem percalços – na verdade, vamos necessitar de aprender muitas novas capacidades e de alterar o mindset a que sempre nos habituámos enquanto sociedade. É, por isso, necessário que comecemos desde já a preparar-nos para esta mudança, e que olhemos para ela como uma oportunidade de aprendizagem, crescimento e progresso para um mundo cada vez mais evoluído – e que, quem sabe, talvez venha a ser até muito melhor do que imaginávamos.

(*) Enterprise Market Sales Director, Sage Portugal