Chama-se Cleópatra é um asteroide com a forma de um "osso de cão" que orbita o Sol na Cintura de Asteroides, entre Marte e Júpiter. De uma ponta à outra, mede 270 quilómetros.
Com recurso ao Very Large Telescope (VLT) do ESO, uma equipa de astrónomos obteve, recentemente, as imagens mais nítidas e detalhadas de sempre, fazendo observações que permitiram determinar a forma tridimensional e a sua massa com o maior grau de precisão conseguido até à data, que levam a novas pistas quanto à sua formação.
Os astrónomos têm chamado “asteroide osso de cão” a Cleópatra desde que observações por radar, obtidas há cerca de 20 anos, revelaram que este objeto possui dois lóbulos ligados por um “pescoço” grosso. Além da forma peculiar, Cleópatra tem em sua órbita duas luas, chamadas AlexHelios e CleoSelene, em homenagem aos filhos da rainha egípcia.
Para saberem mais sobre Cleópatra, Marchis e a sua equipa usaram fotografias do asteroide tiradas entre 2017 e 2019 em diversas alturas, com o instrumento SPHERE (Spectro-Polarimetric High-contrast Exoplanet REsearch) montado no VLT.
À medida que o asteroide ia rodando sobre si mesmo, foi possível observá-lo a partir de diversos ângulos e criar os mais precisos modelos tridimensionais da sua forma obtidos até à data. Estes modelos limitaram a forma de “osso de cão” do asteroide e o seu volume, descobrindo-se que um dos lóbulos é maior que o outro e determinando-se que o comprimento do asteroide é cerca de 270 km, ou seja, cerca da distância entre Lisboa e Faro.
“Cleópatra é realmente um corpo único do nosso Sistema Solar,” diz Franck Marchis, astrónomo do Instituto SETI, EUA, e do Laboratoire d'Astrophysique, França, que liderou este estudo sobre o asteroide, publicado esta quinta-feira na revista da especialidade Astronomy & Astrophysics.
“O estudo de objetos estranhos e aberrantes faz avançar bastante a ciência e eu penso que Cleópatra é precisamente um destes objetos, por isso perceber este sistema múltiplo e complexo de asteroides pode ajudar-nos a compreender melhor o nosso Sistema Solar”.
Num segundo estudo, também publicado na Astronomy & Astrophysics e liderado por Miroslav Brož da Universidade Charles em Praga, República Checa, a equipa detalha como utilizou observações SPHERE para determinar com precisão as órbitas das duas luas de Cleópatra. Estudos anteriores tinham já estimado estas órbitas, mas as novas observações do VLT do ESO mostraram que as luas não estavam onde os dados antigos tinham previsto.
Combinando estes novos valores de massa e volume, os astrónomos puderam calcular um novo valor para a densidade do asteroide, a qual, sendo menor que metade da densidade do ferro, revelou ser menor do que o que se pensava anteriormente. A baixa densidade de Cleópatra, que se pensa ter uma composição metálica, sugere que este asteroide terá uma estrutura porosa e poderá ser pouco mais que um “monte de entulho”, o que significa, muito provavelmente, que se formou quando material se tornou a acumular após um enorme impacto.
A estrutura de monte de entulho de Cleópatra e a maneira como roda dá-nos também indicações de como é que as suas duas luas se poderão ter formado. O asteroide roda quase a uma velocidade crítica (que corresponde à velocidade acima da qual se começaria a desfazer) e por isso até pequenos impactos podem arrancar pedras à sua superfície. Marchis e a sua equipa acreditam que estas pedras poderão subsequentemente ter formado AlexHelios e CleoSelene, o que significaria que Cleópatra é literalmente responsável pelo nascimento das suas luas.
As novas imagens de Cleópatra e os resultados que daí se obtêm foram apenas possíveis graças a um dos sistemas de ótica adaptativa avançada em uso no VLT do ESO. A ótica adaptativa ajuda a corrigir as distorções causadas pela atmosfera terrestre que faz com que os objetos pareçam desfocados - o mesmo efeito que faz com que as estrelas “cintilem” quando observadas a partir da Terra.
Graças a estas correções, o SPHERE foi capaz de obter imagens de Cleópatra, localizado a 200 milhões de quilómetros de distância da Terra quando está na sua posição mais próxima de nós, apesar do seu tamanho aparente do céu ser equivalente ao de uma bola de golfe situada a 40 km de distância.
O futuro Extremely Large Telescope (ELT) do ESO, com os seus sistemas de ótica adaptativa avançados, será ideal para obter imagens de asteroides distantes tais como Cleópatra.
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