Na próxima segunda-feira, 16 de Julho, é definido o sentido de voto português para a polémica questão da potencial nova norma para documentos estruturados. A proposta submetida é da Microsoft que liderou o desenvolvimento de um formato para suportar os documentos que integram a suite de produtividade do Office, posto agora à consideração da ISO que decidirá se este se converte ou não numa norma internacional.



O processo tem gerado controvérsia porque já existe uma norma certificada para este tipo de documento, criada no âmbito do fórum OASIS, um organismo que reúne uma larga participação da indústria, incluindo a própria Microsoft.



Com a submissão de uma nova norma a Microsoft fez levantar uma onda de contestação, encabeçada sobretudo pela comunidade open source que se opõe fortemente à ideia e se tem organizado numa campanha internacional que pretende influenciar a decisão dos organismos competentes.



Em Portugal o processo de normalização do Open XML ou OOXML, designação do formato proposto pela Microsoft, está a ser apreciado por uma comissão técnica criada pelo Instituto de Informática em quem o ISQ - Instituto Português de Qualidade delega competências no que se refere às normas para as Tecnologias da Informação. Esta comissão técnica avalia o processo e define o sentido de voto português que será somado a outros 103 votos de outros tantos países onde a decisão final produzirá efeitos.



Comunidade open source contesta processo



Entre as principais críticas e argumentos contra a normalização do OOXML está o facto de já existir uma norma aprovada para o mesmo fim. "Com dois standards (ISO) para a mesma especificação parece-me que, mais cedo ou mais tarde, um canibaliza o outro. Não me parece de facto viável a coexistência", considera Vitor Domingos responsável pelo OpenOffice.Org português, um pacote de produtividade que utiliza a norma já aprovada, o OpenDocumentFormat (ODF).



"Contudo e caso coexistam passa a haver um standard livre e outro proprietário. Um que facilita a sua adopção (ODF), outro que com mais de 6 mil páginas complica (OOXML). Um que é submetido pela comunidade, outro controlado por um empresa", continua.



Para a Microsoft, a submissão de uma nova norma não é uma tentativa de castração da norma já existente, mas "uma resposta às exigências da indústria", defende Marcos Santos, responsável pela estratégia de plataformas da Microsoft Portugal. Para o responsável, o OOXML responde à necessidade de uma norma aberta, que assegura retrocompatibilidade e acesso aos documentos daqui por vários anos.



Marcos Santos lembra que em várias outras áreas coexistem mais do que uma norma e acrescenta que o trabalho da Microsoft pretende dar um contributo positivo ao mercado que, em última análise, é quem deve ter o poder de definir qual das duas normas responde melhor às suas necessidades.



A visão não é partilhada pela comunidade open source que acusa a empresa de tentar submeter uma norma que não é totalmente aberta e que por isso manterá a Microsoft "como entidade privilegiada na sua implementação", aponta Gustavo Homem, director técnico da Ângulo Sólido, uma empresa especializada em serviços profissionais de open source.



"Quando produzimos cada vez mais informação em formato digital temos a obrigação de nos perguntar se pretendemos deixar registos para o futuro, ou se pretendemos que a informação gerada seja perdida, numa idade das trevas digital", diz Rui Seabra, presidente da ANSOL recuperando um dos argumentos usado nas campanhas internacionais contra a aprovação do standard, que em Portugal também deram origem a uma petição.



27 ISVs portugueses já trabalham com Open XML



A Microsoft defende-se explicando que o Open XML não é uma norma apenas sua, já que conta hoje com os contributos de vários parceiros da indústria onde se incluem nomes como a Intel e a Toshiba, entre outros. Além disso, sublinha a empresa, o Open XML já é uma norma EGMA que tem vindo a contar com o apoio crescente da indústria. Só em Portugal já são 27 dos ISVs a trabalhar com open XML. Frisa por outro lado que existem já hoje no mercado (ou estão em desenvolvimento) várias aplicações que convertem ambos os formatos, pelo que a impossibilidade de acesos aos dados nunca se colocará.



Quando ao ODF, a norma foi aprovada pela ISO em 2005 e conta hoje com algum suporte da indústria, embora não se possa dizer que beneficie de uma utilização generalizada porque como lembra Vitor Domingos há diferenças entre normas ISO e normas de mercado. "A indústria Web2.0 (Google, redes sociais, web offices) estão de facto a adoptar o ODF como standard, sobretudo por uma questão de liberdade e propriedade intelectual. Na indústria de software (grandes softwares houses), a adopção está longe de ser realidade".



Em Portugal há instalações em algumas instituições de ensino, no Instituto de Tecnologias de Informação da Justiça - ITIJ (que suporta a norma mas não a tem implementada) e nos privados é conhecido o exemplo do Banif.



A próxima reunião da Comissão Técnica, presidida por Miguel Sales Dias - que é também director do Centro de I&D da Microsoft Portugal, aspecto que contribuiu para a polémica - produzirá o sentido de voto português, com mais de um mês de antecedência face ao dead line imposto pelo ISO, sublinha Gustavo Homem que considerava essencial um período de discussão e reflexão mais alargado.



Na última reunião da comissão portuguesa, que serviu sobretudo para eleger o presidente da comissão técnica e discutir aspectos relacionados com as atribuições da mesma comissão, estiveram presentes 12 pessoas, das quais apenas 8 (uma por organização) foram constituídas como vogais, votantes.



Na próxima e última reunião espera-se um debate aguerrido porque será altura de decisões, mas também porque o número de participantes deverá ser significativamente maior. Mário Valente, presidente do ITIJ e um dos membros da CT, disse ao TeK já ter recebido mais de uma dezena de pedidos de participação de pessoas ou organizações. Os novos membros podem entrar na CT propostos por um dos vogais já existentes e aprovado pelos restantes.



Nos processos que decorrem nos vários países ISO, a Dinamarca, a Áustria, a Sérvia, o Egipto, entre outros já aprovaram o OOXML. A decisão final internacional pondera os votos da maioria com votos qualificados, que na fase de aceitação da proposta para discussão acabaram por garantir o sim ao início do processo.



Ao longo dos próximos dias o TeK publicará um conjunto de artigos de opinião que procurarão ajudar a esclarecer os leitores sobre o processo de votação que se aproxima e as implicações - ou não - de uma eventual aprovação para a indústria.




Cristina A. Ferreira



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