Hoje assinala-se o Dia das Telecomunicações e da Sociedade da Informação, uma data criada pela União Internacional das Telecomunicação (ITU na sigla em inglês), que este ano destaca o papel fundamental das TIC na recuperação após a pandemia de COVID-19, seguindo o mote “Acelerando a transformação digital em tempos difíceis”.
Se antes da pandemia a Internet já era para muitos uma ferramenta quase indispensável, a crise de saúde pública veio reforçar a sua importância nas nossas vidas. Mas o panorama nem sempre foi assim.
Na viragem do milénio, a Internet como a conhecemos dava os seus primeiros passos e, na altura, a World Wide Web era vista simplesmente como uma novidade intrigante, que deixava no ar a promessa de revolucionar a forma como comunicamos. À medida que a “autoestrada da informação” começava a ser alcatroada e que os serviços de Internet se tornavam disponíveis ao público, nascia uma geração digital.
Quem é esta geração e como é que a Internet moldou as suas vidas? O SAPO TEK falou com nove jovens, com idades entre os 11 e os 24 anos, para perceber as suas experiências, receios e perspetivas em relação ao futuro.
O primeiro contacto na “infância” da WWW
Para a maioria dos jovens com quem falamos e que já estão na casa dos 20 anos, o primeiro contacto com o mundo online surgiu na escola. A chegada da Internet às suas casas só aconteceria mais tarde, motivada maioritariamente pelas necessidades de pesquisa para trabalhos escolares.
As aulas de TIC afirmaram-se como um local onde a descoberta das possibilidades da Internet ficou não só marcada por alguns jogos, mas também pela “porta de entrada” do motor de pesquisa da Google.
Para João Freitas, de 21 anos, a sua primeira memória da Internet remonta ao 1º ano do Ensino Básico.
“Aos seis anos já tinha ouvido os meus colegas a falar, por exemplo, de jogar no Miniclip”, conta João Freitas.
“Ao iniciarmos as aulas de informática, foi para tal que muitos utilizaram as «caixas» ainda com um sistema operativo anterior ao Windows XP na sala de computadores da Escola”.
O jovem relembra ainda os tempos em ele e a vasta maioria dos seus colegas partiam à aventura na Internet para tentar saber se o Google tinha realmente a resposta para todas as suas perguntas.
Para lá das aulas e das pesquisas para trabalhos da escola, a Internet começou a estabelecer-se na vida dos jovens como uma nova forma de se manterem entretidos, entre websites de jogos, como o Friv ou Club Penguin, e o YouTube, mas também de manterem o contacto mesmo à distância. Mariana Santos, de 21 anos, ainda se lembra de falar com os seus amigos pelo MSN e explorar a novidade das redes sociais através do Facebook.
Mas, por entre o fascínio por este novo mundo havia regras a seguir. Tanto Bárbara Magalhães como Catarina Albuquerque, ambas com 21 anos, afirmam que, na altura, a navegação online era sempre feita sob a vigilância dos pais. Já para Mariana, o acesso à Internet estava mesmo limitado a partir das 22h até entrar no ensino secundário.
O medo também marcou as primeiras experiências dos jovens, incluindo o receio de ser enganado por internautas mal-intencionados, de ser vítima de um predador online, de ver a sua identidade a ser roubada, ou de infetar o seu computador com algum vírus.
“Quando era mais novo, tinha receios sobre os vírus que se podiam apanhar em determinados websites, porque ainda não tinha muito conhecimento sobre isso”, recorda Afonso Andrade, de 16 anos.
Também João se recorda como o malware teve um impacto significativo na sua relação com a Internet, em particular, depois do computador de um dos seus colegas ter sido infetado pela primeira vez.
“Estávamos minimamente conscientes dos perigos, mas, como crianças, pensávamos que nunca aconteceria connosco. Após o incidente, alguns dos meus colegas demoraram uns dias a voltar à Internet. A paradoxal ideia que o mundo no conforto do quarto podia ser muito menos seguro que fora dele foi difícil de conceptualizar”, admite.
Preocupações num mundo online em constante mudança
Tiago Alves, de 11 anos, Pedro Diogo, de 15 anos e Afonso fazem parte da geração que nunca viveu sem Internet, e admitem que é difícil conceber uma realidade sem todas as ferramentas disponibilizadas pelo mundo online. Aliás, afirmam que, sem elas, a sua vida seria certamente muito diferente daquela que têm atualmente, com um forte impacto nos seus hábitos e hobbies.
Embora todos os jovens com quem falámos considerem a Internet verdadeiramente indispensável, seja a nível académico, para entretenimento, e para aceder a serviços essenciais, existem preocupações acrescidas em relação à segurança, à privacidade dos seus dados e à desinformação que tão facilmente permeia as redes sociais.
Apesar de afirmar que a sua “aprendizagem ao longo dos anos” o tenha ajudado a lidar de uma melhor forma com o lado mais negativo da Internet, André Rosa, de 24 anos, ainda tem algum receio de “perder as suas contas devido a um hacker”.
Os websites falsos, muitas vezes usados em esquemas fraudulentos, são também vistos como fontes de preocupação às quais se mantém atentos. Estabelecendo um contraste com os seus tempos de infância, Pedro Sousa, de 20 anos, afirma que, “utiliza a Internet para tudo e quase a toda a hora” e que tem receio de websites que se disfarçam de páginas legítimas, como serviços de homebanking.
Quando questionados acerca do que mudariam na Internet, o grupo enfatiza tomaria medidas para torná-la mais segura, para limitar a “exploração da privacidade dos dados pessoais de cada utilizador”, tal como afirma Mariana, e para impedir outros de “extorquirem e de manipularem os mais frágeis”, como enfatiza Bárbara.
Segundo André, as alterações que faria não seriam tanto à Internet em sim, “mas sim às pessoas que a usam”, sublinha, mencionando questões como conteúdos de ódio online, com “comentários racistas e xenófobos”.
Como será o futuro da Internet?
É certo que da primeira vez que foi estabelecida uma ligação ARPANET em 1969, quando dois computadores separados por mais de 500 quilómetros de distância conseguiram comunicar, ou quando Tim Berners-Lee desenvolveu o sistema de base para armazenar e reconhecer associações de informação semântica, poucos imaginavam que a Internet se tornaria numa parte tão importante das nossas vidas, ao mesmo tempo que trouxe uma nova série de desafios.
Recorde-se que, nos últimos anos, o próprio “pai” da WWW tem estado empenhado uma cruzada que pretende “arranjar” o que está errado na sua criação, com as falhas de segurança e privacidade na primeira linha das preocupações do Contract for the Web, numa lista onde se juntam a desinformação e a limitação de privacidade.
Durante a edição de 2020 do Web Summit, Tim Berners-Lee defendeu que os utilizadores não têm de ser especialistas em privacidade para se protegerem e têm de ter controlo sobre os seus dados.
Porém, “não se pode deixar de usar a web e começar a usar a nova web”. Assim, a mudança tem de ser gradual e a implementação do Solid, um protocolo e plataforma que promete dar aos internautas o controlo ativo dos seus dados, e da forma como os partilham, está a ser promovida pela Inrupt, a startup que criou para este fim.
Mas, como é que esta geração imagina o futuro da Internet, por exemplo, no espaço dos próximos 20 anos? Os jovens preveem que se tornará ainda mais rápida, mais segura, além de passar a estar disponível para a vasta maioria da população mundial.
“Hoje, a Internet já nos permite fazer tantas coisas sem ser necessário sair de casa ou esperar em longas filas para aceder a um determinado serviço. Mas, no futuro, tudo isto estará muito mais optimizado” e funcionará “de uma forma muito mais rápida e fiável”, afirma Pedro.
Por outro lado, André defende que o mundo online se assemelhará cada vez mais aos universos apresentados pelos filmes de ficção científica. Quem sabe se um dia não precisaremos dos “tradicionais” computadores, smartphones ou tablets para aceder à Internet, mas sim de interfaces de realidade virtual ou implantes cerebrais como os que estão a ser desenvolvidos pela Neuralink de Elon Musk? Apenas o tempo e a capacidade de inovar o dirão.
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