Em vigor há poucos meses, a Lei do Comércio Electrónico (Decreto-Lei nº7/2004) tem sido alvo de uma das principais polémicas jurídicas em Portugal nesta área, quer pelo atraso na sua transposição, quer pela própria "originalidade" de partes do seu texto, que fogem às regulamentações estabelecidas pela Directiva Europeia que transpõe (Directiva 2000/31/CE). Um seminário hoje organizado em Lisboa pelo Centro Atlântico, dedicado ao tema CiberLaw'2004, reuniu vários juristas especializados nesta matéria, trazendo novamente a debate algumas das questões mais delicadas do diploma e da dificuldade da sua aplicação.




Embora ainda estejamos no princípio da aplicação deste quadro legal, como afirmou Pedro Amorim, o jurista considera importante discutir a aplicação da Lei do Comércio Electrónico. Mostrando-se preocupado sobretudo com a "originalidade" de algumas das medidas adoptadas, que não faziam parte da Directiva Europeia, Pedro Amorim afirma que "um país pequeno como Portugal não pode nem deve dar-se ao luxo de ser original nestas matérias", justificando que as empresas que querem investir em tecnologias pressupõem que as diferenças legais no espaço europeu são poucas e que estas se podem apresentar como um entrave ao seu interesse em Portugal.



Por muito que os académicos gostem de introduzir estas modificações às directivas esse caminho não é o mais aconselhado, "a não ser que se queira passar da chamada Estratégia de Lisboa para a do Tagus Park, em que vamos de Plano de Acção em Plano de Acção até à derrota final", completou Pedro Amorim, jurista da PriceWaterhouseCoopers em Portugal.




O deputado José Magalhães, moderador do debate, definiu o diploma como "sui generis", congratulando-se por este não ter criado uma ciberpolícia total em termos de regulamentação de conflitos. Mas, explica, que ao apontar para a Anacom como Entidade de Supervisão Central, com atribuições em todos os domínios regulados, sem prejuízo do recurso a outras entidades específica, cria uma possibilidade de conflitos positivos e negativos, que irão certamente surgir quando formos confrontados com os primeiros pedidos de fornecimento de informação, encerramento de sites ou outras matérias que fazem parte da actual realidade da Sociedade da Informação.


Salientando a falta da regulamentação de litígios prevista no Decreto-lei, para a qual ainda não é conhecido um projecto, Manuel Lopes Rocha, um dos mais destacados autores nesta área, co-autor do recente "Guia da Lei do Comércio electrónico" e responsável pela secção de Direito das Novas Tecnologias e Comércio Electrónico da Ordem dos Advogados, destacou algumas incompatibilidades entre este diploma e outra legislação já em vigor, como é o caso do Decreto sobre Assinatura Electrónica.




Autor do parecer da Ordem dos Advogados, Manuel Lopes Rocha salientava já nesse parecer, que o diploma "um texto estruturante e fundamental para o desenvolvimento da Sociedade da Informação e do Comércio Electrónico em Portugal exibe um conjunto impressionante de entorses e desvios, não apenas do parâmetro juscomunitário, mas também da Constituição da República Portuguesa que não nos podem deixar indiferentes".


A reapreciação Parlamentar do Decreto-Lei foi já solicitada por um grupo de deputados e deve decorrer até ao Verão. Também na sequência do parecer da Ordem dos Advogados sobre esta matéria o Bastonário da Ordem dos Advogado, José Miguel Júdice, solicitou já formalmente ao Provedor da República que pedisse ao Tribunal Constitucional a apreciação da constitucionalidade do Decreto-lei.



A reapreciação parlamentar poderá dar origem a modificações dos aspectos mais controversos, nota Manuel Lopes Rocha.

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