O projeto já está a ser pensado há vários anos e a Start Campus está a posicionar o Sines Data Center Campus como um hub estratégico para a infraestrutura digital na Europa, e um portal de IA para a Europa, com uma oferta chave de 1,2GW de energia. Na semana passada inaugurou o SIN01, que já é o maior datacenter em Portugal, mas há mais um edifício a ser preparado, o SIN02, e um plano para construir mais quatro datacenters no mesmo local.

Robert Dunn, CEO da Start Campus, explicou em entrevista ao SAPO TEK, a visão da empresa e o trabalho que está a ser feito para desenvolver o projeto que assumiu há cerca de ano e meio, e não fugiu às questões mais difíceis relacionadas com a operação Influencer que colocou o Sines datacenter na mira das autoridades.

A inauguração oficial do SIN01 contou com representantes do Governo português, da Embaixada dos Estados Unidos da América (EUA) em Portugal e outras autoridades nacionais e regionais, sendo sublinhado o valor estratégico do projeto que é um dos maiores investimentos privados em Portugal, reconhecido como Projeto de Potencial Interesse Nacional (PIN) desde 2021. São 8,5 milhões de investimento na construção do campus, que se podem multiplicar com mais 30 mil milhões considerando o investimento dos clientes na preparação dos datacenters.

Veja as imagens do campus de Sines

Os 8,5 mil milhões são uma estimativa conservadora para a construção dos seis edifícios […] não sabemos se vamos fazer os edifícios totalmente adaptados, ou construir apenas a infraestrutura para os clientes adaptarem”, explica ao TEK Robert Dunn.

“Os 30 mil milhões adicionais são o que antecipamos como mínimo do que os nossos clientes vão gastar para implementar a sua infraestrutura, os GPUs e equipamentos de TI que vão estar no datacenter”, clarifica o CEO da Start Campus.

Mesmo olhando para os 8,5 mil milhões é um investimento de grande dimensão, e o CEO do Start Campus explica que está a ser feito investimento e a criar postos de trabalho, com empreiteiros que vão estar ligados ao projeto nos próximos 5 anos, para o desenvolvimento dos próximos edifícios, e com envolvimento de empresas portuguesas. A estimativa de ultrapassar os 8 mil postos de trabalho tinha sido inicialmente avançada para 2025 mas agora Robert Dunn não se compromete com datas.  “Não sei se é em 2028, mas será quando estivermos em operação total”, afirma.

A avaliação do impacto do projeto no emprego e ecossistema económico está a ser reavaliada e “nos próximos tempos vamos ter um estudo independente que vai atualizar a avaliação de impacto e empregos diretos e indiretos”.

O próximo passo é aumentar a capacidade do primeiro edifício [SIN01], temos um funil de clientes que estão à procura de espaço onde já construímos e vamos este ano quase duplicar a capacidade do SIN01, o que vai trazer oportunidades para a cadeia de abastecimento que existe”, destaca.

O maior datacenter em Portugal mas apenas uma “peça” do puzzle total

O SIN01 já está pronto desde outubro do ano passado e em janeiro a Start Campus tinha divulgado um vídeo a dar conta da operacionalização do datacenter.

Os primeiros clientes já estão instalados mas o CEO da Start Campus não revela nomes, adiantando apenas os parceiros de conetividade que são conhecidos, como a Ellalink e a DE-CIX. Há ainda “grandes clientes de IA a implementar computação de alta performance” e hyperscallers com oferta de IA e cloud.

É aqui que a Start Campus está a apostar. “Não temos latências ultra low para nenhum lugar mas temos baixas latências para quase todo o lado e é isso que os nossos clientes estão a valorizar para o treino de IA e inferência de IA”, explica Robert Dunn, lembrando que não estamos a falar de trading de alta velocidade e que a conetividade assegurada em Sines permite 50 a 60 milissegundos “até quase toda a gente do planeta”.

A procura está a crescer e está a ser desenvolvida na Europa pelas empresas e plataformas empresariais de IA. “Vão construir a procura que é necessária para ter uma ‘cloud region’ em Portugal, auto sustentada e que continua a crescer”, defende.

A visão é global mas não deixa Portugal de fora. “Pensamos nisto como um datacenter europeu para clientes globais que querem colocar as suas implementações de IA na Europa”, afirma.

As pessoas estão a reconhecer agora que Portugal é tão bom, se não melhor, para este tipo de implementação do que qualquer outra região na Europa e estamos a receber muita atenção pelo processo de baixo valor, a conetividade, recursos renováveis e a escala do projeto”, adianta Robert Dunn.

É um “portal de IA” com uma oferta que passa pelo treino de modelos de IA, inferência de IA e serviços de cloud que podem ser combinados na mesma infraestrutura. “A opção que oferecemos a clientes que querem desenvolver grandes soluções de IA não está disponível, de momento, no resto da Europa, em termos da capacidade de energia que podemos escalar a 1,2 GW, o tempo de lançamento e o custo total de projeto (TCO) ”, sublinha o CEO da Start Campus, apontando a vantagem competitiva. Já em março o projeto conseguiu a certificação OCP Ready™ v2 Hyperscale, mais um passo a comprovar a adaptação a este tipo de infraestrutura.

Espanha ou França não são concorrentes com a mesma combinação de fatores e mesmo olhando para os países nórdicos Portugal tem vantagens, que já foram identificadas em alguns estudos independentes. “Espanha é concorrente atual para datacenters de menor capacidade, mas vai demorar alguns anos para chegarem a um nível próximo de 1 GW a funcionar”, detalha, enquanto na escala dos megawatts de energia de IT “outros concorrentes que parecem ter disponibilidade de energia são os nórdicos […] mas eles não têm muitos projetos planeados na mesma escala que este”.

O SIN01 tem uma capacidade de 26 MW e o SIN02 vai chegar a 180 MW porém Robert Dunn diz que há clientes que podem precisar de mais de 200 MW, o que não é possível de garantir num único edifício. Isso pode fazer com que, em alguns momentos do projeto, tenha de haver dois datacenters a serem construídos ao mesmo tempo.

A vantagem competitiva é que a Start Campus já garantiu licenças para a construção dos 6 edifícios e tem a flexibilidade para chegar a 1,2 GW de capacidade de IT porque tem a ligação à rede da REN.

Edifício SIN01 do Sines Data Center Campus
Edifício SIN01 do Sines Data Center Campus créditos: Start Campus

Há projetos anunciados noutras áreas da Europa que dizem que vão ter mais de 1 GW mas a energia não está confirmada e vai demorar alguns anos até ser entregue no site e não têm o licenciamento”, lembra. “Nós conseguimos demorar 3 a 4 anos a planear o projetos e quando falamos com os nossos clientes sobre implementar uma solução de IA podemos dizer: aqui está o design, o edifício, a energia e o site - já podem avançar connosco e se quiserem podem estar a implementar em algumas semanas, e isso não está disponível em mais nenhum sítio à volta da Europa”.

O custo total do projeto [TCO] mais baixo é um atrativo importante, que pode ter impacto nos clientes da Start Campus mas também nos utilizadores finais, que podem ser as startups portuguesas que estão a usar a IA. “Acho que todos sentem que neste momento a IA como produto é muito dispendiosa, se olhar para ChatGPT e para todos os produtos que estão a chegar ao mercado”, refere.

Onde estamos a tentar ajudar é a garantir um menor custo de propriedade para os nossos clientes que depois passa para os clientes finais”. Isto inclui custos de construção baixos que Portugal tem, o custo de energia e o custo geral de operação.

Sustentabilidade é obrigatória para o futuro

Um dos diferenciadores do projeto de Sines é a utilização da água do mar para arrefecimento, um sistema de que Robert Dunn fala com orgulho. “As pessoas estão a tentar resolver o problema da eficiência há muitos anos, e a baixar o uso de energia a usar água de torres de arrefecimento, mas isso cria outros problemas”, justifica. Com a proximidade do Atlântico a Start Campus quer usar a água fria do mar sem desperdiçar recursos.

“Este sistema de arrefecimento está a atrair a atenção dos clientes mas também tem benefícios ambientais”, destaca o CEO da empresa, adiantando que “se quisermos sobreviver a longo prazo neste negócio a sustentabilidade e foco ambiental é absolutamente obrigatório”.

Na equação entra também a utilização de fontes de energia sustentável, sendo que Portugal já gerou em 2024 mais de 87,4% da energia com fontes renováveis e no projeto a ambição é ainda contribuir para aumentar essa percentagem, com a associação a projetos diretos com produção de energia solar e eólica nos próximos anos.

Mais datacenters num ecossistema que destaca Portugal

A inauguração do SIN01, que ocupa a posição de maior datacenter em Portugal, contribui para o desenvolvimento de um ecossistema que já ganhou reconhecimento internacional. A maioria dos grandes centros de dados está localizada em Lisboa e arredores, com players como a AtlasEdge, Claranet, Edged ou a Tata Communications, e a Altice tem o seu datacenter na Covilhã que estará à venda e no qual a própria Start Campus já mostrou interesse.

Robert Dunn defende que há espaço para construir outros datacenters de grande dimensão em Portugal. “Do que vejo noutros mercados é que a partir do momento em que se criam 1 ou dois campus começa a haver mais interesse porque o ecossistema cresce, a conetividade cresce e começa a haver maior perceção do mercado”, afirma.

“Antecipamos que vai haver mais grandes datacenters em Portugal e que os que vão prosperar são os que estão bem ligados, com boa ligação a energia e construídos com uma boa cadeia de abastecimento”, sublinha o CEO da Start Campus.

Chips da Nvidia limitados pelos EUA. Centro de dados de Sines afasta impacto nesta fase
Chips da Nvidia limitados pelos EUA. Centro de dados de Sines afasta impacto nesta fase

A Start Campus está interessada em continuar a investir noutras localizações para além de Sines, mas isso “tem de ser feito sustentadamente, de forma cuidadosa”. “Se escolhermos novas localizações isso tem de ser com os procedimentos corretos e no tempo certo […] quando encontrarmos os locais ideais fazemos o compromisso”, justifica.

“Para já queremos entregar o que prometemos, colocar o projeto em marcha e depois então olhar para novos projetos no futuro”, afirma Robert Dunn.

A garantia de mais clientes para o SIN01 e o início da construção do SIN02, que deve começar ainda este ano, são os objetivos de curto prazo. “Já começámos a preparar o terreno, mas não consigo confirmar quando começamos a construção […] também já comprámos os transformadores para as subestações, um investimento de mais de 20 milhões de euros, com os equipamentos a chegar nos próximos 12 meses”, adianta o CEO da Start Campus.

Impacto da operação Influencer desvalorizado

Robert Dunn não se escusou a responder a questões relacionadas com a operação Influencer em que a Start Campus foi envolvida, no âmbito da investigação relativa ao lítio e hidrogénio verde que levou à detenção do  chefe de gabinete do primeiro-ministro, Vítor Escária, o presidente da Câmara de Sines, Nuno Mascarenhas, dois administradores da sociedade Start Campus, que entretanto já não estão na empresa, e um consultor.

Qual foi o impacto que as notícias tiveram na operação? “Nos primeiros meses muito ruído e discussão e foi uma distração mas a equipa fez um grande trabalho a focar-se no que fazemos melhor, entregar datacenters”, adiantou na entrevista. “Nos últimos 18 meses, com o suporte da nossa cadeia de abastecimento e clientes, conseguimos focar-nos no negócio e estou muito confiante de que colocámos isso para trás. Estamos focados no futuro”.

“Para nós o objetivo agora é continuar o que estamos a fazer e preparar-nos para o que vem a seguir. É um grande projeto, temos uma equipa de excelentes pessoas, estamos prontos para implementar, e mais tarde durante este ano vamos estar em velocidade total”, sublinha Robert Dunn.