A polémica em torno da instalação de antenas de 5G perto de aeroportos dos Estados Unidos continua a ser manchete. Em causa está o receio de que as frequências do 5G utilizadas no país façam interferências com os altímetros de certos modelos de avões. As entidades reguladoras pedem paciência e adiamentos, e a muito custo as operadoras vão cumprindo os pedidos, até se encontrarem as soluções ideais. O lançamento estava previsto para esta quarta-feira, dia 19 de janeiro, havendo um novo adiamento, que por ter sido em cima da hora causou transtornos em diversos voos, afetando companhias aéreas como a Emirates, que cancelou vários serviços.
A principalmente pergunta que tem sido feita é se este problema também afeta a Europa. E para responder a isso, a ETNO, a Associação Europeia de Operadores de Telecomunicações, dos quais fazem parte os maiores fornecedores a nível europeu, incluindo a Altice Portugal como representante portuguesa, elaborou um documento para explicar as diferenças entre os sinais de frequência na Europa e Estados Unidos.
A resposta direta é que o espectro da banda dos serviços 5G nos Estados Unidos é diferente do que é utilizado na Europa, e usa as mesmas frequências de aparelhos utilizados nos aviões. Os modelos de rádio dos altímetros que estão identificados como em perigo de interferência, que são usados para medir a altitude de aviões e helicópteros, trabalham em frequências entre os 4200-4400 MHz.
Nos Estados Unidos, as frequências do 5G em questão podem subir aos 3980 MHz, ou seja, há uma margem de separação de 220 MHz das que funcionam os instrumentos. Mas na Europa, as estações de 5G operam em frequências no máximo até 3800 MHz, o que deixa uma margem de quase o dobro, de 400 MHz abaixo das usadas nos altímetros.
Nos Estados Unidos, estão a ser tomadas medidas para mitigar os efeitos do 5G, nomeadamente a serem criadas zonas de exclusão nas antenas colocadas em torno dos aeroportos, para que as operações decorram sem interrupções nos aeroportos. Os reguladores já aprovaram dois novos altímetros que estão a ser equipados nos aviões afetados pela frequência de rádio apelidado de “Banda C”. Modelos como o Boeing 777 são os mais afetados e o motivo para os cancelamentos da Emirates, que usa esses aviões.
Mas também já foram aprovados vários modelos que podem operar sem perigo, tais como o Boeing 737, 747, 757, 767, MD-10/-11 e Airbus A310, A319, A320, A321, A330 e modelos A350. As modificações dos altímetros já permitiram abrir 48 dos 88 aeroportos identificados como mais afetados pela interferência do sinal 5G nos Estados Unidos. Os altímetros são utilizados para ajudar a navegar os aparelhos automaticamente em situações de fraca visibilidade, tais como à noite ou em condições meteorológicas desfavoráveis.
A ETNO refere ainda que, segundo as entidades regulatórias europeias, os registos atuais não revelam qualquer dado relativo a interferências entre os serviços 5G e os altímetros, mesmo que o desenvolvimento do 5G já tenha alguns anos, diz a entidade. Destaca ainda que a Europa tem um modelo de governação sólido sobre as condições para o uso das frequências de espectro, incluindo as do 5G.
Fruto disso foi a criação do Comité de Comunicações Eletrónicas (ECC) no CEPT, com um grupo de trabalho específico que reúne todos os “stakeholders”: os reguladores de telecomunicações, os reguladores da aviação, mas também representantes tanto dos operadores Telecom como as transportadoras aéreas. O grupo ficou encarregue de realizar todos os estudos relevantes para a coexistência entre os serviços 5G e a aviação.
Solução dos aeroportos de França é o barómetro da Europa
Além do relato da Agência Europeia de Segurança da Aviação, que em dezembro de 2021 referiu não ter o registo de qualquer interferência na Europa, outros reguladores europeus também já se pronunciaram em sintonia. O regulador de telecomunicações da Noruega diz que as redes 5G desenvolvidas no país e na Europa usa frequências inferiores às dos Estados Unidos e outras partes do mundo. Ainda assim, afirma que no Japão, estão a ser utilizadas frequências próximas dos altímetros, através de dezenas de milhares de estações de 5G em utilização e até agora não foi reportado qualquer interferência. O regulador alemão também reforça que as medidas feitas pela França e Noruega não registaram interferência em instrumentos.
O SAPO TEK quis saber a opinião da Anacom (regulador de telecomunicações português) e da ANAC (Agência Nacional de Aviação Civil) sobre a questão nos aeroportos portugueses. A Anacom confirmou ao SAPO TEK a existência das diferenças entre a Europa e Estados Unidos, mantendo-se alinhada com o que diz a ETNO e restantes reguladores europeus.
A ANAC diz basicamente o mesmo, que em Portugal o problema não se coloca pelos mesmos motivos que no resto da Europa. As frequências utilizadas nos Estados Unidos “traduz, de um ponto de vista teórico, num risco acrescido para que ocorram interferências dado o modo de funcionamento de um sistema de rádio altímetro (emitindo um sinal, e depois analisando o sinal refletido no solo para calcular a distância ao mesmo), podendo as estações 5G mais próximas interferir no sinal refletido, resultando em leituras erradas de altimetria”, explica a fonte oficial da ANAC ao SAPO TEK.
O regulador de aviação português disse ainda que a EASA já desenvolveu um estudo, tendo concluído que não existe interferências nas redes europeias de 5G nos radio-altímetros, “tendo publicado um SIB (Safety Information Bulletins) dirigido aos operadores com Certificado de Operador Aéreo autorizados a voar para os USA, entre os quais a TAP, para chamar à atenção dos eventuais problemas aí existentes e das normas vigentes”.
Salienta ainda que as bandas de frequências autorizadas pela Anacom no leilão 5G tem na sua frequência máxima valores que estão longe da mínima de operação dos radio-altímetros. Ainda assim diz que está a monitorizar o assunto.
A França tem sido utilizada como exemplo do que está a ser feito na Europa, em comparação com os Estados Unidos. As zonas de exclusão (buffer zones) em França têm um perímetro de 96 segundos de voo, com salvaguardas permanentes. Enquanto que nos Estados Unidos tem apenas 20 segundos que estão a ser colocados nos 50 aeroportos para os próximos seis meses.
Por outro lado, a potência do 5G em França é de 631 Watts, ao passo que nos Estados Unidos é 2,5 vezes superior, ou seja, 1.585 Watts. Outro pormenor nas antenas de 5G é o seu ângulo. Nos Estados Unidos as antenas estão colocadas de forma vertical, ao passo que na França estas têm de ter uma ligeira inclinação para o solo, para diminuir a possibilidade de projetar o sinal para o ar, em direção aos aviões.
Assim, os Estados Unidos parecem agora “correr atrás do prejuízo”, procurando fazer as alterações necessárias inspiradas em França para mitigar os riscos. E isso é o que tem causado transtornos nos aeroportos. Mais que um problema técnico, parece haver um “pingue-pongue” entre a indústria de telecomunicações e a de aviação, para compreender quem é que vai “pagar a conta”. De um lado os investimentos avultados na compra do espectro de frequências dos operadores, que não querem fazer mais investimentos com a tecnologia, mas sim lançar os serviços para a rentabilizar. Do outro a necessidade de as companhias aéreas terem de modificar ou substituir os seus equipamentos nos aviões. No meio parecem estar os reguladores, divididos entre a aparente “falta de segurança” com a necessidade de desenvolver o 5G no país.
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