O coração de muitos portugueses palpita pela chegada de serviços como o Netflix ao mercado nacional. Muitos utilizadores têm boas ligações de Internet em casa e gostavam de poder, apenas à distância de uma aplicação, aceder a milhares de filmes e séries. Tudo mediante o pagamento de uma mensalidade acessível.



O Netflix, em específico, já está a chegar à Europa. Mas continua-se sem saber quando é que pode chegar a Portugal – se será em breve ou se será apenas no médio prazo. Outros serviços como o Amazon Instant Video, Hulu, HBO Go e Sony Video Unlimited também estão longe dos portugueses.



E a existência de alternativas economicamente acessíveis e com interfaces simples, onde a experiência de utilização não tem quaisquer barreiras ao consumo instantâneo, pode ajudar na luta contra a pirataria de conteúdos, um dos grandes males desta indústria.



Porque razão não existem Netflixs em Portugal? Onde é que está a razão que explica a ausência da maior parte dos grandes serviços de streaming na área do vídeo, quando na música o Spotify, o Google Play All Access e o Deezer já vão fazendo as honras da casa?



É responsabilidade das grandes editoras internacionais? É responsabilidade das entidades de gestão de direitos de autor em Portugal? É responsabilidade do país que não tem um mercado suficientemente atrativo? Qual a razão que continua a justificar o facto de haver um problema, haver uma solução aparente, mas a mesma não estar disponível globalmente?



Acordos de cavalheiros preguiçosos?


As questões foram colocadas ontem, 25 de novembro, durante o debate que discutiu a questão da cópia privada e o facto de a distribuição de conteúdos via streaming estar a anular a razão de ser desta taxa.



O diretor da angulo sólido, Gustavo Homem, deu o seu exemplo e explicou que mesmo após alugar uma máquina virtual nos EUA e de usar um software de Virtual Private Network (VPN), continuou sem poder usar o Netflix – a razão residia no número de cartão de crédito que era português. Gustavo Homem diz estar disposto a pagar, mas infelizmente não tem soluções legais disponíveis para o seu propósito.



O também defensor do software livre aponta as suas razões para que isto aconteça. “Os que negoceiam os direitos de autor, se calhar são duas ou três entidades em Portugal, são eles quem têm os contactos com as entidades internacionais. E provavelmente estão a trabalhar ao seu ritmo normal porque não há um incentivo de haver mais concorrência. Ou seja, de haver gente a fazer isso para eles sejam mais rápidos”.

[caption]Netflix[/caption]

Mas as críticas também foram para outras paragens: “Provavelmente os seus parceiros internacionais também não estão para se chatear para falar com mais gente e com gente diferente, e tudo o que acontece no final é um prejuízo, porque esta situação não é economicamente racional. As “SPAs” podiam ter a iniciativa de falar com os “Netflixs” ou com outros, ou de falarem diretamente com os estúdios e eles próprios montarem a solução”, considerou Gustavo Homem.



Relativamente à questão da distruibição de conteúdos Pedro Carlos, professor universitário e antigo empreendedor na área das telecomunicações, deu também o seu contributo para que melhor se possa perceber a não-chegada de serviços de video streaming a Portugal.



“A indústria de conteúdos é uma indústria geograficamente muito regulada e geograficamente estruturada. Ter um direito para passar um filme em Portugal é muito diferente de ter um direito para passar um filme na Islândia ou nos EUA. O que se passa com serviços como o Netflix ou outros, e tanto nos filmes como na música, os direitos são negociados para geografias”.



“O que acontece é que se eles querem lançar os direitos para Portugal, de um filme americano, têm um pequeno problema. É um problema que não é evidente para muita gente, mas é um problema muito simples: é que as editoras já negociaram os direitos de transmissão com Portugal com uma distribuidora cá em Portugal. A Netflix para conseguir lá dos EUA emitir por streaming para Portugal tem que vir cá negociar com quem tem os direitos em Portugal. E isso demora muito mais tempo”.



Pedro Carlos terminou a sua explicação de forma irónica: “E depois o que é que eles fazem? Não começam por Malta. Vão à Alemanha primeiro e depois vão ao Reino Unido”.



Netflix de bigode

[caption]Netflix[/caption]

Podem as sociedades que gerem os direitos de autor fazer um pouco mais, tal como sugeriu Gustavo Homem?



Pedro Carlos comenta: “Julgo é que as sociedades que gerem os direitos de autor estão a montante. Elas na prática vão gerir os direitos com uma editora, que depois é uma distribuidora para várias geografias. A partir do momento em que essas sociedades negociaram os seus direitos com uma major qualquer, a partir daí já não podem renegociar com outros porque já disseram 'eu deleguei naquela entidade a distribuição dos direitos para estas geografias todas'”.



“O que acontece é que hoje não há muitas plataformas, não há 'Netflixs' portugueses aí a pulular. Porque depois há um tema que é o mercado que é razoavelmente pequeno, a tecnologia é razoavelmente cara de desenvolver e os engenheiros apesar de tudo ganham razoavelmente bem e é um risco de negócio que não é evidente. É preciso que alguém arrisque um desenvolvimento”, considera o académico.



A PT Portugal e a NOS parecem, à partida, dois players com condições para desenvolver um Netflix à portuguesa. A questão já tinha sido abordada pelo diretor comercia do SAPO, João Paulo Luz, em conversa recente com o TeK. Mas Pedro Carlos também deu a sua opinião sobre o tema.



“Se repararem o NOS Videoclube ou o MEO Videoclube são mini-Netflixs, têm uma usabilidade muito discutível ou muito focadas na televisão, que é o principal negócio, mas não me admiraria que essas soluções surjam. Mas depois entramos naquela equação: o que é que é relevante do ponto de vista da dimensão para eles investirem? Serão só os geeks que vão ver no computador?”.



“Isto para ter adesão”, considera o investigador, “para inverter aqele grande lote de pessoas que até estão disponíveis para pagar mas não muito, o valor que consegues captar é pequeno e o custo que tens é razoavelmente grande. Tens que ter muitos utilizadores para pagar”.

Rui da Rocha Ferreira


Escrito ao abrigo do novo Acordo Ortográfico

Não perca as principais novidades do mundo da tecnologia!

Subscreva a newsletter do SAPO Tek.

As novidades de todos os gadgets, jogos e aplicações!

Ative as notificações do SAPO Tek.

Newton, se pudesse, seguiria.

Siga o SAPO Tek nas redes sociais. Use a #SAPOtek nas suas publicações.