Alexandre Oliveira, diretor de social CRM da E.Life no Brasil, falou com o TeK e partilhou a sua visão sobre a forma como as empresas estão a tirar partido das redes sociais. O que já fazem bem e mal e o que ainda podem fazer.



A E.Life é especialista na monitorização e análise de interações geradas pelo utilizador nos media sociais. As suas ferramentas permitem medir a popularidade das marcas nesses espaços e, num modelo de outsourcing, presta serviços de relacionamento nos media sociais a empresas, uma área de negócio que está a tentar lançar em Portugal, mas que já conta com algumas grandes marcas no Brasil.


A E.Life nasceu no Brasil e chegou a Portugal em 2007, representada pela Seara.com. Hoje está no país em nome próprio, chegando também já a outros mercados europeus.

Alexandre Oliveira passou por Lisboa para reuniões com potenciais clientes, partilhando experiências relativamente ao trabalho desenvolvido na América Latina, onde o uso das redes sociais pelas empresas começou mais cedo.

[caption]Alexandre Oliveira, E.Life[/caption]

TeK: Como estão as empresas portuguesas a tirar partido da Internet e das redes sociais para se relacionarem com os seus clientes? A aposta nacional nesta área ainda é um pouco tímida, correto?
Alexandre Oliveira:
A grande razão para as empresas portuguesas ainda não terem aderido às redes sociais como ambiente de relacionamento / atendimento é, na minha opinião, uma questão de volume. Quando falamos no Brasil falamos em 180 milhões de pessoas. Uma pequena percentagem de pessoas que adira a uma rede social em termos absolutos já representa um valor elevado. Portugal é um país mais pequeno e por isso o número de pessoas disponíveis para se relacionarem com empresas nas redes sociais é menor. Acredito que as empresas portuguesas não se movimentaram tão rapidamente como no Brasil precisamente por não terem essa necessidade e não tanto por uma questão de cultura, ou de não acreditar. É acima de tudo uma questão de oferta e procura: se for preciso fazemos. Se não for esperamos. Portugal está nessa fase, à espera, reconhecendo no ambiente da rede os seus consumidores e o que está a acontecer...



TeK: Isso quer dizer que o primeiro impulso está sempre do lado da procura?
Alexandre Oliveira:
Sem dúvida. Porque o relacionamento na rede social só acontece por causa dos utilizadores. Não é uma escolha da empresa estar na rede social. Não foi uma opção de um CEO, ou de um diretor de marketing. Foi o consumidor que escolheu e é um canal muito diferente do contact center, de uma carta ou de outros meios onde a empresa impõe as regras de comunicação com o cliente. Na rede social o consumidor escolheu aquele ponto de contacto e as empresas estão a adaptar-se e a estruturar-se para ouvir e falar nesses canais.



TeK: Quem já deu esse passo e já está nas redes sociais. Está a fazer bem ou mal, esse trabalho de interação?
Alexandre Oliveira:
Todos estão a aprender como fazer. Há muita gente a fazer mal, muita gente a fazer mais ou menos e pouca gente a fazer bem, na verdade. Há muita gente sem saber como fazer bem. Toda a gente sabe dizer o que se deve fazer - estar presente e aproveitar a oportunidade - mas menos gente sabe como fazer.

TeK: É aí que a E.Life intervém, ajudando as empresas a perceber como fazer?

Alexandre Oliveira: Sim, nós prestamos um serviço. Não vendemos software ou plataformas de interação porque não podemos entregar um produto nas mãos do cliente e esperar que ele faça o trabalho sozinho. Vendemos o serviço. Fornecemos pessoas que fazem essa interação em nome da marca. No fundo a lógica é a que se aplica à terceirização de qualquer outro serviço.

É um trabalho que estamos a fazer há quase três anos e temos crescido com os clientes. Começamos com um cliente e hoje temos cerca de 15 grandes marcas a trabalhar connosco. Nesse período fomos aprendemos, errando e acertando. Fomos criando metodologias e processos.


TeK: E o serviço que prestam aos clientes é apenas fornecido num modelo de outsourcing, ou também formam recursos dentro das empresas com quem trabalham?

Alexandre Oliveira:
Não fazemos trabalho de consultoria. A nossa oferta passa por fornecer o próprio serviço. Na verdade não conheço quem faça consultoria nesta área. O que existe são produtos de software que permitem às empresas fazer internamente o trabalho, beneficiando de alguma formação do fabricante do software para capacitar os seus recursos para o fazer.



TeK: E Portugal o que estão a fazer?

Alexandre Oliveira:
Em Portugal para já só fazemos monitorização, ainda não fazemos o relacionamento das empresas



TeK: É fácil delinear estratégias e medir resultados da interação criada nas redes sociais? Para o cliente é fácil compreender o retorno do investimento nessa área?

Alexandre Oliveira:
Começamos sempre pela monitorização de tudo o que se fala da marca nos pontos diretos de contacto que esta tem na rede social. Essa recolha de informação é um ponto de partida para estabelecer um relacionamento com o cliente. A partir daí conversamos com as pessoas, fazemos o relacionamento através do nosso software e tudo o que nós fazemos - todas as interações, o sentimento da resposta, o assunto que gerou o contacto - é apurado na hora e em tempo real, através de relatórios de gestão.


TeK: É fácil convencer as empresas a estar em plataformas que têm duas vias de comunicação, como as redes sociais?

Alexandre Oliveira:
Essa é a grande barreira de entrada das empresas na rede, até por uma questão de herança da publicidade e do marketing tradicional. A empresa costumava criar o seu conteúdo, lança-lo e ter todo o controlo sobre ele. Na televisão, na rádio, no outdoor é assim. A empresa lança e o consumidor engole de qualquer forma. Na rede social quando alguma coisa é lançada ou publicada haverá sempre alguém do outro lado para responder. O gestor de marketing normalmente ainda acha isso um pouco estranho e acaba por funcionar como uma barreira de entrada. Também por isso muitas empresas usam a rede social ainda para fazer uma comunicação unilateral, sem a preocupação de estarem estruturadas para fazer o relacionamento. Contratam agências para disseminar conteúdo e não têm ninguém a postos ali, se de repente o utilizador tem uma dúvida, quer colocar uma questão. Essa é, entre outras, de facto uma barreira de entrada. Mas as pessoas já estão a perceber que muito mais do que fazer publicidade têm de dialogar na rede.


TeK: Quem dá mais facilmente esse passo. Empresas grandes, pequenas…tem a ver com a dimensão ou o setor ou sobretudo com questões de cultura?

Alexandre Oliveira:
Penso que tem sobretudo a ver com questões de cultura e de gestão. Pelo menos no Brasil - e acredito que aqui também - a gestão ainda é muito analógica. Os gestores ainda pensam muito offline. Os diretores de marketing estão nessas funções há muito tempo e novidades deste tipo assustam um pouco. É por isso que acredito que a mudança vai fazer-se sobretudo com a chegada de uma nova geração de gestores à liderança. Quando a faixa que hoje tem 20 a 25 anos chegar à gestão das empresas essa barreira tende a desaparecer porque nesse universo toda a gente acredita que esse é o caminho.



TeK: Fala-se bastante no potencial da web e das redes sociais como montra para as empresas pequenas, com menos recursos para divulgar o seu negócio e os seus produtos, mas os exemplos de sucesso que se relatam acabam por chegar sempre de grandes empresas. Conhece histórias de sucesso em PMEs?

Alexandre Oliveira:
Na minha experiência de facto só tenho exemplos de empresas grandes. Porque o buzz na rede é normalmente de empresas grandes, conhecidas, que estão na boca do consumidor. São essas que conseguem um grande volume de referências ao ponto de se justificar assegurarem uma resposta ao que se diz. Não tiro o mérito às empresas pequenas, mas ao não serem tão conhecidas pelos consumidores não geram um volume de referências significativo. Isto permite-lhes criar um canal nas redes sociais e lançar conteúdo sem que exista já um boca-a-boca a seu respeito. Têm pouco a perder mas mais dificuldade em se fazer notar.


TeK: Há quem defenda que a prazo as redes sociais assumirão um lugar que hoje é dos contact centres, tornando-se canal preferencial para o contacto com o cliente. Acredita nisso?

Alexandre Oliveira:
Acho que é uma coisa provável. Tenho quase certeza absoluta de que este é um caminho sem volta. Não será no curto prazo que a rede social vai substituir os outros canais e também não me parece que seja uma coisa disruptiva. Acho que são coisas complementares e vão coexistir, como hoje também coexistem vários meios de contacto com as marcas. As empresas continuam a receber cartas. A televisão não derrubou a rádio. Não me parece que a rede social vá substituir os outros pontos de contacto com o consumidor, mas acredito que irá completar e tenho a convicção que vai crescer muito.

A nova geração já não vai aderir às formas de contacto tradicionais e os seus canais preferenciais passam necessariamente por alguma forma de rede social, no PC ou no telemóvel. Isso é certo, mas é difícil prever tempo.



TeK: Como vê a evolução das redes sociais e o número crescente de fabricantes interessados em estar neste mercado, como a Google com o novo Google +, por exemplo?

Alexandre Oliveira:
Não acredito que o Google + vá ter grande sucesso. Posso estar enganado é claro, mas acredito que cada um deve fazer aquilo que sabe fazer bem. O Facebook é, na minha opinião, a maior rede social de todos os tempos. Atende muito bem a todos os requisitos da conversa com os amigos, do lazer, do diálogo. As funções, aplicações, a versatilidade da plataforma e a sua capacidade para suportar vídeos e as mais diversas aplicações… o Google é o número um no mundo, rei da busca de palavras, de indexação de conteúdos. É sem dúvida a empresa com maior capacidade para entregar um conteúdo relevante em resposta a uma pesquisa. O Twitter, por seu lado, é o melhor na lógica da comunicação instantânea via microblogging.
Cada um sabe fazer melhor uma coisa e não acredito que quando uma empresa sai do seu melhor para tentar simplesmente competir com outro, mais por uma questão de ego do que por uma questão de dinheiro, vá sair-se bem. O serviço não tem nada de melhor e tem pouco de diferente. Uma das principais diferenças é a possibilidade de criar círculos de amigos, mas na verdade essa é uma diferença que só serve para dar mais trabalho ao utilizador. Na Internet como se sabe menos é mais, por isso não acredito que essa característica traga muito valor acrescentado.



TeK: De qualquer forma, é nesta linha das redes sociais que vê evoluir o relacionamento online entre empresas e consumidores então?

Alexandre Oliveira:
Sim, mesmo que amanhã não seja o Facebook ou o Twitter tal como os conhecemos hoje, a dinâmica do relacionamento digital e da rede social não volta atrás. O caminho é por aqui. Depois existem outras tendências a emergir, tirando partido destes fenómenos, como o auto-atendimento, que já está a ganhar uma forte expressão no Brasil.



TeK: Como funciona?
Alexandre Oliveira:
Todo o trabalho de atendimento que falámos até agora é feito com base em texto. O cliente pergunta e a empresa assegura que alguém do outro lado responde. No auto-atendimento identificamos as ocorrências mais comuns, como as reclamações por exemplo, e criamos respostas. O Santander é um cliente nosso Brasil que está a desenvolver esta área. Para responder às reclamações que diariamente se revelam em maior número o banco criou vídeos didáticos que permitem ao utilizador tirar dúvidas sobre determinado tópico. Fá-lo através da rede social, numa área a que chama Santander Responde. Clicando, o utilizador é conduzido a uma nuvem de palavras, escolhe a que se relaciona com a sua dúvida e seleciona um dos vídeos disponíveis para esclarecer a questão. Se não encontrar vídeo continua a ter disponível um campo de texto para colocar a questão.

No futuro acredito que esta é uma área também com muito potencial para evoluir. Acredito que daqui a algum tempo as empresas terão já, não apenas o vídeo pré-gravado, mas o interlocutor em direto do outro lado à espera das perguntas. Nesta linha vale a pena pensar que o Facebook fez recentemente uma parceria com o Skype que nos deixa a pensar o que vem por aí.



TeK: Esse tipo de comunicação da marca com o cliente é nova sobretudo porque passou a estar no perfil da empresa na rede social, porque algumas organizações já apostavam nesse género de conteúdo nos seus sites institucionais…

Alexandra Oliveira:
A questão é que hoje em dia a navegação www no browser está a acabar. Já ninguém navega de um conteúdo para outro por essa via, a não ser quando se anda à procura de alguma coisa específico. Tirando essas situações as informações chegam-nos, através dos serviços que usamos. É a web semântica, que está neste momento a compilar os nossos gostos, interesses, amigos e a "obrigação" dos novos players e de quem faz conteúdos é que isso chegue aos consumidores através das redes sociais. Nos locais onde o consumidor já está, no seu ambiente.

Acredito por isso que este conceito do auto-atendimento tem mais hipótese de dar certo nas redes sociais do que nas plataformas institucionais das empresas.


TeK: As marcas que apostam nas redes sociais costumam começar por onde pelo atendimento ao cliente ou pelo relacionamento?

Alexandre Oliveira:
Pelo atendimento, acredito. É importante que a empresa tenha a questão do atendimento resolvida antes de tentar ser ativo e procurar uma relação de maior intimidade com o cliente. Por exemplo, se tenho uma queixa da TAP que não é atendida e depois passo pelo perfil da empresa na rede social e percebo que esta está a agradecer um elogio a um cliente é um incentivo para deixar um comentário menos positivo no perfil.

Já para as marcas que não têm um volume tão grande de questões para atendimento, como uma marca de chocolate que não interfere tanto na vida dos utilizadores, é viável que o trabalho principal seja de relacionamento e ativação da marca.



TeK: Os custos também são uma motivação para as empresas querem investir nas redes sociais. Dos contactos que realizou aqui em Portugal vê que as empresas estão muito preocupadas com este aspeto?

Alexandre Oliveira:
É um dos motivos mas não me parece que seja o de decisão. A questão estratégica, da imagem e do serviço que pode ser prestado ao cliente são mais relevantes, pelo menos nos contactos que realizei. Até porque o custo de contacto na rede social pode até nem ser mais barato que o custo de contacto no contact center. O recurso é aliás mais caro na rede social, a questão é que são necessários menos recursos para cobrir as necessidades existentes. Contudo, à medida que os consumidores e clientes forem contactando cada vez mais com a empresa por via destes canais esse custo pode aumentar.

Cristina A. Ferreira




Escrito ao abrigo do novo Acordo Ortográfico