Por Filipe Nuno Carlos*

 

À medida que uma organização cresce, a atitude do líder deve ir mudando para que possa dar espaço a novos líderes e para que ele próprio não passe a ser uma fonte de estrangulamento. Mas porque é que isso é tão difícil de acontecer? Porque todos temos o "Complexo do Super-Herói"!
Brad Sugars, CEO da ActionCOACH, define o Complexo do Super-Herói como a necessidade que temos de mostrar que somos importantes, que somos cruciais para a organização e que o nosso lugar não é facilmente substituível. Gostamos de sentir que havia um problema e que fomos nós que o resolvemos.
Esta reação, perfeitamente natural, acabará por ser contraproducente com o crescimento da equipa porque um líder deve entregar valor de uma forma diferente. Mas então como sentir-me útil sem cair no Complexo do Super-Herói?
A melhor forma de um líder se sentir útil passa por dedicar-se a outras prioridades e deixar as questões operacionais com os seus elementos de equipa. Ele deve dedicar-se às questões estratégicas e à cultura da empresa. Assim, a maior parte do tempo deverá ser usado a abrir novas portas, novas parcerias, novos mercados, em monitorar os indicadores de performance e em assegurar que os vários elementos absorvem paulatinamente todos os pontos de cultura da empresa.
Para que isto seja uma realidade, há que assegurar alguns ingredientes, nomeadamente (1) uma visão forte e inspiradora para a equipa; (2) uma descrição clara da cultura da empresa, onde cada um saiba o que se espera dele ou dela; (3) regras do jogo bem definidas para que cada um saiba quais são os seus limites; (4) e dentro desses limites, haver apoio ao risco por parte da gestão.
Vamos então analisar os pontos acima um por um. Uma visão forte serve como mola impulsionadora. As pessoas gostam de desafios. São os desafios que nos motivam, e mais importante que tudo é pela visão que os elementos de equipa sabem como atuar em momentos mais complicados e inesperados, sem precisarem de estar dependentes do líder.
A cultura da empresa permite que o mesmo cliente, sendo servido por pessoas diferentes em momentos diferentes, tenha a mesma sensação e experiência com o serviço prestado. Garante um sentimento de equipa, onde cada elemento está motivado para um objetivo comum e não para satisfazer a vontade pontual do chefe A ou do chefe B.
As regras do jogo são um elemento crucial e gostaria de partilhar uma regra que me parece fundamental em qualquer organização. Dale Carnegie inspirou-se nesta regra como forma de eliminar 50% dos problemas profissionais de um líder, mas eu acrescento ainda a vantagem de permitir que cada elemento da equipa cresça como profissional de forma mais consistente.
A regra consiste em pedir ajuda ao líder apenas depois de descrever o problema e de pensar em 3 soluções possíveis, com as respetivas vantagens e desvantagens. Assim, quando ocupar o tempo do líder, este último apenas terá que analisar as várias opções e confirmar a opção escolhida pelo colega ou então aproveitar o momento para lhe ensinar porque a opção escolhida deve ser outra.

Este exercício, executado de forma regular, vai criando no colaborador um sentimento de autonomia pois tenderá a que as opções por ele escolhidas sejam cada vez mais coincidentes com as opções do líder. Adicionalmente, o efeito de telefonar para o líder por qualquer motivo ou pequeno problema, desaparece.
Como quarto e último ponto temos o apoio ao risco. Este ponto representa o maior desafio para o líder porque este tem que se libertar do foco em ver as coisas feitas à sua maneira. O seu foco tem que passar para o crescimento do colaborador como profissional e estar do lado de fora do campo, como treinador, a ajudá-lo a tomar decisões.
Em suma, usando estas orientações facilitamo-nos a mudar o foco de "jogador" para o foco de "treinador". Não escondo que é um trabalho difícil porque deixamos de sentir o prazer pelo envolvimento direto nas tarefas e passamos a ter que transferir o prazer pelos resultados que os outros alcançam. Como recompensa, se o trabalho for bem feito, os resultados serão maiores e melhores do que se fossem feitos apenas por nós.

 

* Sócio-gerente da WinTrust