Por João Monsanto (*) 

Por volta de 1986, o falecido líder do Grupo Sonae, Engenheiro Belmiro de Azevedo, tinha participado num curso internacional de liderança lecionado por uma empresa de formação suíça chamada Dynargie e, pela qualidade do mesmo, decidiu que todos os quadros superiores tivessem obrigatoriamente de fazer esse curso.

Tratava-se de um curso prático de cinco dias úteis, dispersos por um período de dois meses, onde um grupo de aproximadamente quinze pessoas se juntava numa sala de hotel com um formador. O curso fornecia indicadores de decisão que eram testados na prática e que envolviam situações extremas para um líder de empresa. Percebeu-se bem a aposta do Engenheiro porque se tratava de uma experiência e aprendizagem absolutamente fascinantes.

Entre os vários casos práticos havia naturalmente uma “reunião dos quadros da empresa”, reunião em cada um dos participantes assumia um papel pré-definido e ia sendo caracterizado pela sua forma de agir. Era impressionante como os clássicos estereótipos se detetavam com tanta facilidade e assentavam que nem uma luva nas pessoas envolvidas.

Depois de uma agitada e aguerrida reunião onde todos procuravam ter razão e liderar as decisões, a conclusão reconhecida unanimemente é que quem liderava não era quem falava muito, ou bem, mas sim quem questionava.

“Quem questiona, dirige”, dizia o experiente formador.

Na verdade, responder é um ato de foco e atenção para quem pergunta. Assim, como se de um jogo de Blackjack se tratasse, um bom distribuidor de perguntas, sem nada afirmar ou defender, lidera tranquilamente uma reunião, podendo no final, com as respostas que recebeu e sem precisar de um exacerbado exercício de compilação, tirar as conclusões da reunião e ser inequivocamente reconhecido como o líder.

Passados então mais de trinta e cinco anos, interagindo com o ChatGPT, recordei-me deste episódio. Porquê?
Porque funcionamos muito com o Chat no formato de perguntas: “És capaz de me fazer uma tese de Física?”; “Desenhas-me uma campanha de Publicidade para lançar uma marca de automóveis?”; “Fazes um soneto de amor para oferecer à minha mulher?”; “Quem foi D. João I”.

E pensei que realmente, o conhecimento no futuro passa por aprender a fazer perguntas e não por saber as respostas. Que ser especialista e liderar qualquer área poderá depender desta vertente inquiridora. Poderá haver faculdades só para se aprender a fazer perguntas evolutivas de Engenharia Mecânica, Medicina Pediátrica ou outra área qualquer?

Concentrado nesta possibilidade, observei então que a Inteligência Artificial, em muitos casos, respondia às minhas perguntas, com outras perguntas: “Física Quântica ou Clássica e qual a área de estudo?”; “Qual é o Grupo-Alvo a que pretende vender o automóvel?”; “Como se chama a sua mulher, para que possa personalizar o poema?”; ….

E como estas perguntas fazem todo o sentido no contexto de cada uma delas, vamos tranquilamente respondendo.

Para nós, humanos, as respostas do Chat têm uma utilização imediatista, temporalmente limitada e desaparecem rapidamente do nosso consciente. Porém, para o ChatGPT ou para qualquer outro programa de Inteligência Artificial, tal não acontece. Toda a informação é registada, guardada por tempo indefinido e usada na construção de respostas ou perguntas nas vezes seguintes. Na verdade, tudo o que respondemos fica no universo dos Metadados e vai servir para diferentes objetivos tais como estatística, aperfeiçoamento de informação, apoio à tomada de decisão, etc., através de um processo de Machine Learning (a máquina evolui e ganha mais conhecimento e autonomia processando a informação que recolhe).

O Chat fecha por vezes as suas respostas com perguntas do tipo: “esta informação foi útil?”.

Embora existam avisos no próprio chat para não partilhar informação sensível, uma resposta do tipo “Não. Disseste que a manifestação foi em 10 de janeiro, mas foi em 12 de março. Sei porque estava lá”, fornece informação pessoal para além daquela que a IA já recolhe das bibliotecas, dos motores de busca, das redes sociais e de muitas outras fontes.

A ética, a pressão dos governos e a própria estratégia das marcas, faz com que as App’s de Inteligência Artificial não forneçam informação classificativa sobre pessoas ou empresas, mas tal não quer dizer que os dados não estejam guardados, que não sejam processados internamente e não fiquem latentes a aguardar autorização para serem usados.

O potencial positivo da IA é tão grande para o futuro da humanidade, acelerando as descobertas e soluções para inúmeros desafios que se põem ao coletivo em áreas como, por exemplo, a medicina ou a sustentabilidade do planeta, que não deve de forma alguma ser travada (se é que tal seria possível), mas o seu controlo depende da capacidade do homem em saber perguntar bem e responder com consciência e bom-senso, duas características que desconheço no ser humano atualmente.

Quem vai liderar o conhecimento?

A capacidade inata das crianças de questionar, quando começam a sentir o mundo que as rodeia, pode vir a ser uma ferramenta fundamental do homem para lidar positivamente com a máquina.

Será?

(*) CEO LarM