IPv6 - Continuar a expandir a Internet

Por Carlos Friaças (*)

No início de 2010 atingiu-se o momento em que o espaço de endereçamento IPv4 disponível na reserva mundial (detida pela IANA) baixou dos 10%. No entanto, no segundo mês do ano, esta reserva reduziu-se em mais 2%. Isto indicia que a Internet continua a crescer, e que dentro de poucos anos (entre 2011 e 2013) esta reserva estará completamente esgotada.

A forma como os endereços IP são distribuídos a nível mundial garante que nenhuma organização de nenhum país veja vedado o seu acesso a mais endereçamento IPv4 enquanto organizações de outro país continuarem a conseguir obtê-lo.

[caption]Nome da imagem[/caption]
Os recursos de endereçamento são distribuídos com base em cinco organizações de âmbito continental (Ripe/ncc, Arin, Apnic, Afrinic e Lacnic), que têm por missão atribuir o espaço IPv4 ainda disponível com base nas necessidades reais que os seus membros forem revelando.

Outra das dificuldades em torno da continuidade da utilização crescente do IPv4 é o quão difícil se torna a "reciclagem".

Ninguém sabe o que realmente irá acontecer nos próximos anos, sendo que uma das possibilidades é que o endereçamento IPv4 comece a ser transaccionado. Esta perspectiva dificulta extremamente qualquer devolução à reserva de blocos não usados, uma vez que muitas pessoas/organizações os começam a considerar como activos potencialmente valiosos.

O estado da implantação do IPv6 em Portugal não difere em muito do que está a acontecer na maioria dos restantes países europeus. A grande motivação para a adopção do IPv6, que é a impossibilidade de obter espaço de endereçamento IPv4 adicional ainda está para chegar, pelo que são poucas as organizações que já realizaram (algum) investimento nesta área.

A FCCN enquanto responsável pela Rede Ciência Tecnologia e Sociedade (RCTS), a par do que é efectuado por organizações congéneres a nível Europeu foi das primeiras a preparar-se para o IPv6.

Neste momento, existe já uma percentagem significativa de Universidades e Institutos Politécnicos Portugueses, com alguns serviços de rede básicos acessíveis quer em IPv4, quer na Internet de Nova Geração, o IPv6. Uma forma fácil de o comprovar é analisar (mesmo a partir da Internet IPv4) se existem nomes de registos NS e MX com registos AAAA associados nas respectivas zonas DNS. Em alguns casos, o próprio website institucional está já também compatibilizado com o IPv6, tal como o da própria FCCN (www.fccn.pt).

A FCCN tem estado envolvida em diversos projectos europeus relacionados com a temática do IPv6 (6NET e 6DISS, já concluídos), sendo que actualmente é um participante activo do projecto 6DEPLOY (www.6deploy.eu). No website do projecto existe uma ferramenta de e-learning de acesso gratuito sobre o protocolo IPv6.

Ao nível da Internet comercial em Portugal o panorama é um pouco mais desanimador no que toca à implantação do IPv6. No entanto alguns ISPs têm já emitido comunicados de imprensa referindo que disponibilizam o serviço IPv6, e os que ainda não o fizeram estão principalmente na fase de obtenção de espaço de endereçamento IPv6 próprio junto do Ripe/ncc.

Nesse capítulo, Portugal está entre os três países da EU onde a percentagem dos Local Internet Registries (LIRs) que já detêm um bloco IPv6 é mais elevada. Esta percentagem elevada poderá derivar da pouca fragmentação de mercado que existe em Portugal, mas ainda assim não deixa de ser um indicador positivo.

No entanto, para uma organização portuguesa cuja actividade central não seja a Internet, obter endereçamento IPv6 do(s) seu(s) ISP(s) é ainda no início de 2010 bastante difícil.

Se é verdade que a conectividade IPv6 pode ser já encontrada em alguns ambientes de centro de dados, a generalidade dos ISPs portugueses, mesmo já possuindo endereçamento IPv6 não o está ainda a atribuir aos seus clientes. Na nossa opinião isto resulta principalmente da óptica de serviço de valor acrescentado que a atribuição de endereçamento IPv4 público e fixo possui ainda no nosso mercado, e das lacunas que os equipamentos nos quais se baseiam os seus serviços podem ainda ter em termos de compatibilidade com o IPv6.

É também necessário reconhecer que os benefícios que uma organização pode obter por estar presente na Internet IPv6 já em 2010 são bastante diminutos. Este facto deriva principalmente de que o problema da escassez de endereçamento é uma questão da responsabilidade dos Internet Service Providers e dos administradores de redes e sistemas, e não dos utilizadores comuns. Para estes, a transição para o IPv6 deverá ser tão transparente quanto possível.

(*) Senior Network Engineer & Project Manager na FCCN