O lançamento da sonda Juice da ESA estava previsto para as 13h15 de Portugal Continental desta quinta-feira, mas acabou suspenso por não estarem reunidas as condições meteorológicas necessárias. A partida está agora prevista para amanhã, dia 14 de abril, à mesma hora, de acordo com o anunciado enquanto decorria a transmissão em direto do evento, já nos últimos minutos do countdown.

Acrónimo para Jupiter Icy Moons Explorer, a Juice é uma das suas missões mais ambiciosas da agência espacial europeia e, definitivamente, a de maior investimento até à data: cerca de 1,6 mil milhões de euros. Tem como intenção a recolha do máximo de informação possível acerca do sistema do gigante gasoso, como um todo, e o estudo pormenorizado de três das suas maiores luas: Europa, Ganimedes e Calisto.

O grande objetivo é perceber se estes corpos celestes reúnem condições para suportar vida. Há fortes indícios de que Europa e Ganimedes – e possivelmente também Calisto – sejam luas-oceano, ou seja, tenham oceanos de água salgada debaixo das suas crostas geladas.

Com um impressionante conjunto de sensores, aquela que é a primeira iniciativa europeia de exploração de Júpiter, o maior planeta do sistema solar, vai tentar descrever esses oceanos e quem sabe até encontrar possíveis assinaturas bioquímicas, que apontem para a possibilidade de vida e futuras condições de habitabilidade.

As três luas geladas terão atenções diferentes, até pelas suas caraterísticas. Europa é a mais ativa e intempestiva, com sinais claros de renovação constante da crosta de gelo, com evidências de atividade vulcânica subaquática, o que aumenta a possibilidade de vida. Estima-se que contenha o dobro da água dos oceanos da Terra.

Por ser a mais estudada até agora - e ser alvo de uma missão específica por parte da NASA, denominada Europa Clipper, a lançar em 2024 -, Europa será a lua a quem a Juice prestará menos atenção, concentrando apenas dois dos 35 sobrevoos planeados para os quatro anos que deverá durar a missão.

Calisto, por sua vez, representa um testemunho do que foi o sistema Júpiter no início da história do Sistema Solar. Com uma superfície escura, antiga e muito marcada por crateras, também pode ter um oceano “escondido”.

Já a Ganimedes aponta-se um oceano mais salgado do que os oceanos da Terra. O seu potencial e características únicas farão com que seja o alvo que vai tomar mais tempo de observação a Juice, que lhe dedicará nove meses inteiros.

Para fazer tudo isso, a sonda europeia construída pela Airbus foi equipada com os maiores painéis solares já lançados numa missão interplanetária. Ao todo são 85 metros quadrados de placas fotovoltaicas, cuidadosamente dobradas para o lançamento, aguardando ordem para a abertura no espaço. Os grandes painéis justificam-se pela necessidade de fornecer energia à sonda em quantidade suficiente enquanto orbita Júpiter, que está cerca de cinco vezes mais distante do Sol que a Terra.

Além de escudos que protegem os componentes eletrónicos sensíveis da elevada radiação, de painéis solares de alimentação de energia e de uma camada isolante contra as temperaturas extremas, a sonda dispõe de uma antena para enviar dados para a Terra e de um computador para resolver alguns problemas de modo independente.

Equipada para “conquistar” Júpiter com ajuda portuguesa

Ao todo, a Juice leva 10 instrumentos de última geração, que formam o mais poderoso conjunto de análise sensorial remota, de análise geofísica e “in situ” alguma vez enviado para o Sistema Solar externo. Alguns deles contam com know how português, ao nível do desenvolvimento e fabrico, mas também de “gestão”.

A missão, que esteve para ser lançada em 2022, tem o engenheiro aeroespacial Bruno Sousa como diretor de operações de voo e contou com o engenheiro de antenas Luís Rolo na fase de testagem de dois dos 10 instrumentos integrados. Ambos trabalham na ESA.

Enquanto diretor de operações de voo, Bruno Sousa vai acompanhar a fase crítica do lançamento e ajuda uma das equipas que lidera a tomar decisões para garantir que o engenho entrará depois na fase de cruzeiro.

Luís Rolo testou a antena do radiotelescópio que irá estudar as atmosferas de Júpiter, Europa, Ganimedes e Calisto, e a antena da sonda-radar que permitirá, através da receção de sinais, determinar a existência de água subterrânea nas três luas.

A sonda inclui também componentes fabricados por várias empresas portuguesas. Uma antena, a mais pequena das duas acopladas, tem um revestimento térmico produzido pela empresa portuense FHP - Frezite High Performance e o seu mecanismo de funcionamento foi desenvolvido pela Active Space Technologies.

Um outro instrumento do satélite, o monitor de radiação, que é um detetor de partículas energéticas, foi desenvolvido pelo LIP - Laboratório de Instrumentação e Física Experimental de Partículas e pela Efacec, em cooperação com a empresa norueguesa Ideas e o instituto de investigação suíço Paul Scherrer.

A Efacec esteve também envolvida na construção de um instrumento que monitorizará o estado de conservação dos painéis solares do satélite, visando uma melhor gestão da energia na chegada a Júpiter, onde a luz solar é pouca.

A LusoSpace criou uma bobina que gera um campo magnético e que liga ao magnetómetro, um aparelho a bordo do satélite que vai caracterizar o intenso campo magnético de Júpiter e a sua interação com o da lua Ganimedes.

O trabalho da Deimos Engenharia consistiu "em melhorar a estratégia de navegação autónoma de base da missão" durante o voo de passagem pela lua Europa e "durante a fase orbital de Ganimedes".

Partida, largada e fugida agora. Meta à vista só em 2031  

A conquista europeia de Júpiter começa agora mas faz-se de uma longa jornada de oito anos, que vai envolver o recurso à gravidade da Lua, da Terra e de Vénus para ganhar impulso até ao gigante gasoso, onde Juice só deverá chegar em julho de 2031.

A partir daí, está previsto que a sonda europeia faça 35 voos de aproximação às luas geladas, alcançando Ganimedes, a maior lua do Sistema Solar, em dezembro de 2034. Com 5.268 km de diâmetro, Ganimedes é maior do que o planeta Mercúrio e é a única a ter um campo magnético próprio, um dos muitos itens que Juice estudará em detalhe. Os primeiros dados científicos são expectáveis em 2032.

Espera-se que a missão da ESA, que também contou com a colaboração das agências espaciais norte-americana (NASA), japonesa (JAXA) e israelita (ISA) em termos de instrumentação e hardware, complete quatro anos de observação no espaço, terminando em setembro de 2035.