A parceria entre Portugal e a Universidade de Carnegie Mellon abrange 11 departamentos da CMU e já envolveu 150 empresas e mais de 400 docentes e investigadores em Portugal e naquela universidade norte-americana. Desde 2006, permitiu atribuir 216 bolsas de doutoramento e criou ou influenciou o desenvolvimento de 26 empresas, segundo os responsáveis pelo programa.
A continuidade e o modelo da iniciativa estão em análise, mas os responsáveis nacionais não têm dúvidas de que a iniciativa teve um “impacto determinante na criação de um ecossistema que não existia”. Acreditam que hoje ainda continua a ter, tanto na projeção de projetos de I&D nacionais, como na modelação de perfis que possam vir a criar os próximos unicórnios de origem nacional e a fundar, ou integrar, empresas promotoras de emprego científico.
O programa assenta em três eixos fundamentais. Na vertente da educação destacam-se os doutoramentos de grau dual: os alunos estudam 3 anos em Portugal e 2 anos nos USA. A opção está disponível desde 2007 e foi complementada em 2021, com os programas de doutoramento afiliados, que duram 4 anos e que incluem até 1 ano de investigação na CMU. Pela formação de grau dual passaram os fundadores de algumas das startups mais promissoras da atualidade fundadas em Portugal, algumas já com estatuto de unicórnio.
Nuno Nunes e Inês Lynce, co-diretores do CMU Portugal defendem que esta vertente do programa tem ajudado a plantar uma semente, que nasce nessa experiência internacional, pelo contacto com uma realidade diferente, mas dá frutos em Portugal.
“Há coisas que só o facto de vermos feito faz com que quando se vem para Portugal se tenha a expectativa de poder fazer algo semelhante”, frisa a co-diretora do CMU Portugal que é também presidente do INESC-ID. “Tem sido uma forma de permitir o contacto com uma realidade completamente diferente, sem ter de sair de Portugal, e é muito diferente ter este contacto na fase de formação ou mais à frente na carreira”.
Doutoramento com grau dual continua a ser um dos pontos fortes da parceria
A atribuição de grau dual nos programas de doutoramento é um exclusivo da parceria com a CMU, que para Nuno Nunes, que é também presidente do Instituto Técnico de Inovação, continua a fazer todo o sentido. Foi por isso recuperada em força nesta 3ª fase do programa. “Em Portugal muitas vezes estamos demasiado focados no que acontece a jusante - nos projetos e nas empresas - e esquecemo-nos que o que provou a mudança foi o talento dos jovens que fizeram os seus doutoramentos”.
“Investimos imenso nesta terceira fase no programa doutoral, porque sabemos que as próximas Feedzai ou Unbabel não vão sair de nenhum plano estratégico de economia. Não há nenhum gabinete ministerial que consiga planear este tipo de coisas. Acontece quando temos pessoas boas e que, elas próprias, inventam o caminho que o país deve seguir”.
Nesta vertente da educação, o CMU Portugal tem ainda desenvolvido programas de mobilidade para alunos de mestrado e mestres graduados há menos de 5 anos (Visiting Students Program) e para docentes e investigadores (Visiting Faculty and Researchers Program). Em termos acumulados, foram atribuídas através destas iniciativas 216 bolsas de doutoramento, de onde resultaram cerca de 100 alunos graduados. As iniciativas de mobilidade envolveram um total de 146 participantes.
Na componente de investigação, foram financiados ao abrigo do programa 86 projetos de investigação, desde 2006, em áreas como a ciência de dados, inteligência artificial, robótica, processamento de linguagem, tecnologias de saúde, ou segurança e privacidade, entre outras.
Neste, como nos outros dois programas que resultam de parcerias com universidades americanas, o formato dos projetos financiados alterou-se nestes últimos anos, para passar a acomodar também projetos de desenvolvimento e inovação tecnológica de larga escala. Pela primeira vez na terceira fase das parcerias, que arrancou em 2018, foram desenvolvidos projetos liderados por empresas do tecido empresarial português. No âmbito do CMU Portugal avançaram 12 projetos deste tipo, que envolveram 40 instituições portuguesas, 19 empresas e 8 departamentos da CMU, num investimento total, público e privado, de 25 milhões de euros. Deste valor, 4,2 milhões de euros foram investidos pelas empresas.
Em retrospetiva, Inês Lynce, diz que “os projetos [ financiados no âmbito do programa] começaram do lado da ciência, mas progressivamente foram caminhando para o lado da economia”. Ter empresas a liderar projetos “aconteceu na hora certa” e confirma a “própria maturidade do programa”, que conseguiu atrair esses interlocutores, mesmo com o tempo e dinheiro que implicou essa participação.
”Estamos a falar de empresas que vão desde as mais tradicionais às startups mais inovadoras, todas elas empresas que criam emprego científico”, uma diversidade que nos primeiros anos não existia, até pela falta de startups no ecossistema português com estrutura e orientação para a I&D.
Unicórnios lideram projetos de larga escala
Nesta terceira fase, os projetos de I&D realizados no âmbito da parceria com a CMU estiveram focados principalmente em tecnologias com impacto direto na economia de dados, como a Inteligência Artificial, Machine Learning, Robótica, Interação Pessoa-Máquina, Engenharia de Software, entre outras, aplicadas a áreas como a mobilidade, saúde, espaço, cibercrime, ambiente ou serviços de apoio ao cliente.
Outsystems, Farfetch, Ingeniarius, Capgemini (através da Capgemini Engineering), GLINTT ou DST Solar foram algumas das empresas que lideraram estas iniciativas em copromoção. Desenvolveram-se adesivos eletrónicos impressos com sensores para a biomonitorização a baixo custo de dados fisiológicos e comportamentais; um Sistema Robótico Semi-Autónomo para Limpeza Florestal e Prevenção de Incêndios; uma solução integrada para a gestão de resíduos urbanos, entre outras.
Mas nos 17 anos que a parceria leva, os atuais responsáveis encontram outros exemplos que marcaram o percurso e abriram caminho para mais trabalho científico, como o da Unbabel, que no âmbito do programa tem feito I&D na área da IA responsável e agora lidera uma das agendas do PRR centrada nas mesmas tecnologias. Ou o exemplo da Feedzai, que nos últimos dois anos liderou o registo de patentes em Portugal, e que é considerada a primeira startup a nascer no âmbito do CMU Portugal e que tem mantido uma ligação forte ao programa, por diferentes vias. É uma das 16 afiliadas industriais, dois dos co-fundadores foram professores visitantes na CMU e lidera também um dos projetos de larga escala finalizados recentemente, o Camelot. Deste projeto, que está a criar uma plataforma de aprendizagem automática para melhorar o desempenho dos sistemas de IA, já resultaram três patentes e nove publicações.
Na vertente de inovação e empreendedorismo os números oficiais do CMU Portugal contabilizam a influência na criação e desenvolvimento de 26 empresas, com ligações a diferentes vertentes do programa. Estas empresas, onde se incluem as já referidas Feedzai, Unbabel e outras, como a Veniam (agora Nexar), terão atraído mais de 412 milhões de euros em investimento e criaram 1.500 postos de trabalho qualificados, números que os responsáveis do programa acreditam ser altamente beneficiados pela ligação à iniciativa.
O Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, através da Fundação para a Ciência e Tecnologia, está a reavaliar a continuidade das parcerias com três universidades norte-americanas. Antes da crise política que fez cair o governo de António Costa, a ministra Elvira Fortunato tinha já dito que este seria o último ano das parcerias, nos moldes atuais. Este artigo integra-se num especial do SAPO Tek sobre o tema, onde fomos perceber o que tem sido feito no âmbito dos acordos e conhecer alguns dos projetos mais recentes.
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