Aprovado e promulgado no final de dezembro, o Orçamento de Estado para 2017 (OE2017) refere que as áreas da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior vão receber uma parcela de cerca de 10,5% superior à que lhes havia sido alocada no ano anterior, sendo que o investimento público deverá ser aumentado em 4,5%. 

Assim, o montante em questão será de aproximadamente 2.685 milhões de euros este ano, face aos 2.430 milhões de euros de 2016.

O TeK fez uma análise às medidas previstas e convidou os vários partidos com assento parlamentar a pronunciarem-se sobre as medidas previstas, avaliando se são suficiente para dar resposta às deficiências que têm vindo a ser destacadas na comunidade científica, mas nem todos os Grupos Parlamentares responderam em tempo útil.

Do lado da comunidade científica as "reclamações" e pedidos já tinham sido conhecidas quando a primeira proposta foi revelada, e o próprio Ministro da tutela admitiu que o orçamento ficava áquem do desejado

Em comunicado, o ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior detalha que o aumento da parcela orçamental se deve a uma valorização do Ensino Superior em Portugal e a um reforço das ajudas governamentais ao ingresso e frequência do Ensino Superior, bem como à promoção do emprego científico no país.

Segundo consta, o Governo quer, acima de tudo, ampliar o leque de apoios disponíveis para o Ensino Superior e fortalecer os investimentos em Investigação e Desenvolvimento, para que Portugal possa ser um país cada vez mais competitivo nestas três áreas.

Ambas as ambições-chave têm um denominador comum: o emprego científico.

Tendo estes aspectos em consideração, o Executivo elencou no OE2017 uma série de medidas cuja implementação tem como objetivo fomentar um Portugal mais científico, mais tecnológico e mais academicamente instruído.

Entre elas, está previsto o estreitamento das relações entre as universidades, os politécnicos e os centros de investigação, a fim de se fomentar o emprego de âmbito científico e académico.

No documento, é também explicado que a Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) conta atualmente com um orçamento de 55 milhões de euros. Ao abrigo do novo OE, esse valor será acrescido das verbas alocadas às instituições de Ensino Superior.

Além disso, estima-se um aumento de 5% dos investimentos no programa de Bolsas de Ação Social para este nível de ensino, valor esse que deve atingir os 146 milhões de euros este ano.

O Governo avança que se pretende lançar também um orçamento participativo para as áreas da Ciência e Tecnologia, cujo objetivo é “democratizar” o mundo científico português e aproximar os cidadãos destas duas fontes de inovação e competitividade.

As “esquerdas” não consideram que o OE2017 seja suficiente

Convidado pelo TeK para comentar as medidas, o deputado bloquista Luís Monteiro diz que as medidas avançadas no Orçamento de Estado para 2017 para as áreas da Ciência, da Tecnologia e do Ensino Superior visam tão-somente trocar “bolsas precárias por contratos precários”.

O porta-voz do Bloco de Esquerda (BE) refere que este OE procura intensificar as relações entre o Governo, o Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos (CCIPS) e o Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP), colocando nas mãos dos reitores um poder demasiado concentrado que não promove a democracia no seio destas instituições e aumenta a precariedade nas áreas científica e tecnológica.

Aos olhos do BE, as prioridades definidas pelo ministro Manuel Heitor não são as indicadas para fomentar o crescimento de Portugal nestas áreas estratégicas.

Relativamente ao emprego científico, uma das principais áreas de foco do OE para esse ano, Luís Monteiro afirma que “é necessário abrir de novo as carreiras e ingressar todos os precários nelas”, sublinhando que é insustentável que aqueles que produzem conhecimento sejam sujeitos a condições de instabilidade.

Por outro lado, sublinha que o Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior apregoa o chamado Modelo Fundacional como a melhor solução para gerir as instituições de Ensino Superior. No entanto, o BE considera que “a lógica da gestão privada num serviço público é um logro” e que deve ser combatida.

“Só um modelo de gestão democrático e um sentido de missão de serviço público garantem um Ensino Superior para todos”, sentencia Luís Monteiro, acrescentando que as prioridades para este ano deveriam incidir sobre a dignificação do emprego científico, a conceção de um novo modelo de gestão do Ensino Superior e o desenvolvimento de um plano de eliminação das propinas.

Mas o Bloco de Esquerda não está sozinho no seu descontentamento.

Embora considere que as medidas avançadas pelo Governo no OE2017 vêm valorizar a comunidade científica portuguesa e preveem restituir-lhe alguns dos direitos que havia perdido, o Partido Comunista Português (PCP) não acredita que estas providências sejam as mais adequadas.

A deputada Ana Mesquita, coordenadora do grupo parlamentar na Comissão de Educação e Ciência, explica ao TeK que “é preciso ir mais longe”, sublinhando que existem ainda lacunas a colmatar no que diz respeito ao Sistema Científico e Tecnológico Nacional (SCTN), que acabam por promover a precariedade, a dificuldade de acesso a carreiras científicas, a escassez de investigadores e o desinvestimento nas áreas da Ciência e da Tecnologia.

Em Portugal, existem somente sete investigadores por cada 1.000 habitantes e o investimento feito em cada um deles é apenas metade do valor da média europeia.

A deputada comunista aponta a falta de investimento público no SCNT como estando na raiz de todos estes problemas, acrescentando que “nenhum sistema público de investigação e ciência pode construir-se com base na desvalorização do trabalho, na imposição de trabalho não remunerado, na ausência de direitos fundamentais no trabalho e na vida”.

O regime de contratação de doutorados tem também de ser revisto, segundo a visão do partido, que considera que não é suficiente para dar resposta aos problemas aferidos na área da Ciência e da Tecnologia.

O PCP, tal como o Bloco de Esquerda, está convicto de que o fortalecimento do Modelo Fundacional é uma das medidas mais lesantes que é avançada no Orçamento de Estado para este ano.

Diz a deputada parlamentar que este regime faz com que as instituições de Ensino Superior fiquem dependentes de verbas e interesses privados que lhes retiram autonomia para levarem a cabo as suas próprias políticas científicas.

Defende ainda o fortalecimento do papel dos Laboratórios do Estado enquanto elementos-chave da definição e prossecução de políticas científicas e tecnológicas do Governo.

“O PCP considera que é preciso definir e planificar uma política de ciência e tecnologia que sirva o interesse nacional, que amplie o potencial científico e o coloque ao serviço das pessoas e do País”, afirma Ana Mesquita, referindo que isso não é algo que esteja devidamente previsto no Orçamento de Estado para este ano.

Precisa-se de um novo modelo educacional

Centrando-se numa análise mais abrangente do Ensino, o partido Pessoas-Animais-Natureza (PAN), por sua vez, considera que as apostas do Governo nesta área deveriam centrar-se na transição do atual paradigma hierárquico e fomentador de competição para aquilo que descreve como sendo “um sistema de educação mais horizontal e cooperativo”, avançando como exemplo o sistema praticado pela Escola da Ponte, uma instituição pública.

Francisco Guerreiro, assessor parlamentar do PAN, declara ao TeK que existe um lado ético nas áreas da Ciência e da Tecnologia que não deve ser descurado, e congratula o Executivo pela introdução de uma disciplina de educação ambiental no plano curricular nas escolas.

O porta-voz sublinha que numa sociedade em que a tecnologia tem um peso cada vez maior é importante ativar medidas que promovam o contacto social, “pois só uma comunidade forte e unida pode enfrentar os desafios ambientais, sociais e económicos que se avizinham”.

A Ciência e a Tecnologia, per se, não têm qualquer valor, diz Francisco Guerreiro, se não forem acompanhadas de uma reconfiguração do cenário socioeconómico que hoje se vive e de um novo modelo educacional que promova a criatividade e a cooperação.

 

Nota da Redação: a notícia foi alterada para incluir mais informação.

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