Depois de um investimento significativo na primeira década dos anos 2000, pouco tem mudado em termos de equipamentos tecnológicos e infraestruturas nas escolas portuguesas no que se refere a investimento da parte do Governo Central, como admitiu o próprio Secretário de Estado da Educação recentemente, em declarações ao TeK, e como atesta agora quem vive esta realidade na sala de aula.
Tal acontece depois de as escolas da responsabilidade do Ministério da Educação terem sido equipadas com computadores, projetores e quadros interativos, da aposta nos Magalhães, “projeto com virtualidades, mas que acabou por ‘morrer’”, e da disponibilização do acesso à internet, nomeadamente através da fibra ótica, lembra a FENPROF.
Numa altura em que se assinala o arranque do ano escolar, oficializado esta segunda-feira pelo Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, hoje nas Escolas EB2/3 e Secundárias é supostamente “normal” um computador por sala com projetor, acesso à internet em todas as salas, muitas vezes com wireless, e é também frequente a existência de salas de informática, retrata a Federação Nacional dos Professores.
Mas ao nível da Educação Pré-Escolar e 1º Ciclo a realidade é muito diversa e depende muito do que tiver sido a aposta de cada um dos municípios nesta área. “Há locais do país onde os computadores e a internet estão presentes em todas as salas e outras há onde, quando possível, é o professor que faz uso da sua máquina e não poucas vezes da sua internet”, acusa a FENPROF.
A visão da ANPRI vai no mesmo sentido. A Associação Nacional de Professores de Informática considera que, ao nível dos equipamentos tecnológicos e infraestruturas, desde 2010 que não há investimento significativo que altere o panorama tecnológico das escolas. “O que tem vindo a acontecer é que algumas escolas, autonomamente, se candidatam a projetos diversos promovidos por fundações e outras organizações e vão conseguindo fazer projetos muito interessantes para integração das TIC em sala, em contexto educativo”, refere Fernanda Ledesma, presidente da direção.
E deixa um exemplo: projetos de integração de tablets, as conhecidas Salas do Futuro, “mas são abordagens botton-up, que surgem nas escolas e depois têm vindo a ser reconhecidos como boas práticas superiormente. O investimento é conseguido pelas escolas”, sublinha.
“A crise e a autonomia têm esta vertente: ficamos um pouco dependentes da sensibilidade para esta área das pessoas que integram as direções das escolas e isso nota-se cada vez mais”, refere a diretora da ANPRI. “Umas têm projetos inovadores e outras estão como ficaram em 2010, acrescendo o desgaste do equipamento destes seis anos”.
Neste cenário, salienta outra vertente: algumas autarquias que têm investido no equipamento tecnológico para dar melhores condições às suas escolas, nomeadamente para criar condições para implementar o projeto de iniciação à programação no 1º ciclo. “Em muitos casos, teria sido impossível dar início a este projeto senão fosse o apoio das autarquias.
Fernanda Ledesma reconhece que, ao nível de projetos para integração pedagógica das tecnologias, o Ministério de Educação, através da Direção Geral de Educação, tem promovido alguns programas interessantes. A maioria não iniciou com esta tutela, salienta, mas acabaram “acarinhados” pelo atual Governo, pelo seu interesse.
São exemplo o projeto de iniciação à programação no 1º ciclo, que no ano anterior envolveu mais de 27.000 alunos e mais de 700 professores. “Foi um sucesso, apoiaremos este projeto com todas as nossas forças. As inscrições neste ano letivo duplicaram, mas temos de aguardar pelos números finais”.
A responsável aponta também como um exemplo positivo o reconhecimento e financiamento dos clubes de robótica e programação existentes nas escolas. “Um aluno inicie o 1º Ciclo atualmente pode ser surpreendido com sessões de programação e robótica. A maioria gosta e os alunos ‘aprendem –fazendo’ através da resolução de problemas”.
Neste caso ficou a faltar a continuidade, porque os alunos que tiveram programação no 4º ano não vão ter no 5º ano, na maioria das escolas “como tinha sido prometido”. O mesmo acontece com o desdobramento das turmas na disciplina de TIC no 7º e 8º ano. “As aulas nesta disciplina que é prática são dadas com a turma completa, chegam a ser 30 dentro da sala. Não há condições para que os alunos desenvolvam as competências previstas e o professor fica esgotado, para dar resposta a tanta solicitação”.
Professores com conhecimentos q.b., mas sem recursos para trabalhar na sala de aula
Hoje em dia a maioria dos docentes utiliza as tecnologias com à-vontade, até porque boa parte dos processos formais nas escolas o exigem: matrículas, avaliação, e-manuais, plataformas diversas, ora criadas pelas escolas, ora geridas pelo ministério da Educação, etc, mas faltam recursos na "dimensão pedagógica".
“Se todos os professores deste país se limitassem a trabalhar com os recursos que a entidade patronal disponibiliza, as Escolas simplesmente paravam”, acusa a FENPROF. “A manutenção das máquinas nem sempre é a melhor e o sistema, em boa verdade, só funciona porque todos os professores usam o seu computador, o seu software e a sua internet para trabalhar”.
Um PC com software de escritório e acesso à internet em todas as salas de aula, bem como um projetor seriam os elementos básicos que todas as escolas deveriam ter ao dispor de um professor. Depois seria importante associar estes elementos à formação contínua dos professores, “de modo a poderem fazer parte plena da sociedade tecnológica do século XXI”, sugere-se.
A formação existente para trabalhar com estes recursos é, claramente, insuficiente. Para a Federação Nacional dos Professores houve anos com grande investimento nesta área, mas muito na lógica das ferramentas office. Com a chegada da Web 2.0 e posteriores formatos, a formação tem sido inexistente e, nesse sentido, considera urgente um plano formativo que possa resolver esta lacuna.
Na dimensão pedagógica faltará perceber como é que as tecnologias podem ser úteis nos dias que correm, de que modo podem entrar na sala de aula e de que forma podem ajudar os professores a ensinar - e, mais importante ainda, os alunos a aprender.
“E, esta diversidade resulta sempre da iniciativa individual de cada professor – como não há um plano formativo para esta área, o investimento docente nas tecnologias é sempre de génese individual o que, sem dúvida, potencia as desigualdades”.
A FENPROF defende que o ponto de partida terá sempre que passar pela formação e, depois, por incorporar, em cada projeto educativo das escolas, uma iniciativa que potencie a utilização das tecnologias. “Não vale a pena estabelecer como objetivo, por exemplo, a utilização de tablets, mesmo que experimentalmente, numa determinada turma ou ano de escolaridade, se não existirem condições de comprometimento e formação adequada dos professores”.
Patrícia Calé
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