A Associação da Economia Digital acompanha a evolução do comércio eletrónico em Portugal há 20 anos, com diversas iniciativas de dinamização deste mercado no currículo, para fomentar as compras online e ajudar a levar mais empresas, sobretudo PME, para a internet.
Nuno Milagres, vice-presidente da ACEPI e coordenador do Programa Comércio Digital, falou com o SAPO TeK, sobre as tendências que marcaram os dois últimos anos neste sector, os desafios que as empresas continuam a enfrentar e as oportunidades que uma mudança de hábitos na forma de comprar também trouxeram.
SAPO TeK: Estamos a chegar ao fim de um ano em que as lojas online voltaram a ter a concorrência das lojas físicas, depois de um 2020 que “obrigou” muita gente a experimentar o comércio online. Que balanço faz deste ano e que conclusões podemos tirar em relação às mudanças que vieram para ficar?
Nuno Milagres: As lojas online derivam na sua grande maioria de lojas físicas, claro que não estou a incluir os marketplaces como o Amazon. O comércio online continua a crescer, não ao ritmo dos últimos 2 anos, mas continua a crescer.
O que podemos observar é que os clientes habituaram-se à conveniência da compra online: maior oferta com pouco tempo despendido na procura, facilidade de comparar preços, etc. No entanto, o comércio de loja física viu os seus clientes regressar, mais informados sobre os produtos e serviços, com uma procura mais dirigida procurando a experiência de omnicanalidade. Ter os mesmos produtos e serviços qualquer que seja a forma como interagem com o comerciante.
SAPO TeK: A explosão do comércio online tornou evidente a importância da logística nestas operações. Nas empresas que vendem online em Portugal, onde há mais espaço para melhorar ainda nesta área?
Nuno Milagres: A explosão do comércio online desencadeou uma explosão na logística. Da parte dos comerciantes importa sensibilizar sobre a valorização que o Consumidor faz sobre a oferta dos portes de envio, que sabemos consomem uma parte da margem, no entanto podem combater este custo de várias formas das quais salientamos: a agregação de necessidades de logísticas entre comerciantes (os chamados darkrooms são um exemplo da resposta a essa necessidade) e a possibilidade de o Consumidor levantar o produto adquirido numa loja perto de si, num par de horas ou pouco mais. As compras têm um lado emocional e de resposta a uma necessidade que podem ver na entrega rápida uma forma de satisfação e de eficiência.
SAPO TeK: A pandemia mudou os hábitos de compra dos portugueses a vários níveis e isso também se verificou nas lojas que escolhem para fazer compras online, correto?
Nuno Milagres: Os portugueses passaram a comprar mais em sites .pt / portugueses durante a pandemia e essa tendência mantém-se. Existiu, durante a pandemia, um sentimento de solidariedade para com os comerciantes portugueses, aliado a uma maior oferta e presença dos comerciantes portugueses online – nas redes sociais, sites próprios ou marketplaces. O Consumidor português valoriza a proximidade, o comércio de proximidade saiu reforçado e valorizado da pandemia, no que diz respeito aos consumidores entenda-se, porque a maioria ainda enfrenta uma situação financeira débil.
SAPO TeK: As lojas nacionais, por sua vez, continuam com dificuldades em saltar barreiras geográficas?
Nuno Milagres: Na expansão das exportação via Comércio online, há de facto várias barreiras a começar pela escala. Não temos em algumas categorias de produtos escala para endereçar grandes mercados e o esforço para nos adaptarmos às exigências legais de cada mercado de destino não é para todos. Assim muitos comerciantes apostam no mercado da saudade e na fidelização online dos turistas que nos visitam.
Esta expansão, no caso das PMEs, pode passar por plataformas globais como o Amazon e AliBaba que conduzem as operações de logística para além de abrir montras globais.
SAPO TeK: Historicamente, a confiança nos meios de pagamento foi uma barreira ao comércio online. Está ultrapassada, entre as inovações que têm chegado ao mercado quais são as que podem ter um papel mais importante aí?
Nuno Milagres: Tivemos, por necessidade, que experimentar as soluções que existem no mercado. Os consumidores são desconfiados e atentos às tentativas de burla. Os últimos dados que temos revelam que as queixas nesta área aumentaram, mas não de forma proporcional ao crescimento das vendas, o que quer dizer que em termos de ocorrências em percentagem a situação melhorou.
A dupla autenticação e o advento do open banking ampliaram a concorrência o que se vai revelar benéfico para os custos de operação dos comerciantes e dos consumidores. Aliado à redução de custos, destaca-se o lançamento de serviços em torno dos pagamentos – alargamento dos prazos de devolução, prazos de pagamento e seguros para o produto ou serviço adquirido – que podem ser contratados de forma simples no ato da compra ou numa aplicação associada ao pagamento.
SAPO TeK: Que perspetivas tem a ACEPI, em termos de evolução do comércio online (B2C), no próximo ano em Portugal? O aumento de preços e a escassez de produtos podem comprometer estratégias diferenciadas (de preço, por exemplo) para estes canais?
Nuno Milagres: O Comércio online vai continuar a crescer e cada vez mais o Comércio online e o Comércio de loja física serão… Comércio! A loja online não será mais uma loja concorrente e independente, mas sim integrada e complementar. Ao conseguir-se esta integração o Consumidor irá sentir uma maior proximidade e ligação à marca e consequente fidelização. Nesse sentido, a escassez de produtos e aumento de preços não são fenómenos que afetarão mais ou menos o online, mas sim o comércio como um todo.
Este artigo faz parte do Especial Comércio Eletrónico em Portugal: As mudanças que vieram para ficar
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