Por Gonçalo Perdigão (*)

No início de cada novo ano surgem especialistas e centenas de publicações a partilhar quais as suas crenças para a evolução da tecnologia no ano vindouro. Invariavelmente, passadas poucas semanas, surgem também os que agregam todas essas tendências num resumo único. Para fugir destas duas tradições, optei por compilar essas mesmas agregações numa seleção e curadoria final de quais as tendências das tendências mais comentadas, tentando escrevê-las de forma não técnica, mas acessível a todos.

As fontes foram diversas, desde a McKinsey, à Goldman Sachs, Reuters, Forrester, State of AI Report, Economist, Visual Capitalist (que sozinhos agregaram mais de 700 artigos), Gartner, Wired, TechCrunch, MIT Tech Review ou CB Insights. Para ajudar e acompanhar as tendências, criei uma aplicação de Inteligência Artificial Generativa (genAI) que compilou todas estas opiniões, artigos e relatórios, num resumo estruturado que me ajudou a escolher os cinco tópicos principais:

  • A genAI vai massificar-se nas empresas através de múltiplos casos de uso: A genAI é uma tecnologia que nos permite criar novos conteúdos a partir de conteúdos já existentes. Entre eles estão textos, imagens, sons, vídeos ou software. A sua qualidade, em 2023, superava já em média a qualidade de resposta humana. Espera-se que em 2024 a genAI saia das fases de provas de conceito para estar implementada em larga escala e com elevada utilização nas empresas. Esta transformação será muito rápida, com um foco em casos de uso como atendimento ao cliente, criação e manutenção de software, geração de conteúdo (com grandes evoluções no som e no vídeo) ou recrutamento. A União Europeia e outros grandes mercados deram já os primeiros passos na regulamentação da tecnologia, um movimento que se intensificará em 2024.
  • A sustentabilidade vai passar a ser um tema crítico no uso de IA: O aumento exponencial no uso de IA, obrigará cada vez mais as empresas a enfrentar o desafio de alinhar as suas ambições tecnológicas com os objetivos de sustentabilidade. Os modelos de IA (em especial os LLM – grandes modelos de linguagem) consomem quantidades absurdas de eletricidade (segundo a CB Insights, só os famosos chips H100 da NVidia consomem já mais eletricidade do que países inteiros como a Guatemala ou a Costa Rica). Em resposta, haverá um investimento em arquiteturas de materiais semicondutores eficientes e métodos de resfriamento inovadores para sistemas de IA. Todos os grandes produtos terão presença de funcionalidades de IA, sendo de esperar algo disruptivo por parte de marcas como a Apple. Adicionalmente, depois de um tempo com foco em software chega em 2024 uma explosão na componente de hardware, ou seja, robots comerciais de vários formatos alimentados por IA de última geração.
  • Cibersegurança e automação: O aumento das ameaças cibernéticas, especialmente através de tecnologias disruptivas, exigirá que as empresas invistam mais em ferramentas de cibersegurança. Uma tendência será o uso de ferramentas de defesa automatizadas, alimentadas por IA e aprendizagem de máquina (Machine Learning), para reforçar a resiliência cibernética através do processamento de grandes quantidades de informação em tempo-real. Tecnologias cada vez mais rápidas e complexas estarão disponíveis simultaneamente para o lado de quem ataca e de quem defende, sendo uma dança de ambos os lados para ver quem anula quem.
  • Infraestrutura flexível e escalável de nuvem híbrida: A adoção da computação em nuvem (Cloud Computing), uma forma de guardar e processar dados remotamente em supercomputadores de terceiros, continuará a crescer, com uma tendência para modelos de nuvem híbridos. Estes modelos combinam a flexibilidade e escalabilidade da nuvem pública de terceiros (supercomputadores pagos para executarem funções remotamente) com a segurança e controle da infraestrutura privada ou local (computadores dentro do domínio e controlo das empresas). Isto permitirá que as empresas tenham uma melhor gestão das cargas de trabalho na sua infraestrutura de nuvem para otimizar o desempenho, os custos, o controlo de informação e a privacidade dos dados.
  • Requalificação e capacitação para suprir a escassez de talentos: Há uma escassez crítica de talentos em tecnologia, particularmente em áreas especializadas como a cibersegurança, inteligência artificial ou blockchain. As empresas investirão em capacitação e requalificação para aumentar a sua oferta de habilidades técnicas e de dados, uma estratégia vital para atrair e reter talentos. Se por um lado a IA é uma ameaça a muitas funções, por outro há uma lacuna de talento nessa mesma área.

Além destas tendências, 2024 vai trazer-nos avanços relevantes nas áreas da computação quântica (mas ninguém espera massificação nem comercialização a retalho da tecnologia), blockchain e ativos digitais (as principais cripto moedas valorizaram mais de 100% em 2023 e espera-se que 2024 seja um ano de grande crescimento), FinTech e internet das coisas (como parte do movimento de surgimento de vários robots com funções específicas, ligação à internet e cérebros de IA). O investimento em tecnologia continuará a ser um motor de crescimento e de inovação.

À medida que avançamos em 2024, é crucial que as empresas e reguladores trabalhem juntos para estabelecer um quadro regulamentar que permita um progresso responsável. Estamos perante um momento onde a adoção e a sofisticação de tecnologias como IA, blockchain e internet das coisas trarão desenvolvimentos inesperados, disruptivos e com impactos desconhecidos na sociedade. Este ano promete ser um marco importante na jornada de criação de tecnologias cada vez mais responsáveis e sustentáveis.

(*) Diretor da Algorithm G