Por Pedro Pimentel (*)
A compra digital é tendencialmente mais fidelizadora que a compra física, mas é também mais racional e pré-definida, o que tende a gerar uma quebra potencial de vendas no médio/longo prazo, para além, obviamente, dos acrescidos custos associados às entregas.
Foi apresentada recentemente a quinta edição do Marcas+Consumidores, uma publicação preparada pela Kantar Worldpanel para a Centromarca, onde é feita uma análise da penetração e evolução do comércio eletrónico no setor dos chamados Fast-Moving Consumer Goods (FMCG), a nível global, mas também em Portugal.
Os números mostram que as vendas digitais em FMCG são ainda muito reduzidas quando comparadas com as de outros setores de atividade, como a eletrónica e as viagens e turismo, ou mesmo o têxtil e calçado, as marroquinarias ou diversos tipos de bens de luxo.
Considerando o universo de países em que Kantar recolhe informação, o comércio eletrónico representa 4,6% do volume total de vendas FMCG, mas sete países dominam este segmento. Assim, por ordem decrescente de quota de mercado temos a Coreia do Sul (19,7%), Reino Unido (7,5%), Japão (7,4%), China (6,2%), Taiwan (5,8%), França (5,6%) e EUA (com apenas 1,5%). São, contudo, mercados claramente relevantes e com um peso muito importante para os números finais a nível global.
E se há razões que justificam a explosão do E-Commerce no Extremo Oriente – as mais elevadas taxas de crescimento em 2016 verificaram-se na Tailândia, Malásia, Vietname e China – os valores de Reino Unido, França e EUA mostram bem como o digital está a conquistar espaço ao convencional.
Acresce, em termos de perspetivas para o curto/médio prazo, a migração crescente dos chamados operadores pure play – de que os mais conhecidos são, obviamente, a Amazon, as chinesas AliBaba e JD, a Google ou o Facebook – primeiro para a atuação no universo FMCG e, mais recentemente, para a aquisição ou para a instalação de lojas físicas que complementam a sua atuação no mundo digital.
Um bom exemplo verifica-se mesmo aqui ao lado. Espanha, embora não atingindo 2% de quota de vendas FMCG online, apresentou a quinta maior taxa de crescimento de 2016 (32%) logo a seguir aos quatro países do Extremo Oriente acima referenciados. E porquê?
Porque a simples instalação da Amazon no país vizinho e a introdução do seu serviço Fresh em Madrid e Barcelona, gerou uma verdadeira corrida contra o tempo dos operadores brick and mortar ao melhorarem as suas plataformas de compra, aumentarem as áreas geográficas onde o serviço pode ser realizado, introduzirem melhorias de qualidade de serviço e diminuírem tempos de entrega.
Em Portugal, apenas 8 em cada 1000 euros de vendas FMCG são feitas através de compras online, representando uma incipiente quota de 0,8 das vendas totais.
Se o mercado FMCG digital em Portugal não descola, uma das razões passa seguramente pela multiplicação, densidade, qualidade e proximidade das lojas do retalho moderno no nosso país e passa também pela dificuldade de convencer o consumidor a avançar para a compra digital de produtos perecíveis. E se vou a um supermercado para comprar esses produtos, porque não realizar aí as restantes compras de supermercado?
Na verdade, desde há anos que se prevê a explosão do e-commerce no mercado FMCG. E isso está a acontecer, inequivocamente, noutras geografias. Será que Portugal constituirá uma exceção? Julgo que não…
Desde logo, porque Espanha se está a converter num mercado estratégico para a Amazon e porque a proximidade geográfica e logística tenderão a gerar atenção crescente relativamente ao mercado português.
Depois, porque alguns retalhistas nacionais – Continente, Jumbo, El Corte Inglés - possuem ferramentas de venda online de bom nível, testadas e formatadas às preferências dos nossos consumidores.
Finalmente, porque a digitalização dos consumidores é um facto. E a apetência para a compra digital de produtos FMCG aumentará na razão direta do aumento da abrangência e da qualidade dos serviços a que aceder, das mecânicas de atração e fidelização que forem desenvolvidas, da capacidade de comunicar e customizar a oferta relativamente às preferências dos consumidores e de cada consumidor.
Se para alguns parece ainda haver a questão de saber se ocorrerá ou não a explosão da compra digital FMCG em Portugal, os sinais estão aí para mostrar que a pergunta relevante não deverá ser ‘se’ mas ‘quando’.
(*) Diretor-Geral da Centromarca
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