Por Sofia Fernandes (*)

Tipicamente, quando se pensa em sucesso, o percurso passa sempre por entrar na faculdade e trabalhar numa grande empresa. Eu venho da área de Gestão, por isso no meu caso, normalmente, os melhores alunos seguem para as “Big Four” - as quatro grandes empresas de auditoria/consultoria do mundo: EY, PWC, KPMG e Deloitte. Interessante ver como ultimamente, não sei se também influenciados pela minha paixão, os meus colegas têm começado a vir para o mundo das startups. Ou para grupos de investidores (Venture Capital) ou para as bem ditas startups. Numa conversa que tive com uma das minhas amigas que iniciou a carreira comigo numa multinacional, estávamos precisamente a discutir como a nossa carreira divergiu. Eis que surge a questão: Porquê o mundo das startups? Fui para casa e continuei a pensar no assunto… Ficam aqui algumas das razões que considero relevantes:

Razão número um: O sucesso. Se olharmos para o top 12 dos homens mais ricos do mundo, 8 fundaram as suas próprias empresas de base tecnológica: startups. Os restantes vêm de uma família que já tinha construído um império ou pelo menos um percurso de sucesso na área. Em todos os casos o sucesso advém de liderar negócios de “família”, tenham os empreendedores começado ou continuado o processo. Sendo estes, modelos para as novas gerações, há normalmente uma aderência crescente para o ramo das startups, na procura do próximo grande sucesso.

Razão número dois: Iniciar o caminho para o sucesso. Pode haver a ambição inicial de criar uma empresa mas a ideia de negócio ainda não é ainda clara. Há vontade mas ainda não é claro como. Talvez até por pressões culturais e sociais, o medo de falhar acaba por ser tão grande que decidimos muitas vezes pensar mais pequeno, talvez até decidirmos que não queremos mudar o que fazemos e que estamos “bem assim”. Entre isso e continuar o “business as usual” o salto para trabalhar numa startup parece parte do processo. Muitos jovens entram em startups com o intuito de aprender e mais tarde ter a sua própria startup. Aprender fazendo. E por isso entrar numa startup pode ser o empurrão necessário.

Razão número três: Capital Social por prestação. Hoje em dia começa a ser cada vez mais frequente o fundador ceder capital social a colaboradores chave. Pessoas que tipicamente entram nos estágios iniciais das startups e aportam grande capacidade para desenvolvimento do produto ou desenvolvimento do negócio. Por isso é também interessante do ponto de vista de rentabilidade, uma vez que tipicamente as startups terminam em “exits” - venda da startup a uma grande empresa. Ora se o colaborador tem capital social na empresa, quando esta é vendida recebe o dinheiro pela sua cota. Foi por exemplo assim que Elon Musk iniciou a sua fortuna, fazendo um exit do Zip2 - depois PayPal, e utilizando a receita da venda para depois investir noutras empresas como a Space X, ou a Tesla.

Razão número quatro: Ambiente e evolução startup vs corporate. Numa startup o ambiente é dinâmico, e um só colaborador pode ter de pensar na visão estratégia, na venda a clientes, no recrutamento, na aquisição de investidores, etc. Por isso as capacidades e aprendizagem que um colaborador de uma startup desenvolve são exponenciais, enquanto numa grande empresa há uma aprendizagem para especialização mas no decorrer do tempo o tipo de trabalho é mais semelhante e constante. Daí ser tão frequente as novas gerações trocarem de emprego, procurando desenvolver mais habilidades, as chamadas “soft skills”. Nas startups há ainda uma grande vantagem: decidir o futuro da empresa e investir na criatividade. Como tudo ainda está a ser criado, cada colaborador é mesmo um elemento crucial. Enquanto numa grande empresa tipicamente qualquer colaborador é facilmente substituído, numa startup a perda de um membro pode ser decisiva para o sucesso da empresa. Finalmente, no aspecto social, norma geral, o ambiente que se vive numa startup é de família, de interajuda total, quando um colega está em “apuros” os outros param para fazer essa tarefa. Tal seria impensável numa grande empresa onde os departamentos estão bem definidos, e acaba por haver muito mais trabalho “individual”, sendo que cada colaborador tem objectivos muito independentes.

Razão número cinco: As horas extras. Se antes ter um negócio, ou ser empreendedor podia ter a desvantagem de trabalhar horas extra, ou mesmo fins de semana, hoje é padrão da indústria Já não é frequente, no mundo privado empresarial, horários das nove às cinco. Por isso esta desvantagem tem vindo a desaparecer, sendo substituída por uma questão importante: eu trabalho horas extra para ganho meu, ou para ganho de outrem? E cada vez a resposta é mais positiva nas startups, visto que ao final do ano esse trabalho extra pode resultar numa receita substancial.

Razão número seis: Um caminho já trilhado. Há uns anos a ideia de uma startup era de alunos desistentes que se juntavam e “perdiam” anos a desenvolver um projecto que depois não tinha sucesso nenhum. Mas isso mudou. Os filmes, os documentários, os livros, as notícias, os testemunhos, as TEDTalks, as formações, até o Web Summit em Portugal, vieram educar a população. Para ter sucesso há necessariamente momentos menos bons, consideradas “falhas”, que a ambição e perseverança levam à realização de sonhos, a importância de fazer algo que se gosta ao invés de fazer algo para pagar as contas. Tudo isso veio mudar o paradigma das startups serem falhadas, e da importância de ter Glovos e Ubers pelo mundo. Por isso, dizer “Mãe, entrei numa startup” é motivo de curiosidade, felicidade e excitação e não um dissabor ou frustração. Neste momento, atrevo-me até a dizer que é “cool”.

Razão número sete: Uma causa, uma paixão. Abrir uma startup é criar um caminho sem precedentes, é desenhar uma estrutura e cultura não existente e é acima de tudo lutar por um ideal. E a história tem uma maneira curiosa de nos mostrar que os nossos verdadeiros heróis lutam sempre pelos seus ideais. Para os românticos e idealistas irremediáveis uma startup pode ser a saída que precisam para encontrarem a verdadeira felicidade, e por isso deixo esta razão para o número 7, o da perfeição. Porque mais que ambição, lucros ou satisfação pessoal, essa cultura esses ideais podem ser espelhados em todas as pessoas que tocam ou trabalham nestas startups, e isso é definitivamente apaixonante.

É importante referir que cerca de 90% das startups falham, por isso continua a ser preciso ter um perfil de quem gosta de arriscar para dar o pontapé de saída numa pequena empresa tecnológica que traga algo realmente diferenciador para o mercado. Daí surge a regra “10x” ou seja se tentar 10 vezes uma delas consegue ter sucesso. Contudo, se uma startup tiver sucesso, inevitavelmente passará a ser uma “corporate”, uma multinacional. Na grande maioria das vezes o grupo que inicia a startup não é aquele que fica para quando se torna numa grande empresa - aí contratam-se pessoas especializadas para as diferentes áreas. Mas não deixa de ser interessante ver que as grandes empresas que advêm de startups têm um perfil, uma ambiente e inovação realmente diferenciadas da indústria, e por isso empresas como a Apple, Google, ou Tesla ainda nos relembram do que uma startup é feita.

(*) Diretora de Desenvolvimento de Negócio na BGI