
Por Rui Martins (*)
Num tempo em que as eleições se disputam tanto nas ruas como nas redes, a presença digital dos partidos políticos deixou de ser um simples adereço. Tornou-se central. E se as redes sociais garantem visibilidade e polémica instantânea, os websites partidários continuam a ser a base digital onde deveria residir a informação séria, consistente, estruturada, o detalhe dos programas, com todos canais de contacto e, em última instância, a imagem institucional de quem quer representar os cidadãos no Parlamento.
É precisamente sobre essa presença digital que incidiu um estudo em que participei recentemente e que pode ser lido no website do Movimento pela Democracia Participativa / Movimento pela Democratização dos Partidos (MdP) e cujos resultados podem ser consultados aqui.
Este estudo analisou, com critérios técnicos objectivos, os websites dos partidos políticos portugueses. A avaliação foi feita com recurso a ferramentas amplamente reconhecidas no mundo do desenvolvimento web: Google Lighthouse, WAVE e Readability Test Tool, medindo aspectos tais como performance, acessibilidade, boas práticas, SEO e legibilidade. O resultado? Um retrato tão diversificado quanto o próprio espectro partidário, e por vezes tão desigual que chega a ser preocupante.
Algumas surpresas:
À cabeça da tabela geral encontramos o ATUA (ex-PURP), partido de pequena expressão mediática, mas que demonstra uma abordagem digital exemplar. Com uma pontuação geral de 74.99, destaca-se em quase todas as métricas avaliadas. Seguem-se o RIR (68.14) e o PTP (60.24), provando que o profissionalismo digital nem sempre está associado à dimensão ou notoriedade política.
No extremo oposto, destacam-se pela negativa o JPP (com uma pontuação de 0), o PEV (18.12) e o PSD (31.52), três partidos que, por razões diferentes, estão entre os que mais falham nos critérios técnicos avaliados. A este nível, estamos a falar de falhas estruturais: lentidão de carregamento, erros de acessibilidade flagrantes, textos difíceis de compreender e desrespeito pelas melhores práticas básicas de desenvolvimento web.
A performance: rapidez também é política
A velocidade de carregamento de um site, avaliada pelo Google Lighthouse, pode parecer um detalhe técnico, mas tem implicações directas na experiência do utilizador e até na visibilidade da página nos motores de busca. Aqui, o ATUA destaca-se novamente com uma pontuação de 93, seguido pelo RIR (82) e o VOLT (69). Estes resultados mostram um cuidado com a eficiência, a optimização e o respeito por aquele recurso sempre limitado chamado "tempo".
Em contraste, partidos como o JPP, o PEV e o PSD obtêm os piores resultados nesta métrica. Num contexto em que um atraso de segundos pode determinar se alguém lê ou abandona um site, a negligência neste campo é um erro estratégico com impacto real nos resultados eleitorais.
Acessibilidade: a democracia não pode excluir ninguém
A acessibilidade digital, medida pelo Lighthouse e validada pela ferramenta WAVE, é uma métrica que diz respeito à inclusão. Websites acessíveis garantem que pessoas com deficiência visual, auditiva ou motora consigam navegar, compreender e interagir com o conteúdo. Aqui, mais uma vez, o ATUA e o RIR lideram com pontuações de 95. A Iniciativa Liberal também surge bem posicionada, com 93 pontos.
Mas o que é particularmente grave é a quantidade de erros identificados pela WAVE nos websites de alguns partidos. O PEV acumula 138 erros, muitos deles relacionados com o contraste — tornando a leitura impossível para quem tem dificuldades visuais. O LIVRE apresenta 45 erros, o Ergue-te 44, e o ADN 52. Estes números são sintomáticos de uma falta de auditoria básica aos websites e revelam um alheamento preocupante das necessidades de uma parte significativa da população.
Boas práticas: o básico que muitos ignoram
As boas práticas de desenvolvimento (segurança, compatibilidade, uso de HTTPS, design responsivo, entre outros) são outro dos pilares avaliados. Aqui, MPT, PTP, ATUA e RIR atingem a pontuação máxima (100), o que transmite confiança e um nível técnico assinalável.
Outros partidos, como o PSD, IL e BE, ficam-se por valores sólidos (96), mas ainda assim abaixo do máximo. Já o NC, por exemplo, tem apenas 82 pontos, o que denuncia algumas falhas de implementação que poderiam ser facilmente corrigidas com uma auditoria mínima.
SEO: não basta estar online, é preciso ser encontrado
A optimização para motores de busca (SEO) é uma ferramenta fundamental para garantir que os eleitores encontrem os partidos quando procuram por temas políticos, candidatos ou propostas. Aqui, destacam-se CDS, PCTP/MRPP, PPM, NC e CHEGA com pontuações perfeitas (100). Contudo, é importante sublinhar que o Lighthouse avalia apenas a parte técnica do SEO (metadados, estrutura do HTML, ausência de erros críticos), e não a relevância ou profundidade do conteúdo, onde a verdadeira batalha pela atenção (e voto) dos cidadãos acontece.
Legibilidade: se ninguém entende, ninguém participa
Por fim, a legibilidade é talvez o aspecto mais negligenciado pelos partidos políticos portugueses. Usando o Readability Test Tool, o estudo mostra que apenas três partidos: ATUA (43.9), NC (32.4) e VOLT (28.6), apresentam conteúdos com boa legibilidade. Em contrapartida, partidos como a IL (-33.1), PSD (-5.8) e PS (-0.3) usam uma linguagem demasiado complexa, estruturas frásicas longas e vocabulário denso. Num país com níveis preocupantes de literacia funcional, comunicar de forma clara e acessível deveria ser uma prioridade e não um luxo.
Face a este panorama, o estudo deixa um conjunto de recomendações fundamentais que aqui reforço e alargo:
- Partidos como o PEV, LIVRE, Ergue-te e ADN devem investir em revisões técnicas profundas dos sites, garantindo a total conformidade com os melhores padrões internacionais de acessibilidade.
- PSD, JPP e PEV precisam urgentemente de optimizar os seus websites, implementando técnicas como compressão de imagens, minificação de código (ou minimização: o processo de remover todos os caracteres desnecessários do código fonte do JavaScript) e cache eficiente.
- A IL, PSD e PS devem rever a linguagem usada, apostando numa escrita mais clara, directa e acessível.
- Partidos com bons resultados devem manter e reforçar as boas práticas já implementadas, garantindo que o seu posicionamento não regride.
- Apesar de boas notas técnicas, muitos partidos ainda falham na criação de conteúdo verdadeiramente relevante e pesquisável (SEO).
- É importante ter em conta que a presença digital não é um projecto pontual. É essencial manter um processo contínuo de avaliação, actualizações e melhoria.
Acredito que a menos de um mês das próximas eleições legislativas, os partidos têm uma oportunidade (e responsabilidade) única de demonstrar que levam a sério a comunicação com todos os cidadãos. Um website não é apenas um cartão-de-visita digital é, sobretudo, um espelho da organização, do cuidado com o eleitorado e da capacidade de adaptação aos desafios contemporâneos.
Acredito também que a política digital não se faz apenas com hashtags e vídeos virais no TikTok. Faz-se também com acessibilidade, clareza, rapidez e responsabilidade. E os websites dos partidos são o ponto de partida. Se queremos uma democracia forte, participativa e inclusiva, esta começa também com linhas de código bem escritas e com a vontade de incluir todos, até nos cliques no site de um partido político.
(*) do CpC: Cidadãos pela Cibersegurança
Pergunta do Dia
Em destaque
-
Multimédia
Gemini vai dar “vida” ao robot de companhia Ballie da Samsung. Chega às lojas durante o verão -
Site do dia
Transforme textos em infografias de forma simples a partir deste website -
App do dia
Dotsu: Divirta-se a combinar peças coloridas num jogo com uma mecânica desafiante -
How to TEK
Já pode utilizar o Google Lens enquanto navega na internet em iOS. Saiba como ativar
Comentários