Muita da tecnologia da impressão 3D agora acessível a todos, assim como às empresas, deve-se à expiração das patentes das grandes fabricantes, “o que possibilitou o desenvolvimento de equipamentos de menor custo e acessível ao público em geral”, explicou ao SAPO TEK Rafael Mateus, responsável pela área de impressão 3D da Emetrês. A empresa tem mais de 40 anos de experiência de comercialização de produtos e equipamentos gráficos e de comunicação, tendo-se especializado em tecnologias de impressão 3D.
Considerando que as impressoras 3D eram inicialmente restritas à área indústria, segundo Rafael Mateus, estas tornaram-se mais acessíveis ao público, com melhorias constantes na precisão, velocidade e variedade de materiais utilizados. “Desta forma, em algumas aplicações menos exigentes, passaram a ser uma possibilidade”.
Opinião semelhante tem Nuno Oliveira, fundador da startup XPIM 3D em Braga, que também se especializou no fabrico de impressoras 3D e de serviços associados à impressão. Destaca que as patentes de produção de filamento de plástico caíram em 2011/12. Trata-se de uma tecnologia que contempla a passagem de filamento de polímero por um injetor controlado por computação. Uma barra de metal aquecida derrete os filamentos, abrindo caminho para os eixos X e Y, originando assim a impressão 3D, tecnologia que se faz há mais de 30 anos, até aqui patenteada.
Veja na galeria imagens de soluções da Emetrês:
É neste sentido que a abertura das patentes deu origem a muita tecnologia aberta e acessível a todas as fabricantes, que a vão moldando mediante as suas necessidades. A XPIM surgiu exatamente pela curiosidade de Nuno Oliveira na impressão 3D, assumindo o potencial da tecnologia e como esta seria útil para arquitetos e designers de produto. “Havia apenas máquinas industriais de 150 mil euros para cima e depois haviam os equipamentos de desktops, fraquinhos e pequenos. O meu objetivo era fazer algo intermédio, maior que os típicos 20 cm, mas sem entrar no lado industrial, que requer uma elevada capacidade de investimento e recursos humanos”, refere o fundado da startup.
Foi assim criada uma solução de impressora 3D com capacidade de 50x50 cm, mais tarde otimizada para 60x60 cm. Inscreveu-se em programas da Universidade do Minho, apresentando a sua proposta de valor. A startup criou do zero o design das suas máquinas, neste caso por Nuno Oliveira, contando com um colega para a parte da programação. Durante a apresentação final, onde estavam presentes empresas e investidores, a startup foi contactada pelo preço de impressora e passou a vender.
Mas quando fala no negócio das impressoras 3D, a startup vendeu cinco ou seis máquinas. “Em Portugal estamos atrasados na tecnologia e quando há pouca capacidade de investimento e não se sabe o valor do mercado, as empresas não querem gastar 18-27 mil euros por uma impressora”, refere o líder da empresa, apontando o preço das suas soluções. A startup oferece atualmente uma máquina de 60x60, outra de 70x70 e afirma que tem outra de maior dimensão em produção, mas prefere não dizer o tamanho por questões de segredo de negócio.
Veja na galeria imagens de soluções de impressoras e produtos impressos da startup XPIM 3D:
Na verdade, a XPIM prefere não vender tantas impressoras, por ser algo ainda pouco explorado em Portugal. Dessa forma, assume uma posição mais importante na área de prestação de serviços, levando Nuno Oliveira a manter em segredo quantas máquinas tem ao seu dispor, especializando-se na impressão de peças de grande formato.
Impressão 3D tem a mesma viabilidade que uma peça original
Até há pouco tempo, a impressão 3D era utilizada sobretudo na fase de prototipagem, criando modelos que poderiam demorar entre 12 a 48 horas. “Mas houve uma oportunidade para levar o negócio de aplicação da impressão 3D para cenários reais, ou seja, criar peças para utilização real”.
As máquinas atuais são mais versáteis e podem fazer clones, ou seja, imprimir 5 peças no mesmo tempo que demoraria a fazer uma. A XPIM tem a capacidade de, por exemplo, imprimir 8 ou 15 mil peças em 15 dias. Segundo Nuno Oliveira, o processo acelera o resultado final e em muitos casos consegue-se ir do protótipo ao lançamento do produto muito rapidamente. Os clientes não têm de se preocupar com as peças que precisam com seis meses de antecedência, destacando que isso é a parte de valor da sua empresa.
Questionado sobre se as peças impressas em 3D podem ser utilizadas como substituto das originais, por exemplo, na indústria automóvel, Nuno Oliveira confirmou que sim, pois têm a mesma resistência química e todos os mesmos elementos do ponto de vista de engenharia. E deu exemplos práticos de como as peças são utilizadas para o restauro de carros antigos, onde as mesmas já não são fabricadas. Através de um scanner 3D pode-se fazer uma digitalização tridimensional e dessa forma executar-se a engenharia inversa, criando-se o modelo 3D (blueprint) para se imprimir a quantidade de peças que for necessária.
Para Nuno Oliveira, é preciso haver uma mudança de mentalidade. Explicando o conceito industrial, as peças de plásticos necessitam de um molde, que tem de ser testado e depois arranjar uma fábrica que a produza, demorando cerca de três meses num processo até devolver ao cliente. “Mas quando se quer cinco ou mesmo 100 mil peças, estes são considerados pedidos micro e são descartados pelas fábricas”. Empresas como a XPIM fazem esse trabalho por um período muito mais reduzido e sem olhar a quantidades mínimas.
Deu o exemplo do unicórnio português Sword Health, que tem uma sessão de fisioterapia por IA e durante a pandemia obteve muitos pacientes. Estes utilizam umas caixas para albergar sensores de movimento e de um momento para o outro tiveram a necessidade de 40 mil peças, de 17 tipos diferentes. “No formato normal, não conseguiriam obter as peças, mas com a impressão 3D conseguiram entregar as mesmas aos seus clientes em 15 dias, sem a preocupação da quantidade que depois vão precisar”, salientou o líder da startup, acrescentando que possíveis alterações no design não têm custos atualmente.
E essa mudança de mentalidade passa também por não se fazerem stocks de peças, mas sim no fabrico daquelas que necessitam para os pedidos dos clientes. É possível mandar um PDF da peça em 3D necessária ou em formato de ficheiro STL, o mais usado na indústria, não interessando se esta é de um acessório para o chuveiro ou um pé para uma cadeira.
Já o processo de engenharia inversa poderá não compensar se tiver de ser feito. Imagine uma gaveta de um frigorífico partida e não existe um modelo 3D da mesma. Se o cliente tiver a capacidade de fazer o plano digital, como por exemplo, recorrendo ao Fusion 360, para a empresa é fácil imprimir e o cliente só paga a impressão 3D, caso contrário pode não compensar.
A XPIM chegou mesmo a ter um projeto-piloto com a Worten para tentar ter sempre peças disponíveis. Mas não ter o modelo 3D não compensa aos clientes. Uma gaveta do frigorífico custava ao cliente 250 euros pelo modelo e 50 euros pela impressão. E embora o cliente só tivesse de pagar o modelo uma vez, provavelmente também não iria precisar de mais gavetas. Mas o caso muda quando se deseja fazer uma peça que não existe para um automóvel clássico ou antigo, em que o cliente está disponível a pagar o preço da mesma para o reparar.
A XPIM pretende democratizar esta tecnologia, destaca Nuno Oliveira, referindo-se à venda de impressões, mais que o fornecimento de impressoras. Uma máquina industrial pode custar entre 150-200 mil euros, o material custa a partir de 230 euros por quilo. Assim, uma peça de custo de 10 euros, mais a infraestrutura de uma empresa tornaria a mesma muito cara. No caso da startup, como fabrica as máquinas, não precisa de amortizar o seu preço e, portanto, consegue um preço inferior.
É também usada matéria-prima de “marca branca”, com preços de 10-20 euros por quilo com qualidade. Assim, uma peça que custaria a um concorrente 10 euros a fabricar, para a startup custará 1 euro. E é dessa forma que pretende tornar mais acessível o acesso à impressão 3D. “E isto sem fazer dumping do mercado, apenas baseado em estudo dos concorrentes”. Salienta que apenas algumas indústrias específicas são necessárias folhas de requisitos, como a aeroespacial, mas não é esse mercado que está a explorar.
Novos entusiastas podem adquirir experiência para o futuro
Apesar de não acompanhar as comunidades de hobby, por estar focado nas tendenciais industriais, Nuno Oliveira diz que é um sector que não deve ser menosprezado e que nos últimos quatro anos são as fabricantes de impressoras pequenas que têm lançado inovações. “Nas industriais os utilizadores têm pouco controlo, é quase click & print, mas as pequenas introduzem novas tendências, estando sempre a inventar e a expandir”.
Destaca que um utilizador com uma impressora de 150-300 euros pode imprimir e vender, o que “dá para ganhar uns trocos, mas mais importante é as competências que ganham para o futuro, pois não existem muitos cursos de formação”. Quando terminou o curso em 2008, na Universidade do Minho, só havia uma cadeira de design que “olhava de lado” para o curso de impressão 3D. Explica ainda que muito pessoal novo que está a aprender de forma autodidata a desenhar a 3D, os materiais, propriedades e temperaturas.
Quando se fala do investimento inicial para iniciantes, um novo utilizador interessado em impressão 3D pode variar, aponta Rafael Mateus, da Emetrês. Um iniciante pode comprar uma impressora por algumas centenas de euros, “porém estará limitada em termos de temperaturas capazes de processar e consequentemente os materiais possíveis de utilizar”. Acrescenta que nas comunidades de impressão 3D, a procura varia em estatuetas, acessórios de adaptação e peças de substituição. Salienta ainda as plataformas online que oferecem cursos gratuitos e pagos sobre técnicas de impressão 3D, além dos tutoriais partilhados pelos utilizadores nos fóruns dedicados.
Nuno Oliveira destaca o surgimento, nos últimos 12 meses da Bambu Lab, empresa criada por ex-engenheiros da DJI, que introduziram novas impressoras disruptivas no mercado e com preços a começar nos 329 euros. “Há 18 meses pagavam-se uns 150 euros por uma impressora que só dava problemas, mas estes novos modelos são como os drones, amigos do utilizador e funcionam. Muitos utilizadores nem se lembram que as impressoras necessitam de ser calibradas e limpas, deixando de funcionar quando entopem, depois de algumas horas a funcionar. Os modelos da Bambu Lab fazem a calibração automática e são bem mais silenciosas.
Nota da Redação: Este artigo faz parte de um dossier sobre impressão 3D que o SAPO TEK está a publicar esta semana. Continue a acompanhar os artigos
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