No mundo atual e fruto da era digital em que nos encontramos, a mudança vai acontecendo a uma velocidade absurda ao mesmo tempo que vai exigindo uma maior adaptação às necessidades e ao comportamento da própria sociedade.

Isso não é diferente no âmbito educativo, onde a tecnologia tem vindo a promover uma grande transformação digital e a influenciar a formulação de entendimentos e de processos de aprendizagem, algo visível pela quantidade cada vez maior de cursos e formações online e fóruns de discussões que trouxeram à aprendizagem autónoma uma nova dimensão.

Diante deste cenário, as mudanças nas formas de ensino também se tornam necessárias para acompanhar toda esta evolução e atender às novas exigências do mercado educativo. Em Portugal, um dos pontapés de saída foi dado em 2008 com o Plano Tecnológico da Educação (PTE) que pretendia transformar as salas de aula na utilização da tecnologia e marcar um novo momento de informatização da escola em Portugal ao ser um meio para melhorar os resultados escolares e modernizar os processos de ensino-aprendizagem.

O projeto e o investimento associado permitiram colocar Portugal em lugares cimeiros no uso da tecnologia na área da educação em 2010, como mostrava o relatório PISA (Programa Internacional de Avaliação dos Estudantes), mas o último “Retrato de Portugal 2018”, apresentado em Bruxelas no início deste mês, revela que Portugal tem de investir na educação, área em que permanece estatisticamente na cauda da União Europeia (UE).

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Embora se tenham visto nos últimos anos significativas evoluções na sociedade da informação, o professor Pedro Xavier Mendonça disse ao SAPO TEK que, apesar de tudo ser mais tecnológico agora “incluindo a escola, nem que seja por via do facto de cada aluno possuir um smartphone”, não tem havido uma atualização suficiente dessas tecnologias ao longo dos últimos tempos.

“As tecnologias digitais em particular exigem uma atualização permanente, o que transforma o sistema educativo digitalizado num grande consumidor de inovações ou novas versões digitais. Algo dispendioso”, afirma o investigador que considera que, neste momento, a tecnologia e a Escola “são mais concorrentes (em busca da atenção e interesse dos alunos, por exemplo) do que entidades em colaboração”

O desfasamento entre as competências necessárias e as adquiridas pelos alunos, em parte resultante da falta de investimento significativo a nível dos equipamentos tecnológicos e infraestruturas, é um grande desafio para as escolas de hoje e que podem levar a que esta perca o seu sentido, alerta em declarações ao SAPO TEK Jorge Pedreira, Secretário de Estado Adjunto da Educação entre 2005 e 2009.

Para o responsável, há muito que a escola deixou de ser o único meio de acesso geral à informação e ao conhecimento, arriscando-se, nos dias de hoje, a “não ser o principal se mantiver o mundo da tecnologia e em particular da Internet na periferia do seu funcionamento”, afirma.

“É necessário perceber que estamos perante novas gerações que têm uma relação completamente diferente com a informação, com o conhecimento e com as respetivas formas de legitimação. E que estamos perante um mundo em que a informação e o conhecimento se produzem e circulam de novas formas. A escola e o sistema educativo não podem fazer de conta que nada aconteceu”, defende.

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Fernanda Ledesma, presidente da direção da Associação Nacional de Professores de Informática também defende que a escola se deve ajustar às mudanças da sociedade nas suas várias dimensões, um “percurso que nunca está concluído e que, no caso das tecnologias, é uma correria contínua”, aponta.

A educação tecnológica é muito mais do que ensinar tecnologia às crianças e jovens, mas antes deve passar também por seduzir os jovens para a utilização da Tecnologia de modo simples e aplicado à realidade, utilizando ferramentas que lhes permitam dar largas à sua criatividade e imaginação.

Pedro Xavier Mendonça afirma que é preciso colocar a tecnologia no seu lugar: como conteúdo e eventualmente instrumento útil em alguns casos e não como “pozinho mágico”. Até porque, não é “lançando tecnologia para cima das pessoas que se vai, magicamente, conseguir melhorar as aprendizagens”, defende o investigador que também aponta para a necessidade de distinguir entre o “aprender a usar a tecnologia de modo a preparar os jovens para um mundo tecnológico” e “usar tecnologia para aprender todas as matérias porque assim se aprende melhor”.

De que forma pode, então, a escola portuguesa adequar-se aos desafios da evolução tecnológica?

Um pouco por todo o globo, a instituição escola tem feito ajustes e tem-se procurado munir de ferramentas para se adaptar a um público que já não se deixa cativar por prolongadas exposições orais e apontamentos em um quadro.

E, apesar de ainda existir alguma resistência ao uso de novas formas de ensino, entre elas as que usam novas tecnologias, Pedro Xavier Mendonça aponta que o grande problema é “saber como ultrapassar um ensino transmissivo-enciclopédico, pouco ativo e assimétrico”. Aqui, a tecnologia pode, eventualmente, ajudar nesse processo, “mas ela deve ser apenas um suporte, não o centro da questão”, remata.

Para ir ao encontro destes objetivos, o atual Ministério da Educação defende a aposta em um conjunto diversificado de medidas e projetos educativos, dos quais se destacam a “introdução da componente curricular de Tecnologias de Informação e Comunicação no Ensino Básico, abrangendo áreas como a Programação e Robótica,  mas também a Literacia de Informação” e a “continuidade de múltiplos projetos de Programação e Robótica no 1.º ciclo, abrangendo mais de 400 escolas do país”, revelou uma fonte daquele ministério ao SAPO TEK.

A adequação da escola portuguesa aos desafios da evolução tecnológica passa também por um investimento em equipamentos e infraestruturas, a ser desenhado no âmbito do programa InCode2030, aponta a mesma fonte, dando como exemplo a oferta a todos os alunos do 1.º e do 2.º ciclo de licenças digitais associadas aos manuais escolares para poderem explorar conteúdos para além do livro, uma medida contemplada na última proposta de Orçamento de Estado para 2019 e que revela um crescimento na Educação de 4%.

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“A despesa total consolidada no programa orçamental Ensino Básico e Secundário e Administração Escolar ascende, em 2019, 6.421,3 milhões de euros, o que compara com o montante de 6.173,1 milhões de euros de 2018, representando um crescimento de 4% face ao orçamento de 2018, justificado sobretudo pelo aumento das despesas com pessoal, que crescem 4,5% e das outras despesas correntes de funcionamento, em 4,4%” podia ler-se no relatório divulgado no dia em que o OE2019 foi entregue no parlamento.

Sobre os professores, o relatório refere "um reforço da capacitação dos profissionais da educação" e que "será dado especial enfoque à formação contínua, prevendo-se que, no ano letivo 2018/2019, 35 mil docentes e agentes educativos frequentem ações de formação".

Já em relação à requalificação de escolas a cargo da Parque Escolar, o relatório do OE2019 adianta que a previsão de investimentos a concretizar em 2019 pela empresa criada para requalificar e manter os estabelecimentos escolares é de 61,9 milhões de euros, afetos a aquisição de bens de capital.

A construção, muitas vezes em parceria com as Autarquias e Comunidades Intermunicipais e com o apoio de parceiros locais, de espaços inovadores de aprendizagem (conhecidas como Salas de Aula do Futuro) são também uma aposta estratégica do Governo, bem como o investimento nos planos de literacia digital promovidos pela Rede de Bibliotecas Escolares.

No entanto e a par destes conjuntos de evoluções em que a mobilidade e a possibilidade de aprender em interfaces diferentes e com percursos escolhidos será uma tendência e um suplemento, não se pode deixar de lado o factor humano, considerado fundamental por Pedro Xavier Mendonça.

“A tecnologia é boa na criação de automatismos, mas não na criação de relações sociais. Aprender deve passar também pela interação humana, de modo a valorizar competências afetivas e até de cidadania”, conclui.