O Presidente da República defendeu que a Carta Portuguesa de Direitos Humanos na Era Digital que promulgou não institui nenhuma forma de censura por parte do Estado e realçou que foi aprovada "praticamente por unanimidade".
"Seria grave se o Estado fizesse censura, seria mesmo intolerável, e seria intolerável que, mesmo não fazendo censura prévia, fizesse censura à posteriori. Eu nunca promulgaria um diploma desses, passei toda a minha vida a defender a liberdade de imprensa, nunca o promulgaria", declarou Marcelo Rebelo de Sousa.
O chefe de Estado, que falava em resposta aos jornalistas, a meio de um percurso a pé no concelho de Câmara de Lobos, na Madeira, acrescentou: "E tenho a certeza de que o parlamento, que o que tem mais é democratas, não votaria praticamente por unanimidade um diploma sem notar que havia lá censura".
Marcelo Rebelo de Sousa realçou que esta lei vem "na sequência de posições internacionais sobre a matéria, nomeadamente europeias" e foi aprovada "apenas com a abstenção da Iniciativa Liberal", e referiu que já depois da votação na Assembleia da República houve "um artigo 6.º que suscitou algumas dúvidas".
Segundo o Presidente da República, "nos termos em que existe o artigo 6.º, pode-se achar que é mais bem escrito ou mais mal escrito, que é mais feliz ou menos feliz, mas censura não tem".
"E, portanto, a meu ver não tem nada de inconstitucional. Foi assim que eu o promulguei. Também vos confesso que me senti confortado pelo facto de todos os partidos, praticamente todos, menos um deputado, acharem que aquilo não levantava nenhum problema de constitucionalidade nem nenhum problema político grave", reforçou.
O chefe de Estado ressalvou que respeita aqueles que dizem que é preciso "estar atentos a que no futuro não haja censura".
No entanto, contrapôs que aquilo que mais o preocupa "é que os jornais, as rádios e as televisões entrem em crise económica e financeira e surja uma censura através do poder económico", em que "quem paga, quem compra, quem exerce uma forma de intervenção económica e financeira poder dizer: isto convém mais, convém menos, isto levanta problemas".
Questionado se vê isso acontecer atualmente, Marcelo Rebelo de Sousa respondeu: "Não vejo, mas se a informação não for viável económica e financeiramente fica muito frágil, e essa fragilidade não é boa para a liberdade de imprensa".
O artigo 6.º da Carta Portuguesa de Direitos Humanos na Era Digital, lei publicada em 17 de maio no Diário da República, estabelece que "o Estado assegura o cumprimento em Portugal do Plano Europeu de Ação contra a Desinformação, por forma a proteger a sociedade contra pessoas singulares ou coletivas, de jure ou de facto, que produzam, reproduzam ou difundam narrativa considerada desinformação", que seja "apresentada e divulgada para obter vantagens económicas ou para enganar deliberadamente o público".
De acordo este artigo, "todos têm o direito de apresentar e ver apreciadas pela Entidade Reguladora para a Comunicação Social queixas contra as entidades que pratiquem os atos previstos no presente artigo" e, por outro lado, "o Estado apoia a criação de estruturas de verificação de factos por órgãos de comunicação social devidamente registados e incentiva a atribuição de selos de qualidade por entidades fidedignas dotadas do estatuto de utilidade pública".
O Presidente da República relativizou a possibilidade de recurso à Entidade Reguladora para a Comunicação Social dizendo que "já acontecia em determinados casos" e que neste ponto "alarga-se o que existe, não tem a ver com tribunais".
Quanto às "estruturas de verificação de factos" nos órgãos de comunicação social previstas nesta lei, salientou que programas desse tipo "já existem, em todos os canais televisivos, existe na RTP, existe na SIC, existe na TVI", assim como "nalguma imprensa".
Marcelo Rebelo de Sousa argumentou que correspondem à "opinião do canal, que faz o seu controlo", desdramatizando também esta parte da lei: "Não é mais do que isso, não é o Estado que vai controlar",
"O terceiro o ponto é o de se considerar que pode haver entidades, não públicas, mas de utilidade pública, fundações, associações de utilidade pública, que atribuam selos de qualidade, como há selos de qualidade no turismo, na hotelaria, na restauração", enquadrou, acrescentando: "Não é o Estado, só faltava que fosse o Estado a dizer. São outras entidades que o fazem. Vale o que vale, é uma opinião".
"Em nenhum destes casos há censura prévia, nenhum, Em nenhum destes casos o Estado intervém, quer dizer, não há ninguém da Administração Pública, central, regional ou local que antes de haver qualquer notícia ou qualquer informação intervém, e depois de haver essa informação se substitui aos tribunais que têm uma palavra num Estado de direito", concluiu o chefe de Estado.
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