Os pais de Archie Battersbee, o menino de 12 anos que sofreu danos cerebrais irreversíveis depois de participar num desafio do TikTok, continuam a lutar para que as máquinas que suportam a vida do filho não sejam desligadas. Enquanto isso, o tema ganhou mediatismo e chamou a atenção para um fenómeno que não é novo e que já pôs fim a outras vidas. O TikTok, com ou sem responsabilidade direta no assunto, pela dimensão que assumiu, está no centro da polémica e já enfrenta vários processos em tribunal.
O caso de Archie começou em abril, quando os pais encontraram o jovem inanimado. Tinha participado no Blackout Challenge, que consiste, basicamente, em apertar o pescoço até perder os sentidos, usando uma corda, um cinto, ou outro objeto. A privação de oxigénio no cérebro pode causar danos graves ou morte e foi o que aconteceu já a outros jovens que seguiram o desafio através da rede social.
Nos Estados Unidos há já processos judiciais a correr na sequência disso. Na queixa apresentada pelos pais de duas meninas de sete e oito anos, em julho, a rede social é responsabilizada pelas mortes. A acusação defende que a plataforma não tem agido para controlar um fenómeno que tem estado em expansão e, pelo contrário, permite que os seus algoritmos apresentem o desafio no feed de crianças que não o procuram e que não têm capacidade para avaliar os riscos inerentes.
Refere-se que o TikTok usa algoritmos perigosos que, intencional e repetidamente, selecionam vídeos do desafio para exibir no feed de crianças, incentivando-as a participar. A acusação vai mais longe e considera que o “TikTok investiu milhares de milhões de dólares para conceber intencionalmente produtos que destacam conteúdos perigosos, que sabe serem perigosos e que podem resultar na morte dos seus utilizadores". Também se fica a saber pela acusação que ambas as jovens, com sete e oito anos, tinham os seus próprios smartphones e passavam muitas horas na rede social.
No início do ano uma menina de 10 anos, também dos Estados Unidos, tinha sido igualmente encontrada sem sentidos no quarto, depois de participar no mesmo desafio. Também acabou por morrer e os pais também já processaram a rede social. No total são conhecidos cinco casos nos Estados Unidos, um em Itália e um na Austrália, todos com crianças
A empresa tem-se defendido, dizendo que o Blackout Challenge não nasceu no TikTok, o que é verdade. Como refere um artigo da Newsweek, o Centro de Prevenção e Controlo de Doenças dos Estados Unidos lançou um alerta sobre o assunto e na altura já estimava que 82 crianças tivessem morrido em consequência do desafio nos EUA, entre 1995 e 2007.
A questão central será, no entanto, perceber a influência que uma rede social com o poder de envolvimento dos seus utilizadores como o TikTok tem pode ter no incentivo a ações perigosas. E o que também é certo é que pela plataforma da chinesa ByteDance já passaram vários desafios com resultados perigosos, ou fatais para a saúde de quem decide segui-los.
Depois do desafio da "Baleia Azul" já existiram vários
Estes desafios online não são uma novidade do TikTok, mas são sem dúvida um tipo de prática que ganhou destaque na rede social, até pelo seu foco no vídeo e na imagem. Ao longo dos últimos anos já existiram vários.
O desafio da caixa de leite, que consistia em andar sobre pilhas de caixas de plástico (como as que se usam para transportar fruta e legumes) levou várias organizações médicas a lançarem alertas sobre o risco de lesões, que daí podiam resultar. Foi moda na rede social em 2021.
Um ano antes tinha dado nas vistas o Benadryl Challenge. A ideia era tomar grandes quantidades de anti-histamínicos e esperar pelos efeitos alucinógenos. Pelo menos uma jovem de 15 anos morreu na sequência deste desafio.
Antes da era TikTok já tinha gerado preocupação outros fenómenos do mesmo género que usaram outros serviços online de grande alcance para chegar aos destinatários. O desafio da Momo, em 2018, via WhatsApp, ou a Baleia Azul, um ano antes, são exemplos disso.
Voltando ao Blackout Challenge, Archie, o menino que os pais querem manter ligado à vida, está em coma desde abril. Os médicos do Royal London Hospital defendem que manter as máquinas ligadas não serve o melhor interesse da criança e definiram esta quinta-feira, 4 de agosto, como dia para as desligar.
Os pais recorreram à justiça, que confirmou a decisão médica. Recorreram também ao Tribunal Europeu dos Direitos Humanos que recusou intervir, mas a família conseguiu ganhar tempo com uma última tentativa. Se conseguisse apresentar até esta manhã um pedido de transferência da criança, a família evitaria que o suporte artificial de vida fosse desligado às 11 horas. Foi entregue ao tribunal um pedido de transferência para uma unidade de cuidados paliativos. Até haver decisão, as máquinas que ligam o jovem à vida permanecem ligadas.
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