Rui, na casa dos vinte, personal trainer de profissão, não queria acreditar quando se deparou com um perfil de si próprio entre a lista de sugestões de amigos que o Facebook costuma mostrar. O "amigo" em questão tinha o seu nome e a foto que usava na altura como imagem de apresentação.

Já Paulo percebeu que tinha um perfil falso quando alguém lhe perguntou se, por acaso, tinha dois "faces". E não tinha. Acedendo ao (seu) "face" falso ficou a saber que tinha conseguido cerca de 50 contactos associados, alguns deles provavelmente em comum com os do (seu) perfil verdadeiro, onde tem mais de 1.000. A solução encontrada foi partilhar a "notícia" no mural, para que mais pessoas pudessem denunciar a situação.

Se a maioria dos casos de contas falsas com que nos costumamos cruzar se limita à usurpação do nome e da foto de perfil e à duplicação das páginas preferidas, e até podem ser encarados com alguma ligeireza, por se achar ridícula a situação (e qualificar-se da mesma forma a pessoa que a provoca), existem outros em que os contornos são um pouco mais graves.

Há mais de um ano que Carla é "perseguida" pela criação constante de perfis falsos, que além do nome e das fotos juntam legendas a essas mesmas imagens e textos no "Sobre mim" pouco simpáticos. Dentro do Facebook não há muito mais a fazer do que reportar as páginas falsas sempre que são descobertas.

O procedimento não é simples, porque obriga a vários passos, nomeadamente e no caso de um perfil falso, justificar a denúncia, indicando o tipo de situação e a vítima em questão. Em resposta, o Facebook emite um aviso onde refere que a "denúncia de conteúdo não garante que este seja eliminado do site".

Em primeiro lugar, porque a rede social criada por Mark Zuckerberg usa um sistema automático para fazer o rastreio das denúncias. Supostamente estas só chegam ao conhecimento da equipa de segurança interna quando atingem um determinado volume de queixas. Daí que alguns perfis falsos se mantenham online durante algum tempo.

A "análise manual" serve também para evitar que perfis fidedignos sejam desactivados, como de vez em quando acontece. Ainda recentemente Kate Middleton, uma britânica de 29 anos, viu a sua conta no Facebook suspensa, porque a rede social entendeu que a jovem se tinha registado no portal com um nome falso, neste caso usando a identidade da noiva do príncipe William, sua homónima.

Quando reportar não basta

No caso de Carla, a "espiral" de criação de perfis falsos continuou e começou a vitimar também alguns dos amigos mais próximos, o que a levou a apresentar queixa na Polícia Judiciária.

Na opinião de Manuel Lopes Rocha, partner da sociedade de advogados PLMJ, esta é uma hipótese correcta numa situação destas, mas tendo em conta os "escassos meios" da Polícia Judiciária nesta área e a "lentidão dos processos", neste momento "o melhor mesmo é ir para os tribunais civis", considera. "Os Estados têm de repensar a sua política legislativa nesta área. A Comunidade Europeia está a fazê-lo, mas o problema põe-se sempre quanto aos meios de aplicação da lei".

Além de ser considerado pecado para a religião católica - segundo o papa Bento XVI "na procura por um número maior de amigos", é necessário "ser fiel a si mesmo" e nunca acreditar nos "truques ou ilusões, como a criação de falsas identidades e perfis" - quem cria perfis nas redes sociais simulando ser outra pessoa incorre em alguns crimes, independentemente da intenção ser mais ou menos "maliciosa".

Em primeiro lugar, está a infringir direitos de personalidade do Código Civil, como o direito ao nome e à imagem, refere Manuel Lopes Rocha. No plano penal, podem, em algumas circunstâncias, considerar-se os crimes de Acesso Indevido a Dados Pessoais da Lei de Protecção de Dados Pessoais e o crime de Falsidade Informática da Lei do Cibercrime.

De qualquer modo, a identificação dos impostores neste tipo de situações não parece ser fácil. Carla, por exemplo, viu a sua queixa na Polícia Judiciária ser arquivada pelo Ministério Público por falta de provas …

Patrícia Calé

Nota de redacção: À excepção do jurista Manuel Lopes Rocha, todos os nomes usados nos casos apontados neste artigo são fictícios.