“Daqui a alguns anos vamos olhar para trás e ficar horrorizados com o que deixámos as nossas crianças ter acesso na Internet”. A frase é de Iain Corby. Diretor executivo da associação de fornecedores de sistemas de verificação de idade, que defende que está ultrapassado o discurso que colocava de um lado a privacidade e de outro o controle de idade dos jovens no acesso a serviços online, porque o que importa é defender as crianças. Mas será que isso tem de passar pela proibição e ferramentas de verificação de idade?
Não perca nenhuma notícia importante da atualidade de tecnologia e acompanhe tudo em tek.sapo.pt
O exemplo do Reino Unido, que começou este ano a impor a verificação de idade para acesso a plataformas de conteúdos de adultos, foi partilhado na conferência Lisbon 2025: Age & Trust Online, promovida pelo projeto Agarrados à Net, onde se falou também do caso da Austrália, que hoje começou a aplicar o bloqueio a menores de 16 anos às redes sociais, e as opções em Portugal e na Europa.
Imagens de pedofilia, cyberbulling, grooming e outras formas de aliciamento e exploração online são alguns dos riscos a que os mais novos estão expostos, muitas vezes sem controle e sem que tenham a capacidade de processar a informação e de se defenderem. Perante esta realidade que entra pelos ecrãs dos telemóveis e dos computadores, a necessidade de colocar online regras de acesso a conteúdos nocivos foi defendida como um princípio básico por todos os participantes na conferência, mas a forma de o fazer é que faz a diferença.
Enquanto alguns apostam em ferramentas de verificação de idade, e limites explícitos, outros especialistas acreditam na formação de jovens, pais e educadores que permita um acesso mais livre e informado, mas com a responsabilização das plataformas para a moderação dos conteúdos.
“Estamos a ir pelo caminho mais fácil […] se calhar não estamos a ser tão duros com as plataformas como devíamos”, defende Cristiane Miranda, cofundadora do projeto Agarrados à Net, e especialista em parentalidade digital e bem-estar digital.
“Tiramos os jovens das redes sociais mas este continua a ser um lugar perigoso para todos”, justifica, sublinhando que temos de encontrar soluções para criar um mundo melhor online, e fazê-lo ouvindo os jovens.
O tema tem sido pouco debatido em Portugal, e Tito de Morais, cofundador do projeto Agarrados à Net que organizou a conferência, diz que este é o momento de se avaliarem as opções e compreender o impacto destas medidas.
Nesta matéria o Governo já defendeu que a limitação no acesso às plataformas tem de ser coordenada ao nível da EU, como admitiu recentemente Margarida Balseiro Lopes, ministra da Cultura, Juventude e Desporto. Portugal foi um dos países que assinou em outubro a Declaração de Jutlândia, onde se compromete a reforçar a proteção de crianças e jovens online, tendo em vista a criação de mundo digital mais seguro, saudável e adequado aos mais novos.
“As nossas crianças têm sido deixadas sozinhas na Internet por demasiado tempo”, afirmou na altura Caroline Stage, ministra dinamarquesa da Digitalização. “Precisamos de ‘porteiros’ digitais para assegurar que a Internet é um lugar seguro e que as crianças não podem aceder quando não têm uma idade apropriada”.
O botão que é a maior mentira da internet: porque a autodeclaração da idade não funciona?
Nos últimos anos têm sido utilizados vários sistemas para impedir o acesso dos mais jovens a conteúdos considerados impróprios para a idade online, mas muitos são considerados demasiado básicos e fáceis de enganar. A verificação por vídeo e a utilização de sistemas de Inteligência Artificial fazem parte das novas propostas, e os alertas para os riscos de privacidade por parte de especialistas multiplicam-se.
O investigador Mohammed Raiz Shaffique, investigador da Universidade de Leiden e coautor do estudo "Mapping age assurance typologies and requirements", admite que não há uma “solução mágica”. Na sua intervenção partilhou a preocupação com a crescente pressão para os países adotarem soluções de verificação de idade, lembrando que isso não desvincula as plataformas de criarem mecanismos de proteção para conteúdos nocivos.
Na Europa o Regulamento dos Serviços Digitais (DSA na sigla em inglês) estabelece os princípios a aplicar, numa abordagem baseada no risco, e Cláudia Webster-Saraiva, diretora Jurídica e Política da DSA para Portugal, sublinha a opção pela aplicação que vai permitir verificar a idade e que está neste momento em testes em vários países, com o alargamento a toda a União Europeia previsto para 2026 e a integração na carteira de identidade digital.
Para evitar a comunicação de adultos com crianças na sua plataforma, a Roblox já começou no início deste mês a aplicar um sistema de verificação de idade obrigatório na Austrália, Nova Zelândia e Países Baixos, antecipando o bloqueio que hoje entra em vigor na Austrália. O objetivo é alargar a todo o mundo a partir de janeiro, protegendo as contas de menores de 13 anos em funcionalidades de chat.
Tami Bhaumik, vice-Presidente de Civilidade e Parcerias da Roblox, diz que esta é uma prioridade para a plataforma que tem mais de 150 milhões de utilizadores e que pretende também apoiar os pais e educadores para os ajudar a compreender os desafios online e proteger as suas crianças.
Na conferência foram ainda apresentados os sistemas de verificação de idade da Yoti, com a estimativa da idade através da imagem do rosto, enquanto a VerifyMy aposta na utilização do email como forma de validação.
A falta de normas comuns, e de consistência dos diferentes métodos de verificação da idade, são apontadas como os principais problemas destes sistemas, assim como a possibilidade de exclusão de utilizadores com menor literacia ou dificuldade de acesso às ferramentas.
Os especialistas alertam ainda para as potenciais falhas de segurança e de escrutínio sobre a forma como os sistemas são treinados e os dados armazenados, mas Julie Dawson, Diretora de Políticas & Regulamentação da Yoti e Rupert Jackson, da VerifyMy, garantiram que as suas soluções cumprem as regras de proteção de dados e aplicam critérios éticos no treino da ferramenta, admitindo porém que é importante que todas as ferramentas sejam sujeitas a maior escrutínio para aumentar o nível de segurança.
O outro lado da moeda: a idade pode não ser o melhor critério para classificação
Kim Sylwander, investigadora do Digital Futures for Children Centre, da London School of Economics e da Fundação 5Rights, foi uma das vozes mais críticas em relação à aplicação de bloqueios por idade nas redes sociais, e à utilização de ferramentas de verificação como forma de controle.
"A primeira decisão deve ser regular as plataformas e não banir as redes sociais", defende, dizendo que este movimento de proibição mostra um falhanço da capacidade de regulação das autoridades. Os direitos das crianças devem ser defendidos, e as plataformas devem apostar em "child rights by design" para além da segurança por design e por defeito.
A investigadora é coautora do artigo "There is no right age! The search for age-appropriate ways to support children’s digital lives and rights", com a investigação a apontar para o falhanço dos sistemas de classificação por idade, porque os jovens não amadurecem todos da mesma forma e não faz sentido ter grupos fechados com o único critério da data de nascimento.
Na sua intervenção, Kim Sylwander sublinha que a proibição na Austrália para menores de 16 anos "vai ser um bom teste", alertando que os jovens já estão a mudar-se para outras redes menos conhecidas que não foram bloqueadas e que podem não ser mais seguras.
Em destaque
-
Multimédia
Novo Toyota bZ4X: A atualização profunda que muda (quase) tudo no modelo elétrico japonês -
Site do dia
Escreva um script, escolha um avatar e o Vids faz o resto para criar um vídeo -
App do dia
Quer criar novos hábitos? Tracktastic traz mais flexibilidade para transformar rotinas em progresso -
How to TEK
Como utilizar a voz para controlar o Windows 11 e ditar texto no computador?
Comentários