Por Mário Moura (*) 

Nos últimos meses, tem existido o debate em torno do impacto da presidência de Donald Trump no mercado dos criptoativos e da especulação financeira. A verdade é que não há grandes surpresas. Quem acompanha este setor sabe que os mercados não reagem ao momento exato da tomada de posse, mas sim ao que já era antecipado antes. Foi isso que aconteceu com a recente valorização do Bitcoin: não foi a vitória de Trump que o fez subir, mas sim a expectativa do mercado em relação às suas políticas pró-cripto.

O mais interessante não é a oscilação de preços, que faz parte da natureza deste mercado. O que realmente importa é a diferença colossal entre como os EUA e a Europa encaram a revolução dos criptoativos. E essa diferença nunca foi tão clara como agora.

Trump pode ter todos os defeitos do mundo – e tem muitos –, mas há uma coisa que não se pode negar: ele reconhece e transparece as oportunidades económicas quando as vê. Durante a campanha eleitoral, já dava sinais de que iria apoiar o setor cripto, e agora, como presidente, está a reforçar essa mensagem.

Já se fala na possibilidade de os EUA criarem reservas de criptoativos. E o mais interessante é que ele não fala apenas em Bitcoin, mas sim em criptoativos no geral. Ou seja, existe um reconhecimento de que há espaço para outras moedas e projetos inovadores, o que mostra uma abordagem muito mais aberta do que aquilo que a Europa alguma vez teve.

Outro ponto a destacar é o foco nos ativos digitais americanos. Projetos como a Solana beneficiaram imediatamente desta estratégia, porque o mercado percebeu que há um esforço para manter a inovação dentro dos EUA. Enquanto isso, na Europa, a única preocupação parece ser criar regulamentações que aumentam a burocracia e dificultam a vida a quem quer empreender no setor.

Até as memecoins ajudam a ilustrar o abismo que existe entre os dois lados do Atlântico. Nos EUA, Trump lançou a sua própria memecoin e houve um enorme “pump” – seguido, como sempre acontece nestes casos, por um “dump” previsível. Nada de novo para quem conhece o mercado. Memecoins não têm utilidade prática, são meramente especulativas e fazem parte da cultura cripto. Mas o ponto aqui não é se são úteis ou não – é como este tipo de fenómeno acontece nos EUA, enquanto a Europa continua completamente alheia à dinâmica do setor.

Aliás, há muito tempo que as memecoins fazem parte do mercado. Quem esteve atento à última feira NFC - Non Fungible Conference - viu que até havia um evento específico só para este tipo de criptoativos. Não é um fenómeno novo, mas sim um reflexo da forma como a comunidade cripto funciona. Há uma cultura própria, uma maneira de operar e de comunicar que nos EUA é compreendida e, de certa forma, até incentivada. Já na Europa, a abordagem é sempre a mesma: ignorar, regular e dificultar.

E é aqui que entra o maior problema. Enquanto os EUA estão a consolidar-se como o grande polo da inovação neste setor, na Europa continuamos a ouvir os mesmos discursos ultrapassados. A presidente do Banco Central Europeu veio recentemente dizer, com todo o orgulho, que nenhum país europeu terá reservas em Bitcoin. Nenhum. Ou seja, enquanto os americanos estão a discutir como integrar os criptoativos na sua economia, nós estamos a garantir que ficamos de fora dessa revolução. E nem sequer estamos a falar de um futuro distante – isto já está a acontecer agora.

A Europa está tão obcecada em regular tudo ao máximo que simplesmente afasta empresas, talento e investimento. E depois, quando os projetos mais inovadores vão para os EUA ou para a Ásia, ficamos a lamentar a falta de competitividade. Mas como podemos ser competitivos se estamos a criar um ambiente hostil para quem quer inovar?

Olhando para o que está a acontecer, a conclusão é simples: os criptoativos vieram para ficar. Podemos discutir preços, podemos debater se a Bitcoin vai valer 100 mil ou 500 mil euros, mas isso são apenas detalhes. O fundamental é percebermos que estamos perante uma mudança estrutural no mundo financeiro e económico.

Os EUA já perceberam isso. Trump, goste-se ou não dele, percebeu isso. E a Europa? Continua a acreditar que pode simplesmente ignorar esta revolução que o mundo vai parar para esperar por nós.

Infelizmente, o mundo não funciona assim. E se não mudarmos de mentalidade rapidamente, ficaremos para trás de uma vez por todas.

Mas, pelo menos, podemos orgulhar-nos de ter “tampas de garrafa que não se descolam”. Afinal, o conservadorismo europeu é isso.

(*) Fundador e CEO da MMC, contabilista e fiscalista