Conhecido inicialmente como Project Leonardo, o comando PlayStation Access foi construído como um novo passo no caminho de acessibilidade. Uma estratégia que a Sony tem vindo a trabalhar nos seus videojogos que incluem opções para jogadores com limitações visuais ou auditivas. Mas agora o objetivo é reunir jogadores que tenham alguma deficiência, sobretudo físicas e motoras, para poderem igualmente usufruir da diversão dos videojogos.
O PlayStation Access segue objetivos muito semelhantes ao que a Microsoft fez com o seu Xbox Adaptive Controller. E foi desenhado e construído em colaboração com a comunidade de acessibilidade e testado por jogadores com deficiências.
O comando terá uma relativa utilidade para um jogador comum, mas pode ser vital para quem tenha dificuldades motoras devido à sua grande capacidade de adaptação. E nesse sentido, a PlayStation Portugal deu a voz exatamente à experiência pessoal de utilizadores com necessidades especiais, com quem o SAPO TEK teve oportunidade de falar e testemunhar a forma como o comando era utilizado numa sessão de Gran Turismo 7.
Segundo Soficious, streamer de videojogos com grande foco na acessibilidade, apesar de não ter nenhuma incapacidade ou limitação motora, a sua experiência com o comando, por ser demasiado personalizável, diz que teve mais facilidade em certos jogos pelo seu conforto físico pelo posicionamento dos botões que pode configurar. Dá o exemplo de Death Stranding que é necessária mais perícia, o facto de poder configurar os comandos sentiu-se mais confortável a jogar.
Veja na galeria imagens do PlayStation Access
Presentes na sessão estiveram Bruno Osório, que tem paralisia cerebral e o atleta paralímpico, Mário Trindade que testaram e partilharam a sua experiência. No caso do atleta, que tem escoliose, que lhe afeta a mobilidade, a sua experiência com gaming é bastante limitada. No entanto, refere que a adaptação ao comando foi bastante natural.
“Consegui configurar e jogar sem a ajuda de ninguém, seguindo as instruções que software ia dando e a montagem do comando, ajustando os botões para a posição que eu queria”, afirma Mário Trindade.
Apesar de ter jogado com um comando convencional, a sua principal dificuldade é a falta de equilíbrio que tem a jogar, quando precisa de segurar o controlador. “Preciso de estar sempre encostado a alguma coisa e quando jogava aguentava muito pouco tempo, cansava-me rapidamente”.
Já com o comando PlayStation Access, a maior vantagem, além de lhe permitir configurar os botões como deseja, é colocar o comando numa mesa e jogar. “Da última vez que estive em casa a jogar Gran Turismo, a minha esposa teve que me chamar porque já lá estava há duas horas e meia”.
No caso de Bruno Osório, de 35 anos, os videojogos sempre estiveram na sua vida, mesmo com a dificuldade que tem para jogar. Ao SAPO TEK explicou que nasceu com seis meses e meio de gestação, o que causou deficiência na mobilidade, tendo menos 20% no braço direito em relação ao esquerdo. “Nos comandos há sempre combinações de teclas que eu não conseguia executar e cada vez mais isso acontece, porque os jogos de luta são cada vez mais complexos”.
Com o Access, o também produtor de videojogos, encontrou uma maior personalização e juntar numa tecla a possibilidade de juntar, por exemplo, a cruz e o círculo. “Isso leva a uma experiência da minha autonomia nos videojogos”. Afirma que consegue obter uma experiência mais completa como jogador, “em vez de andar a pedir ao meu irmão ou alguém para jogar uma parte que eu não conseguia passar”.
Pegando no comando, Bruno Osório mostrou como era fácil colocar o comando na posição pretendida para si, seja o comando voltado para ser usado com a mão esquerda ora com a direita, bastando apenas criar perfis diferentes e mudar de imediato, quando se sente cansado, de uma posição para a outra. Outra vantagem é configurar o comando jogo a jogo, analisando os botões que precisam ser mais pressionados e configurá-los conforme se sentir mais confortável.
Questionado sobre como vê a iniciativa da Sony em criar um periférico de acessibilidade, Bruno Osório vê de forma positiva as marcas olharem para este tipo de mercado, “porque cada vez mais as pessoas com deficiência têm mais poder aquisitivo e temos de agradecer à Sony o trabalho com este periférico e tornar as coisas possíveis no contexto de acessibilidade nos videojogos”.
Ainda assim, o comando não é perfeito e tem margem de manobra para ser melhorado. A ausência do segundo analógico foi a principal queixa apontada pelos três convidados. Jogos como Death Strading, God War Ragnarok e Spider-Man 2 “em que necessita dos dois manípulos, um para controlar a personagem e o outro para orientar a câmara, senti falta de um manípulo extra”, disse Sofious, que tal como Mário Trindade recorreram a um comando DualSense à parte para colmatar essa falta.
Mas ao mesmo tempo, jogos como Tekken 8, o novo Access parece o manípulo de uma arcade, disse a especialista em acessibilidade. Soficious diz que os jogos apresentam ferramentas de acessibilidade, mas há um limite. “A partir do momento em que existe um comando que pode ser configurado sem a necessidade de mexer num software é muito importante, por estar adaptado às necessidades externas é m grande passo”.
Dá o exemplo de como o mais recente God of War pode ser configurado para jogar só com uma mão e definições para dextro. “Mas ainda assim estão a jogar num DualSense, tem botões pequenos, um conforto na mão totalmente diferente”. E o Access permite um maior conforto de utilização, completa a especialista. Ainda assim, apontou a ausência de alguma sensação háptica, tal com existe no DualSense. “Há uma sensação quando estás a jogar no DualSense que não tens aqui”.
Por estar habituado a jogar com os comandos tradicionais, mesmo com as limitações impostas, Bruno Osório diz que gostaria que o Access tivesse um formato mais próximo do convencional e que teve algum tempo para se adaptar ao novo. Ainda que reconheça as vantagens que depois a mudança lhe trouxe.
Numa comparação daquilo que a Sony fez com a PlayStation, de tornar o entretenimento mais acessível, com os desafios que encontra no dia-a-dia, Mário Trindade diz que há 30 anos que reclama por melhores condições para pessoas com deficiência. Mas considera que muita coisa tem mudado, lentamente, e este é um bom passo para jogar por quem não consegue pegar num comando tradicional. Nas cidades do seu país, as barreiras arquitetónicas continuam a ser a principal dificuldade para si, “mas é preciso varrer as barreiras mentais que ainda existem. Há muito tabu e ocultamos muita coisa que não faz sentido”, diz o atleta.
Acrescenta que “nos videojogos somos igualmente uma minoria e somos colocados de lado. O trabalho tem de ser feito por todos e quantos mais de nós, pessoas com deficiência dissermos estamos aqui, as coisas vão surgir mais naturalmente. E a Sony, com a força e marca conhecida mundialmente é uma bandeira e acha que muitas outras marcas vão seguir os passos”. Dá o exemplo que muitas pessoas com deficiência estão 24 horas trancadas dentro de uma casa e se tiveram uma PlayStation com este comando, acabam por passar melhor o tempo.
No caso de Bruno Osório, algo que lhe toca no dia-a-dia, “o meu algoritmo está certo quando vejo as outras empresas a olharem para mim como um mercado e usarem a bandeira verde da acessibilidade como algo muito positivo”. Afirma que quando produz um videojogo, olha para as suas dificuldades nas questões de acessibilidade. “Sou o maior rato de laboratório para a minha equipa”. Mas acredita que quando se fala de inclusão tem de ser para todos e não apenas para um nicho do mercado. E para si, os videojogos foram desde sempre uma ferramenta de terapia psicológica quando era mais novo, “na minha jornada de aceitação das minhas limitações”. E tenta levar essa experiência para o estúdio e sensibilizar as pessoas com quem trabalha.
PlayStation Access é um periférico facilmente personalizável
A pensar logo de início na necessidade de pedir ajuda a alguém para abrir a caixa de um produto, o PlayStation Access começa por dar o exemplo de acessibilidade com a sua embalagem. Os pontos de selagem têm pequenas fitas de papel que podem ser puxados com as suas pontas em forma de arco, em que podem facilmente usar os dedos para puxar. A caixa abre-se com bastante facilidade, dando acesso imediato ao comando, igualmente arrumado para utilizadores com limitações motoras possam retirá-lo da caixa.
À primeira vista, o comando PlayStation Access parece um pequeno joystick clássico, com um manípulo e uma base circular com os botões alocados em redor. O seu design estético, no que diz respeito a cores e materiais é bastante próximo do DualSense da PS5. Só lhe falta a vibração.
O comando é composto por um botão de grandes dimensões no centro, rodeado de oito pequenos botões amovíveis. E é aqui que começa toda a personalização. A caixa inclui botões com diferentes formatos, com extremidades côncavas, inclinadas tanto para cima, como para baixo. E até há um botão maior que ocupa dois espaços.
Veja na galeria as imagens oficiais
Estes botões são muito fáceis de retirar e encaixar, uma vez que são presos magneticamente e por isso não necessitam de um grande esforço. O interessante é que não existem botões pré-definidos. Cada espaço esta numerado, que é o indicador para o software de configuração. Cada botão tem um furo para receber o encaixe dos habituais símbolos da PlayStation: círculo, quadrado, triângulo, cruz, mas também os Ls e Rs, e teclas de opções.
A ideia é que o comando possa ser usado num esquema de 360º, independentemente do lado que prefira o joystick e os respetivos botões. A primeira fase é caracterizar fisicamente o comando, para depois através do software de configuração atribuir facilmente as funções a cada botão ou direção do joystick.
Este joystick pode ser regulado para estar mais próximo ou afastado da base dos botões. Um botão de cadeado garante que este fique fixo sem se movimentar. E caso seja necessário, pode desaparafusá-lo e colocá-lo do outro lado da sua base. Além disso, pode puxar o manípulo e trocar a esfera por um analógico convencional.
De notar que o comando tem quatro entradas de jack (E1 a E4) que servem para ligar periféricos adicionais “externos”, tais como manípulos, botões e outros meios de interação com os jogos. Estas portas poderão ser suportadas oficialmente pela Sony no futuro, mas também compatíveis com acessórios de terceiros, como é o caso do Logitech Adaptive Kit que acrescenta botões e funcionalidades adicionais.
No geral, o comando apresenta uma capacidade de configuração e personalização dos diferentes botões mediante as necessidades de cada utilizador. E não fecha portas à possibilidade de serem introduzidos outros elementos e periféricos no futuro. A ideia é abranger o máximo de jogadores com limitações motoras a terem o direito de se divertirem com os videojogos da PlayStation 5.
O comando já pode ser adquirido por 90 euros.
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