No âmbito do especial que publicámos ao longo desta semana no SAPO TEK sobre as campanhas eleitorais nos meios digitais, quisemos dar voz aos partidos e perceber como estão a endereçar estes meios. E o que disseram os partidos sobre este tema? A maioria na verdade não disse nada e os que disseram também não falam em números. Os únicos números conhecidos sobre o investimento das máquinas partidárias nos canais digitais, manifestamente importantes nesta campanha, são aqueles que foram comunicados à Entidade das Contas e Financiamentos Políticos, que na verdade também revelam pouco sobre o tema, já que estão agregados a uma categoria de despesa mais abrangente, mas já lá vamos.
Aos pedidos de colaboração para este artigo, endereçados a todos os partidos com assento parlamentar, só dois responderam e aceitaram falar sobre as suas estratégias para os canais digitais. O PCP enviou-nos uma declaração que resume a posição do partido sobre o tema. Fabian Figueiredo, do Bloco de Esquerda, disponibilizou-se para uma conversa sobre o assunto, onde explicou que toda a comunicação digital do Bloco é pensada e executada internamente, como acontece aliás com a comunicação do partido em todos os outros canais.
“Não subcontratamos. É muito difícil uma agência de comunicação fazer o trabalho que nós fazemos, porque as pessoas [da equipa interna] conhecem bem a linguagem e as ideias do Bloco e sabem onde queremos chegar”, resultado de muitos anos de trabalho no partido e de trabalho entre si, explica.
Bloco e CDU privilegiam prata da casa na campanha digital
Em alturas de campanha, a equipa do jornal Esquerda.Net é reforçada e é essa equipa que produz e articula conteúdos para os vários canais digitais onde o partido está: Facebook, Instagram, X, Telegram, Whatsapp, Linkedin , Mastodon, Threads e YouTube. Às contas do Bloco, juntam-se as contas dos principais dirigentes e figuras públicas do partido liderado por Mariana Mortágua e em alguns destes canais há também contas do próprio Esquerda.net. São todas geridas internamente numa operação que deverá ter custos semelhantes aos das campanhas anteriores, segundo o partido.
Fabian Figueiredo diz que não há uma aposta mais forte num ou noutro canal. Todos são igualmente explorados para fazer passar mensagens que são arrumadas em formatos, tempo e linguagens distintas, num estilo mais ou menos institucional, consoante o canal em questão.
“Produzimos conteúdos diários praticamente com a mesma frequência para todas as plataformas. Não privilegiamos nenhuma em detrimento das outras, porque todas têm a sua própria linguagem e o seu próprio público. Estamos presentes em todas de diferentes formas, procurando sempre adaptar-nos à linguagem e aos temas que estão mais atuais nas redes sociais”.
A estratégia passa por “cruzar conteúdos mais humorísticos, com outros de sentido mais solene e institucional” e por ligar sempre estes conteúdos de consumo mais instantâneo com informação mais detalhada, partilhando os links para lá chegar. Fabian Figueiredo admite que faz mais sentido comunicar propostas sobre a valorização da segurança social no Facebook, onde está um público com uma média de idade superior, e no TikTok e Instagram ter conteúdos mais direcionados a um público mais jovem, sobre a habitação,por exemplo, e tem sido nessa adaptação da mensagem que o Bloco tem trabalhado, com algumas experiências inovadoras à mistura.
Pôr um gato a apresentar as propostas que o partido leva às próximas eleições, num vídeo publicado no dia do mundial do gato no TikTok, foi uma primeira abordagem a um estilo de conteúdo que funciona bem naquela rede social e que neste caso também funcionou. A mensagem chegou a milhares de pessoas, diz Fabian Figueiredo.
O PCP explicou que reparte a sua presença em canais digitais pelo Instagram, Twitter, Facebook, YouTube, TikTok, Telegram e Whatsapp. Nos quatro primeiros também está o parceiro de coligação PEV. Em período de campanha eleitoral são ainda reativadas as contas da CDU no Instagram, Twitter, Facebook e YouTube.
“Nestes meios procuramos projetar as iniciativas centrais de campanha, presença solidária em ações de luta dos trabalhadores e das populações, bem como outros elementos de propaganda – propostas, denúncia de questões de atualidade”, explica o gabinete de imprensa do partido liderado por Paulo Raimundo.
“Em qualquer um dos casos, fazemo-lo de forma dedicada e específica para estas plataformas, recorrendo, no essencial, aos meios próprios da CDU”, acrescenta-se.
O partido defende que “num tempo em que a desinformação predomina” a presença nas redes sociais é essencial para “mobilizar forças e despertar consciências”, mas também sublinha que as suas atividades aí são uma “intervenção complementar, que não se substitui a algo que consideramos essencial: o contacto direto, olhos nos olhos”, ainda mais em tempos de “individualismo e atomização”, como os atuais.
O que revelam os números oficiais?
Nem o PCP nem o Bloco de Esquerda revelaram quanto vão gastar com as suas campanhas digitais, ambos também alinham na visão de preparar e operacionalizar toda esta comunicação dentro de portas, sem recorrer a agências ou outros parceiros.
Nos orçamentos de campanha apresentados à Entidade das Contas e Financiamentos Políticos, a coligação liderada pelo PCP (CDU) nem sequer atribui verbas à rubrica que agrega despesas com a conceção da campanha, agências de comunicação e estudos de mercado. O orçamento do Bloco de Esquerda para esta rubrica, onde obviamente está muito mais do que a campanha digital, é o mais baixo entre os restantes países com deputados eleitos.
Na informação que os partidos disponibilizam publicamente não é possível saber muito mais sobre o esforço financeiro para chegar aos potenciais eleitores através de canais digitais, nem sobre como é feito. Só o PSD refere claramente nos dois últimos relatórios de gestão e contas (2021 e 2022) que esta é uma área de aposta crescente e profissionalizada. A frase é a mesma em ambos os relatórios: “na área da comunicação manteve-se a aposta na promoção do Partido e da sua atividade através das redes sociais e de outros dispositivos, tratando-se já, nesta altura, de canais profissionalizados”.
A meados de janeiro, o tribunal constitucional publicou a lista indicativa do valor dos principais meios de campanha aprovada pela Entidade das Contas e Financiamentos Políticos. Abrange os principais meios de campanha e de propaganda política e tem por função ser uma referência para o “controlo dos preços de aquisição ou de venda de bens e serviços prestados”, durante este período.
Define por exemplo, no que se refere à produção de conteúdos digitais, que a conceção e manutenção do website e contas de e-mail dos partidos deve representar um encargo mensal entre os 2.924,00 € e 12.000,00 €. Para a gestão das redes sociais e de publicidade online estão definidos valores mensais entre os 1.350,00 € e os 4.700,00 €.
Os orçamentos de campanha partilhados pelos partidos com o mesmo organismo não cobrem todos estes detalhes e como tal não permitem tirar grandes conclusões sobre os montantes aplicados especificamente aos canais digitais. Ainda assim, mostram que na conceção da campanha, com agências de comunicação e estudos de mercado, os partidos com assento na Assembleia da República vão gastar perto de 1,6 milhões de euros. Em propaganda, comunicação impressa e digital vão gastar mais de 1,3 milhões de euros. Os montantes alocados a estas duas categorias divergem em largos milhares de euros entre partidos, como é possível ver no gráfico que resume os valores partilhados.
Este artigo integra um especial sobre as eleições nos canais digitais que o SAPO TEK publica nos próximos dias
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