Os socialistas querem revogar quase todos os pontos do artigo relativo ao direito à proteção contra a desinformação, mantendo apenas o primeiro, que estabelece que "o Estado assegura o cumprimento em Portugal do Plano Europeu de Ação contra a Desinformação, por forma a proteger a sociedade contra pessoas singulares ou coletivas, de jure ou de facto, que produzam, reproduzam ou difundam narrativa considerada desinformação".
O artigo 6.º da Carta Portuguesa de Direitos Humanos na Era Digital refere também que considera-se desinformação "toda a narrativa comprovadamente falsa ou enganadora criada, apresentada e divulgada para obter vantagens económicas ou para enganar deliberadamente o público" – como "a utilização de textos ou vídeos manipulados", excetuando-se "meros erros na comunicação de informações, bem como as sátiras ou paródias" – que "seja suscetível de causar um prejuízo público, nomeadamente ameaça aos processos políticos democráticos, aos processos de elaboração de políticas públicas e a bens públicos".
Ainda nos termos deste artigo, "todos têm o direito de apresentar e ver apreciadas pela Entidade Reguladora para a Comunicação Social queixas contra as entidades que pratiquem os atos previstos no presente artigo" e "o Estado apoia a criação de estruturas de verificação de factos por órgãos de comunicação social devidamente registados e incentiva a atribuição de selos de qualidade por entidades fidedignas dotadas do estatuto de utilidade pública".
O PS vem propor a revogação destas alíneas e defende que, "através desta alteração pontual, circunscreve-se para futuro a norma do artigo 6.º da Carta, onde se consagra a proteção contra a desinformação, à previsão de uma articulação necessária com o Plano Europeu de Ação contra a Desinformação, e da qual se retiram com propriedade os conceitos determinantes (e em evolução) a devida articulação com a reflexão e respostas europeias, enfatizando a dimensão supranacional que a matéria convoca, de forma adequada e proporcional e sem condicionar o debate que a ordem jurídica portuguesa tem vindo a desenvolver sobre a matéria".
No projeto, os socialistas referem que "a querela recentemente centrada em torno de um dos muitos artigos da Carta Portuguesa de Direitos Humanos na Era Digital tem desviado as atenções dos pontos mais difíceis de gerir da agenda mediática da era digital", em "pouco contribuindo para a questão essencial que o próprio combate à desinformação convoca".
O PS aponta igualmente que, "ao procurar enfrentar num diminuto conjunto de normas inseridas no artigo 6.º da Carta as ameaças decorrentes do fenómeno da desinformação, o legislador, num primeiro momento com uma amplíssima maioria, assumiu como possível uma missão que se tem revelado impossível no quadro de instrumentos disponíveis e a partir apenas do ponto de intervenção nacional".
Também a Iniciativa Liberal apresentou um projeto de lei com o objetivo de revogar o artigo 6.º da Carta Portuguesa de Direitos Humanos na Era Digital, por considerar que esta norma se afigura "como o primeiro passo para a criação de um 'Ministério da Verdade' capaz de controlar a opinião o que os cidadãos expressam na internet".
O tema vai ser debatido no parlamento na próxima semana (dia 29 de junho), um agendamento do Chega que também apresentou uma iniciativa no sentido de revogar o artigo relativo ao direito à proteção contra a desinformação.
A Carta Portuguesa de Direitos Humanos na Era Digital, que resultou de projetos de PS e PAN, foi aprovada por maioria em abril sem votos contra, e entrou em vigor em julho.
Na legislatura passada, CDS e Iniciativa Liberal tentaram revogar o polémico artigo 6.º, mas viram as suas propostas rejeitadas, com os votos contra do PS (à exceção de quatro deputados), BE, PAN e da deputada não inscrita Cristina Rodrigues.
O PS também apresentou um projeto nesta altura, que desceu a comissão sem votação juntamente com outro do PAN, mas acabaram por caducar com o fim da legislatura. Na altura, os socialistas defendiam que o artigo carecia "de regulamentação" e propunham que os selos de qualidade fossem atribuídos por "entidades criadas por pessoas coletivas de utilidade pública do setor cultural".
Na sequência das dúvidas e críticas suscitadas, o Presidente da República e a Provedora de Justiça pediram a fiscalização da constitucionalidade daquela norma ao Tribunal Constitucional.
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