Representantes dos principais bancos a atuar em Portugal juntaram-se esta quinta-feira, num encontro promovido pela Defined.ai, liderada por Daniela Braga, para falar da aposta do sector na inteligência artificial e concordar que a tecnologia é crítica para o seu futuro, mas também já é mote de fortes investimentos no presente.

Tiago Mateus, Head of CRM and Customer Intelligence do MillenniumBCP, admitiu que “o banco que se posicionar com uma boa arquitetura de dados fará a diferença”, numa altura em que, como também reconheceu, encontrar e reter talento para dar suporte aos novos projetos nesta área é um desafio. O facto de a IA ser hoje uma área trabalhada pelos mais diversos sectores aumenta a procura destes profissionais e o interesse de quem aí trabalha em acumular experiência em diferentes áreas, aumentando o desafio da retenção de talento.

A IA é uma das principais apostas para transformar o banco nos próximos anos”, admitiu também Francisco Barbeira, Executive Board Member do BPI, dando como exemplos de áreas de interesse neste domínio a aplicação destas ferramentas ao marketing ou análise de documentos.

O mesmo statement foi deixado pela generalidade dos colegas de painel, com Sara Candeias, Chief Executive Director de Data & AI do Montepio, a partilhar mais exemplos de outras frentes de aposta do banco em IA. Assinalou a preparação da rede para acomodar uma nova estratégia de abordagem aos dados, o recurso à IA para deteção de fraude em tempo real - em pagamentos sem cartões à vista, ou as questões da ética, tema que voltaria ao debate, como uma preocupação que as várias instituições quiseram assinalar.

Além de ser assumida como crítica para ajudar os bancos a direcionarem de forma mais eficaz ofertas, agilizar processos de trabalho, ou inovar na interação com o cliente, a IA - nestas e noutras áreas - terá também um papel cada vez mais crítico na capacidade da banca tradicional para competir com os novos atores deste mercado, as fintech. Isso mesmo reconheceu Luis Morim, Head of Data and Analytics do Santander. “A própria banca hoje tem um desafio de diferenciação", admitiu o responsável, considerando que a IA oferece ferramentas que ajudam a promover essa diferenciação, se forem exploradas em ligação com a própria marca.

Os investimentos realizados em IA, pelos diferentes bancos, não foram revelados no encontro, já o nível de retorno desses investimentos foi considerado promissor. “Estamos com um ROI muito interessante naquilo que fazemos”, revelou Bruno Tinoco, Head of Data Science do novobanco. Também disse, que esse nível de retorno pode no entanto baixar ao longo do tempo, à medida que os projetos ganhem escala e cheguem a novas áreas, já que o banco começou por introduzir IA nas áreas com maior potencial de resultados.

Nova regulação europeia para a IA deve ter um forte impacto na banca

Quem apoia os bancos nestes processos de transformação acredita que pela frente está um caminho longo. Tiago Durão, partner da Deloitte, reconheceu que “a banca está claramente atrasada” nesta jornada, face a outros setores, defendendo que passar do laboratório para a integração da IA nos processos vai demorar. “Quando vamos ter processos em que assumimos que a IA é by design?”.

A questão ficou no ar, tal como uma resposta concreta à questão de Daniela Braga, a moderar um dos painéis, sobre a abertura do sector para partilhar dados que possam potenciar o investimento do sector em IA e enriquecer o treino de modelos, por exemplo. A regulação pode ser um entrave a este tipo de colaboração, num sector altamente condicionado por normas estritas de atuação. A tecnologia, por seu lado, está pronta e permite trabalhar dados de diferentes fontes de forma anonimizada e sem uma real partilha de informação, como sublinhou Tiago Durão, que lidera um centro de IA da consultora em Portugal, onde já trabalham 300 pessoas.

A moldar o futuro das estratégias de IA da banca para os próximos anos, ainda no domínio da regulação, e como frisou Luís Barbosa, Financial Services Market Leader Portugal da PwC, vão estar também os três pacotes legislativos em preparação nesta área, com destaque para o AI Act. Como sublinhou o responsável, terão um “enorme impacto” na vida das empresas que vão ter de se preparar para cumprir requisitos e evitar erros que conduzam às pesadas multas previstas.

Para já, as prioridades de investimento em IA na banca vão-se concentrando nas áreas de client facing, modelos analíticos, gestão de questões regulatórias, qualidade dos dados e melhoria de modelos internos, como partilhou no mesmo evento José Alexandre Correia. Neste leque, o partner da KPMG sublinhou a importância de controlar a origem dos dados usados em modelos de treino e de trabalhar a qualidade dos dados disponíveis, numa altura em que ainda se monta a “fábrica” que, no futuro, vai permitir tirar um partido mais transversal da IA.